O sertanejo é o gênero de música queridinho do Brasil, o ritmo fruto da música caipira se reinventa constantemente. O boom desse estilo, conhecido hoje como Sertanejo Raiz, veio entre os anos 70 e 80 com temáticas mais urbanas e românticas nas vozes de duplas que embalam momentos nostalgia nos dias de hoje como Chitãozinho & Xororó e Milionário & José Rico.
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No entanto, a comercialização do Sertanejo Raiz se deu um pouco mais tarde, como explica João Paulo Amaral, professor de Viola Caipira da EMESP – Tom Jobim: “A partir dos anos 1990, com apoio da grande mídia, globalização e associação com a moda country norte americana, urbanização do meio rural e explosão do circuito dos rodeios, o sertanejo tornou-se um segmento comercial de massa, atingindo grandes vendagens e sucesso em todo País”.
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Atualmente, o gênero toma as paradas de sucesso brasileiras com canções no estilo “Universitário”. O professor pontua que o Sertanejo Universitário seria a continuação do estilo romântico de 1980 a 90. Segundo ele, a nova nomenclatura do gênero foi uma forma encontrada por duplas, empresários e gravadoras para “atualizar” o sertanejo romântico dos anos anteriores e, assim, ampliar o alcance para públicos mais urbanos, jovens de classe média e também universitários.
Embora o termo Sertanejo prevaleça, a reconstrução atual do hit é fácil de distinguir, graças a suas batidas bem marcadas e mais dançantes. De acordo com João Paulo, a utilização da viola caipira em uma determinada canção ou reinterpretação de um clássico e o dueto nas vozes é uma das poucas ligações do estilo Universitário com as características de duos caipiras tradicionais.
Para o cantor Eduardo Costa, que vê o gênero como uma evolução na conquista de novos públicos ao longo do tempo, a maior herança desse novo feitio com relação ao Sertanejo Raiz é o termo Sertanejo. O artista também aponta que cada um tem seu estilo próprio, ainda que estejam buscando manter as raízes e afirma: “O bom é que mesmo está moçada do Sertanejo Universitário cantam música Raiz, desta forma não matam a música do campo, da roça”.
Chitãozinho & Xororó vêm esse novo movimento como algo importante. “Ele acaba impulsionando o sertanejo como um todo, já que a geração mais nova acaba cantando as nossas músicas. As canções estão ganhando releituras e, assim, as novas gerações têm a oportunidade de conhecer os grandes sucessos de antigamente”, garante a dupla.
Em âmbito de diferenças e semelhanças, muitos cantores mantém a inspiração e buscam por influência do estilo Raiz, como é o caso da dupla Henrique & Juliano, que garante: “É o que nós ouvimos no dia a dia [música Raiz], nas nossas casas, nos camarins. Adoramos esse estilo e cantamos um sertanejo que tem várias influências, tanto Raiz quanto desse sertanejo mais dançante”.
Desde que gravaram o primeiro CD em 2011, “Vem Curtir Com A Gente”, Henrique & Juliano viveram diferentes fases do gênero musical. “De lá pra cá muitas coisas mudaram mesmo, o que é bom. Muita gente nova chegou para somar nesse mercado e de certa forma, fez aumentar a qualidade do que é produzido”, pontua o primeiro nome do duo.
Incólume sertanejo raiz
Mesmo o estilo Universitário sendo o mais recente, o estilo Raiz mantém seu sucesso e popularidade inclusive entre os mais jovens. A playlist nomeada de “Sertanejo Raiz” pelo Spotify, por exemplo, soma mais de 60 mil seguidores e traz entre as canções títulos como Tocando em Frente (Almir Sater), O Menino da Porteira (Sérgio Reis), Evidências (Chitãozinho & Xororó) e Sonhei Com Você (Milionário e José Rico). Vale ressaltar que algumas músicas e cantores dessa seleção também aparecem na playlist “Clássicos Sertanejos”, que ultrapassa 530 mil seguidores.
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No Deezer a seleção em parceria com a Filtr Brasil, intitulada de “Sertanejo Antigo”, repete alguns títulos presentes nas playlists citadas anteriormente com canções dos anos 80 e 90, porém com número menor de seguidores - cerca de 31.802. Ambas as plataformas de músicas possuem diversas listas de reprodução sertaneja com diferentes títulos, todas bem sucedidas e características.
O que chama ainda mais atenção é que o Spotify não tem nenhuma seleção oficial totalmente dedicada ao movimento Universitário, enquanto o Deezer trabalha com a lista de “Sertanejo Universitário 2018”, que tem caótico número de seguidores – cerca de 7.800 – se comparado às das seleções Raiz.
Com a inserção das plataformas digitais, cantores e duplas sertanejas usam as redes sociais para se legitimar e buscar aprovação perante o público, e somam milhões de seguidores. O fato está ainda mais presente entre os nomes atuais do sertanejo, como Zé Neto & Cristiano (4,5 milhões de seguidores no Instagram), Henrique e Juliano (6,7 milhões), Marília Mendonça (13,5 milhões) e Luan Santana (19,4 milhões).
A busca pela aproximação do público nas plataformas digitais tem dado certo, o resultado é claro com o “Top 50 mais tocadas no Brasil” do Spotify, marcado por músicas como Ciumeira (Marília Mendonça), Sofazinho (Luan Santana), Saudade Nível Hard (Yasmin Santos), Cidade Vizinha (Henrique & Juliano) e Largado às Traças (Zé Neto & Cristiano).
Com menos esforços, os artistas que fizeram nome no estilo mais antigo do gênero mantém as redes sociais com poucas atualizações, se comparado aos nomes citados acima, consequentemente os números de seguidores são bem inferiores, mas com a popularidade nas playlists apontadas anteriormente deixa claro que o legado de Chitãozinho & Xororó (727 mil seguidores no Instagram), Trio Parada Dura (216 mil) e Sérgio Reis (160 mil), por exemplo, se mantém intacto sem precisar de ajuda das plataformas midiáticas.
Dificuldades no mercado
O mercado musical sertanejo vem se transformando constantemente, é fácil encontrar a parceria desse hit com outros gêneros como o funk, por exemplo. No entanto, embora haja certa diversidade, alta do gênero nas paradas musicais brasileiras e a facilidade de se encaixar com os demais, o mercado comercial não é tão fácil assim.
João Paulo Amaral diz que fica triste de saber do potencial do Sertanejo atual para se transformar e se desdobrar em caminhos musicais novos e verdadeiros, como vê em violeiros, duplas e artistas atuais que não são conhecidos por boa parte da população por conta da hegemonia de gêneros como o Universitário. “Não é que não possa existir a música comercial e o entretenimento, mas poderia ser menos desigual o mercado”, afirma o professor de Viola Caipira.
Ditos como um dos principais precursores do Sertanejo Raiz, Chitãozinho & Xororó veem o mercado sertanejo atualmente com menos restrição de público. “Hoje em dia, qualquer pessoa ouve música sertaneja, diferentemente de quando começamos nossa carreira. Acho que nossa maior contribuição foi popularizar um pouco mais esse gênero musical, o que contribuiu para o Sertanejo Universitário”, explicam os cantores.
Juliano, do duo com Henrique, pontua que existe certa pressão por parte do mercado em criar sempre grandes hits. “E nem sempre um repertório é feito só de hits”, explica ele. Já Eduardo Costa acredita que a maior dificuldade de artistas desse movimento hoje está em manter a carreira no topo.
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Entre heranças e diferenças, uma coisa é certa: tanto o Sertanejo Raiz quanto o Universitário aprimoram a cultura e a arte brasileira. Como um dos maiores hits do País, o Sertanejo promete continuar em transição, mas para se manter intacto como queridinho do Brasil a chave do sucesso, segundo Henrique & Juliano e Eduardo Costa, requer muito trabalho e dedicação sem deixar de lado a essência Raiz.