“Fazer uma série para a Netflix é ter de pensa-la de maneira universal”, admite Felipe Braga , criador e showrunner de “Samantha!”, primeira sitcom brasileira da plataforma de streaming. O produtor, que também supervisiona "Sintonia", outra produção brasileira da Netflix desenvolvida em parceria com Kondzilla, disse que é preciso cerca-se de alguns cuidados para garantir que uma série seja capaz de “viajar”. O que não quer dizer que seja necessário renunciar à brasilidade ou mesmo à memória.
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“Tem uma coisa geracional aí”, observa Braga. “Nós éramos crianças nos anos 80. Diretores, produtores e roteiristas que estão fazendo séries agora estão dialogando com essa memória. Os anos 80 viraram vintage”. “Samantha!” , que estreia nesta sexta-feira (6) mundialmente, conta a história de uma ex-estrela mirim que tenta com todas as suas forças – e uma boa dose de cara de pau – sair do ostracismo.
No papo com jornalistas em São Paulo, que contou com a presença do iG Gente , o produtor apontou o que entende serem diferenças fundamentais entre como eram feitas comédias nos anos 80 e 90 e como elas estão sendo feitas atualmente. “As comédias estão sofrendo uma pressão dramática muito grande, o que eu vejo como reflexo do binge watching. Quando você assiste tudo de uma vez só, há uma demanda por arcos e personagens mais bem desenvolvidos”.
Braga cita “Friends” (1994 – 2004) para avalizar seu raciocínio. “As sitcoms dos anos 80 e 90 tinham os personagens com as mesmas características e tendo um restart a cada semana. Hoje a gente está tendo a oportunidade de reimaginar a forma de contar essas histórias”.
Os temas de “Samantha!”
O produtor credita essa nova realidade à chegada da Netflix que alterou a paisagem e proporcionou “diversidade narrativa”. O que ajudou a série a ser, na análise de seu criador, um programa sobre “o que é ser famoso e o que é ser relevante”. A Samantha não é louca. Ela foi muito famosa. Ela veio de um lugar que ninguém mais veio. Hoje vemos um contexto de fama que é mais inchado, mais histérico de certa forma.
Mas a série também é sobre o convívio familiar. Logo no primeiro episódio, enquanto tenta junto de seu empresário, papel de Daniel Furlan, uma chance para fazer as pazes com o estrelato, a protagonista é surpreendida pela chegada de Dodói (Douglas Silva), um ex-jogador de futebol que passou 12 anos preso e retorna desejando “ser um pai para seus filhos e um homem para sua mulher”, como comenta o ator.
A princípio, Samantha só vê na dinâmica de casal com Dodói uma chance de figurar na mídia e esse desencontro de vontades também é um importante gatilho dramático para a série, que tem sete episódios de meia hora nessa primeira temporada. “A gente tentou achar as relações. As dores e delícias dessas relações”, pondera Emanuelle Araújo.
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Emanuelle Araújo é Samantha
A escolha da protagonista foi feita de maneira muito natural observa Rita Moraes. “O teste dela foi feito como se ela estivesse sendo entrevistada pela Marília Gabriela e minha mãe fez a Marília Gabriela”, ri a produtora. Felipe Braga resume: “A Emanuelle é foda!" Os produtores concordam que o principal critério para a escolha da protagonista era que a atriz em questão entendesse que Samantha era uma mulher extremamente inteligente e foi algo que Emanuelle entendeu muito intuitiva e rapidamente.
“Se fosse outra atriz, a Samantha poderia ser burra, perua, abestalhada...”, observa Braga que se diz feliz por fazer parte de um projeto que tem a coragem de colocar uma protagonista feminina em toda a sua plenitude em meio “à maioria brutal de programas com protagonistas masculinos e brancos”. Moraes complementa: “Geralmente os conflitos de personagens femininas em séries giram em torno de homens e isso não é o caso aqui".
Já Emanuelle Araújo frisa o fato de sua personagem “ter um lado machista”. A atriz credita essa característica ao fato de Samantha ser fruto dos anos 80, uma década politicamente incorreta e nós a conhecermos em um “momento em que o feminino está se ressignificando”. Araújo, no entanto, não vê sua personagem inteiramente machista. “Ela não sabe exatamente o que é ser feminista, mas é. Ela não entende o discurso, não se empodera, mas no fundo, a ideia dela é se valorizar. E o mais bacana da série é que ela traz essa mensagem independente do gênero”.
Ainda que seja um produto dos anos 80, a atriz vê sua personagem como uma pessoa muito atual na forma com que lida com o tempo. “Eu, Emanuelle, tenho uma relação com o tempo muito tranquila. Tenho 41 anos, 25 anos de carreira na música e lancei agora o meu primeiro disco solo. Sempre respeitei muito o tempo. Achando que as coisas podem ser mais lentas. Já a Samantha é diferente.”
Araújo vê Samantha mais compatibilizada com esses tempos de imediatismo. “Na cabeça dela, ela é um sucesso. As pessoas é que não entenderam ainda”.
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