Spike Lee  construiu uma filmografia das mais altivas, independentes e politicamente agressivas do cinema americano. A questão racial sempre foi um norte em seu cinema tangenciado com um ponto de vista forte e frequentemente radical. Autor respeitado, Lee já devia um grande filme desde “A Última Noite” (2002). “Infiltrado na Klan”, vencedor do Grande Prêmio do Júri em Cannes, vem preencher essa lacuna.

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John David Washington e Laura Harrier em Infiltrado na Klan
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John David Washington e Laura Harrier em Infiltrado na Klan

A exemplo de “Malcolm X” (1992), “Mais e Melhores Blues” (1990) e “Faça a Coisa Certa” (1989), alguns de seus melhores filmes, “ Infiltrado na Klan ” versa sobre as tensões raciais na América. Adaptado da obra homônima de Ron Stallworth, o filme mostra a extraordinária história real de um policial negro que se infiltrou no grupo fascista e racista Ku Klux Klan nos anos 70.

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Ron Stallworth é vivido por John David Washington, filho do ator e frequente colaborador de Lee, Denzel Washington, em seu primeiro grande papel no cinema. Ron é o primeiro negro na força policial de Colorado Springs, no Colorado, estado do sudoeste do EUA. A cena em que ele se apresenta a seus superiores é um achado. Inquieto, ele pretende ascender rápido dentro do departamento, mas sabe que muita tolerância será demandada dele.

Surge uma oportunidade para trabalhar disfarçado. Um dos líderes dos Panteras Negras, movimento revolucionário que pregava a revolução dos negros contra os brancos, visitaria a cidade e ele era o único capaz de se infiltrar no ambiente. Ele colabora com os detetives Flip Zimmerman (Adam Driver) e Jimmy Clerk (Michael Buscemi). A missão é bem sucedida e, de repente, Ron se descobre investigando o Klan, que ensaia um retorno na cidade. Ele convence seus superiores a bancar a investigação com Flip se passando por ele nos encontros com o grupo.

Senso de humor carregado

Spike Lee alerta para ciclos do ódio no ótimo
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Spike Lee alerta para ciclos do ódio no ótimo "Infiltrado na Klan"

A situação esdrúxula recebe o devido tratamento pelo cineasta que aposta no humor de tintas carregadas para ir desvelando a situação. Mas não se engane, não se trata de uma comédia. É um thriller policial de tensão constante, mas com um senso de humor muito particular. Méritos de um cineasta em grande forma e com uma compreensão plural e absoluta da história que está contando.

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Lee ousa esteticamente ao emular  Trump  sempre que possível, especialmente na caricatura que Topher Grace faz de David Duke, um dos expoentes do pensamento supremacista branco norte-americano.  Trump é, também, a estrela dos cinco minutos finais do longa que coloca a marcha de neonazistas em Charlottesville, no estado da Virgínia em 2017, em foco.

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Topher Grace decalca Donald Trump

Costurar o passado com o presente dos EUA é uma aposta arriscada de Lee, mas ele a fundamenta muito bem narrativamente, reforçando a percepção de que é um cineasta eloquente na maneira como viabiliza e defende seu ponto de vista.

O longa  cativa tanto quanto incomoda. Os personagens são muito bem desenhados pelo roteiro e o elenco está em plena sintonia com a proposta da realização. É o ponto de vista incisivo e inquietante de Lee, todavia, que se destaca. Ele alerta para a perenidade do ódio –e seu discurso – e para seus pontos de inflexão na História. E acerta todos os alvos possíveis e imagináveis. Filmaço!

"Infiltrado na Klan" será exibido nesta quinta (18) no Cinesesc, às 21h15; na sexta (19), no Espaço Itaú Frei Caneca 1, às 19h10; na segunda-feira (22) no Espaço Itaú Pompeia 1, às 21h; na sexta-feira (26), na Cinsesala, às 18h40; e no Espaço Itaú Augusta 1, na segunda-feira (29), às 14h.

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