A ideia de promover o embate entre fé e dúvida pela ótica de uma relação amorosa, ou pela memória fraturada de uma, é a matéria prima da peça “Hard Love” (2003) do isralense Motti Lerner que ganha montagem dirigida por Einat Falbel em São Paulo.

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Peça "Amor Profano" promove oposição entre dúvida e fé de uma história de amor

Em  “ Amor Profano ”, Marcello Airoldi vive Zvi e  Vivianne Pasmanter  dá vida a Hanna. Eles não se veem há 20 anos. Esse encontro cheio de palavras não ditas, olhares desviados e tensão ganha contornos ainda mais tensos pela utraortodoxia judaica dela em oposição ao espírito livre dele. São os mesmos problemas que motivaram o traumático divórcio tanto tempo atrás e que a  peça  tangencia pelas lembranças que eles ensejam entre uma afronta e outra.

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O encontro tem como objetivo discutir o interesse amoroso do filho dele pela filha dela. Os filhos deles começaram a namorar por alguma artimanha do destino e isso, claro, incomoda Hanna que teme pela repetição da história. Naquele temor, para Zvi, que agora é um escritor que exorciza seus fantasmas em seus romances, Hanna revela seu desejo latente por ele e a insatisfação com o rumo de sua vida.

Os 80 minutos da peça, que tem uma cenografia discreta, se apoiam essencialmente nos dois atores e nos diálogos complexos que tanto revelam quanto escondem da natureza daqueles dois personagens que se colocam nas trincheiras da dúvida e fé.

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"Amor Profano" promove oposição entre dúvida e fé no contexto de uma história de amor

O público é desafiado a entender os personagens e tentar encontrar um denominador comum para seus problemas: “Quem sou eu sem Deus?”, no caso de Hanna, e “Quem sou eu a serviço de Deus?”, no caso de Zvi.

A princípio pode parecer mais aderente a posição de Zvi, mas como o desenrolar da estória demonstra, a dúvida pode ser uma tormenta tão ceifadora quanto a fé. Outro elemento a abastecer a inquietação do público diz respeito à maneira como Deus é abordado nessa trágica historia de amor, como um terceiro vértice de um triangulo amoroso. Essa percepção se consolida especialmente na segunda e última cena da peça.  

A química de Airoldi e Pasmanter, entre eles e com seus personagens, é algo especialmente notável. Vivianne Pasmanter, em particular, demonstra toda a sua categoria como intérprete ao investir na economia de gestos e olhares, sem perder de vista a intensidade de uma mulher que esconde toda a sua vulnerabilidade em uma postura abrutalhada e refratária. É curioso como o cabelo da atriz, quando é descoberto em dois momentos capitais, brilha na cor de fogo como se queimasse toda uma insegurança que paralisasse sua personagem até então.

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A agudeza de Airoldi veste bem o desatino de Zvi, perdido entre a ânsia de reparação com seu passado e o desejo de viver um amor que corre o risco de estar confinado para sempre à fantasia.

“Amor Profano” é o tipo de  peça  que suscita bons debates que extrapolam os limites projetados pelo texto de Lerner e alcança, por meio de dois grandes atores, o âmago daqueles dispostos a reverberar essa distinta qualidade.  

Serviço
Amor Profano
Direção: Einat Falbel
Texto: Motti Lerner
Elenco: Vivianne Pasmanter e Marcello Airoldi
Teatro Vivo
Sex (20h), sáb (21h) e Dom (19h)

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