Com o avanço das redes sociais e plataformas digitais, o público nunva teve tantas escolhas e, no Brasil, o funk passou a ocupar o topo do consumo entre jovens. O fenômeno não escapou aos olhos das comunidades cristãs e deu origem a uma onda de composições há algum tempo impensáveis: misturas de louvores religiosos com ritmos profanos.
Leia também: Do rap ao eletrônico, música gospel se reconfigura e cresce em 2016
Leia também: Universal Music aposta em música religiosa no Brasil com criação de selo
No Rio de Janeiro, o evento Gospel Night, do DJ Marcelo Araújo, é prova do sucesso da mistura. A casa não esconde o objetivo: fazer evangelismo nas pistas de dança durante à noite, aproximando os notívagos de Cristo. Deu certo, além de promover o entretenimento, a iniciativa ganhou ainda mais força há 11 anos. “Quando gravamos nosso DVD de 10 anos, dava pra enxergar a mudança no cenário e a aceitação. Foi o momento que paramos para ver a boa repercussão”, diz o produtor do evento, Wellington Júnior.
Apesar do setlist eclético, o funk se faz entre os ritmos mais pedidos da festa. No entanto, a força deste estilo em canções cristãs não é exclusividade deste evento, que conta com grandes atrações e nomes gospel .
Popular entre os hits seculares, com batidas marcantes e letras, geralmente, de cunho sexual, a inserção deste estilo em ritmo fiel, sem sensualidade e palavras bíblicas, foi motivo de preconceito para muitas pessoas, inclusive para Bruninho, DJ e produtor musical. “No início da minha carreira tive certa dificuldade em me aceitar como funk . Nasci na comunidade do Rio de Janeiro e aqui esse estilo predomina, mas quando assumi isso como uma marca, Deus abriu as portas, porque é a linguagem que nasci, é minha identidade”, revela o DJ e líder de jovens da Comunidade Internacional Ágape, no Rio.
Assim como o ritmo carioca, os demais atípicos entre os religiosos também foram motivo de estranhamento, críticas e tabus. Mario Jardim, vocalista do grupo de samba Radicais na Fé, formado em meados de 1995, relembra as dificuldades no início da carreira dizendo que aconteceu de pessoas saírem da igreja ao ouvirem seu som.
Quebra de barreiras e popularização
Segundo Wellington Júnior, com base no Gospel Night, o perfil de público que mais consome este tipo de música tem idade entre 15 a 25 anos. O entendimento sobre a importância da diversidade das músicas cristãs se faz necessário como apoio e forma estratégica para conquistar o público não religioso, principalmente os jovens.
Apesar de ainda não ter o reconhecimento suficiente como qualquer outro artista e ritmo secular, a quebra de barreiras e reconhecimento desse movimento popular está acontecendo gradativamente e tem sido motivo de comemoração.
Jake Trevisan, cantora de axé e pop católico, explica que o tabu na musicalidade dentro da igreja tem perdido espaço: “O pessoal estava mais condicionado com aquilo que era mais tradicional, oracional, mas hoje isso já foi ultrapassado! Tem ministérios de diversos estilos musicais, então agora o pessoal já tem mente aberta em relação a essa influência de todos os estilos para a evangelização, porque todo mundo percebe que nós precisamos falar a linguagem do povo”.
Essas vertentes têm ganhado tanta força que o sertanejo virou marca registrada do Padre Alessandro Campus, conhecido, principalmente, por promover suas canções raízes em programas religiosos na TV. “Precisamos de uma nova evangelização, uma nova pedagogia que responda aos anseios do século XXI, a igreja tem feito isso com maestria, o Papa Francisco apoia e, é claro, eu também”, defende o sacerdote, atualmente a frente do programa “Viva a Vida”, na REDEVIDA de Televisão , e da missa ao vivo na Rede Brasil .
A onda pop das músicas cristãs está ultrapassando barreiras e Bruninho comemora que suas batidas saíram do Rio e ganharam outros Estados e até Paris, na França, com mensagens de apoio e carinho. “A maior dificuldade é a religiosidade e infelizmente muita gente tá presa a isso, mas a palavra de Deus diz: ‘Tudo quanto tem fôlego louve ao Senhor’ (Sal 105:6). Deus não estimulou padrão”, pontua o funkeiro evangélico.
Apesar do avanço, Mario Jardim comenta que ainda há muitas dificuldades e falta de compreensão: “Dizem que crente não pode cobrar”, revela, destacando que o grupo não vive do trabalho com a música para não se fazer refém disso como meio de sustento e, consequentemente, acabar correndo o risco de se perder da verdadeira adoração a Cristo.
Evangelho além da igreja
Para darem início a esses trabalhos os artistas religiosos fizeram a união de seus gostos musicais com o aval de Jesus e conhecimento na palavra da Bíblia Sagrada, assim, pregam o evangelho além da igreja e de eventos religiosos.
O vocalista do Radicais na Fé acredita que seu dom de fazer samba gospel é para aproximar a todos através de um ritmo popular no Brasil, por isso o grupo costuma fazer apresentações públicas nas ruas, praças e em locais improváveis como cadeias, pontos de tráfico e Fundações Casa.
“Fomos em um presídio em Guarulhos no fim de ano, chegando lá deu problema na parte elétrica e não deu para ligar o som, mas o Espírito Santo ministrou na hora para eu louvar, ficou um ambiente leve e gostoso. Em datas comemorativas rodamos todas as Fundações Casa de São Paulo, não é só divertimento, é uma orientação, fazemos palestras também, sempre de acordo com a Bíblia, nós ouvimos eles e é uma troca, não é imposição, tanto que eles não são obrigados a irem, mas gostam”, explica Mario.
Jake, que geralmente é contratada por paróquias, prefeituras e ONGs, para eventos de jovens e famílias, incluindo apresentações em trio elétrico no Carnaval, garante que a diferença em cantar na igreja e fora dela está exclusivamente no rito. “Tenho expressão voltada para a alegria. O meu show é muito dinâmico para mostrar as pessoas que é uma alegria sem drogas,é uma alegria sem remédios, é uma alegria sustentada pelo Espírito Santo de Deus”, diz a artista.
A crescente desse movimento fora da igreja fica ainda mais claro com o resultado da última pesquisa realizada pelo Gospel Night, apontando que 35% do público do evento não é cristão.
O futuro da música cristã
“Se quisermos que o mundo nos escute da forma que somente nós falamos com Deus, nós não vamos alcançar mais ovelhas, outras pessoas. Então hoje temos muita liberdade para fazer nossos shows, utilizar arranjos, convenções e letras bastante ousadas”, destaca Jake Trevisan.
Os cantores estão otimistas e apostam neste cenário. “É algo nítido, é algo musical. Tudo que é de qualidade as pessoas estão interessadas, não é só por serem músicas cristãs. O movimento vai crescer!”, ressalta Bruninho.
Segundo o produtor do Gospel Night, evento que tem recebido cerca de duas mil a três mil pessoas em suas apresentações, a popularidade da inovação musical religiosa tem ganhado apelo, principalmente, nas capitais.
Atualmente, entre os grandes artistas da música gospel, Priscilla Alcântara é uma das maiores responsáveis por consolidar esse movimento que conecta pessoas cristãs e não religiosas a mensagem bíblica através do pop de suas canções. Nomes como Pregador Luo, Rosa de Saron e Tonzão também são popularmente conhecidos por trabalhos como este.
Leia também: Vídeo: Bruna Marquezine se choca ao ver Priscilla Alcântara cantar
A ideia e a importância da onda popular das músicas cristãs têm surtido efeitos. Os artistas destacam que têm ganhado força e afirmam que o objetivo de aproximar os jovens de Deus está funcionando. Além de por mais gente na igreja, mais discos, ingressos para shows e festas incrementam o crescente mercado cristão brasileiro.