É clichê falar que qualquer pessoa que use a internet já se deparou com pornografia online – mesmo que contra a própria vontade ou sem ao menos procurar por conteúdo adulto. Isso reflete o tamanho dessa indústria que, a cada dia, cresce e se fortalece com milhares de novas visualizações, usuários e vídeos. De acordo com um relatório publicado em janeiro pelo site PornHub , um dos maiores sites desse nicho, o número de acessos que tiveram em 2016 é aproximadamente três vezes a população de todo o planeta terra – isso representa algo em torno de 23 bilhões de visitas.
Muito se fala sobre a decadência e a crise da indústria da pornografia , porém, qual a fundamentação dos defensores dessas ideias? Existem algumas “linhas de ataque” distintas que podem se resumir em três categorias mais simples: a regulamentação do mercado, a distribuição ilegal via internet e questões sociais que são afetadas por ela. A primeira, por exemplo, foi amplamente discutida quando, em 2012, foi aprovada uma lei no estado da Califórnia que criava normas de “segurança no trabalho” e instituía o uso da camisinha pelos atores, que, além de restringir as práticas, aumentava o custo das filmagens.
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A segunda – e que seja, talvez, a mais preocupante para os produtores – é a falta de controle sobre o conteúdo na internet. Como garantir que as pessoas pagarão por algo que podem encontrar de graça em outro lugar? Como impedir a pirataria dos conteúdos que exigiram um custo alto para serem feitos? E, sobretudo, como lidar com a onda do “ pornô amador ”, onde qualquer um com um celular pode criar e distribuir material caseiro? Essas perguntas ainda assombram os estúdios e preocupam profissionais do ramo que ainda não encontraram uma solução para aplacar sua relação de “amor e ódio” com a internet, pois, por um lado, ela aumenta sua visibilidade, mas diminui a rentabilidade do negócio.
Mirando no viés social do pornô outras milhares de críticas fundamentam-se. Feministas, como a teórica Andrea Dworkin , fazem duras críticas ao modelo que o material adulto adota e reproduz, que humilha, degrada e agride mulheres constantemente. Diversas estrelas do pornô já denunciaram e fizeram relatos sobre a “realidade” dos bastidores da produção. Estupros, cenas “não combinadas”, doenças e drogas são algumas das características que se repetem nas histórias de profissionais que deixaram a indústria e que foram reunidas pela ONG AntiPornography .
A pesquisadora Katrina Forrester escreveu o artigo “ Making Sense of Modern Pornography ” (“Entendo a Pornografia Moderna”, em tradução livre) em setembro para a The New Yorker e, em seu texto, a autora explora as diferentes facetas da “decadência” desse mercado que, sem dúvidas, está vivendo um momento turbulento e com a necessidade de reinventar estruturas “arcaicas” da era pré-internet.
Alguém falou em “crise”?
Clayton Nunes é CEO da Brasileirinhas , uma das produtoras de pornografia mais respeitadas no País e, para ele, o modelo de negócios de quem trabalha com filmes adultos mudou nos últimos anos, mas “crise” é um termo que passa longe dessa realidade. Apesar de a realidade ser mais competitiva que no passado, quando os filmes eram distribuídos em locadoras em VHS. A empresa apostou em novos formatos para se atualizar e manter um público fiel: somados, os sites da Brasileirinhas têm mais de 5,5 milhões de acessos. Mas os acessos não representam o único termômetro de sucesso. Ao iG , Clayton disse que a alteração do formato do site para atrair mais assinantes incrementou a renda da produtora – ainda que tenha resultado em queda de visitantes.
Na tentativa de driblar a concorrência e fugir da pirataria, empresas profissionais como a Brasileirinhas investem em modelos de conteúdo, como reality shows, canais "on demand" e ferramentas que aumentam a intereção entre o público e as atrizes, conforme Clayton confirmou durante entrevista.
Um desafio enfrentado por produtoras como a Brasileirinhas , segundo Clayton, é a competição com material amador. “Tentamos fazer pornô caseiro emulando as fórmulas, mas nunca deu certo. Nosso público é mais exigente e quer ver filmes bem feitos”, mas, se o público tem essa demanda, por que a fórmula se tornou tão apreciada pelos usuários? É impossível saber com certeza a resposta para isso, mas uma coisa é certa: para que alguns setores desse mercado sejam prejudicados, alguém sai ganhando com isso.
Novos negócios
De acordo com o ranking publicado pelo Alexa , vários dos sites mais visitados de toda a rede são voltados para pornografia e conteúdo adulto, como o Xvideos , XHamster e o Pornhub , para citar os “gigantes” do ramo – em um número divulgado em dezembro de 2016, 7% dos 100 domínios mais acessados são destinados à pornografia. Esses endereços, em geral, se “aproveitam” de muito material que circula livremente na internet, muitos, inclusive, são fruto de pirataria e compartilhamentos irregulares de vídeos que foram efetivamente comprados por alguém.
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Em um panorama onde os números falam por si só – segundo o relatório anual do PornHub , em 2016 foram assistidos mais de 91 bilhões de vídeos – é difícil não imaginar quem controle tudo isso e, além disso, se falam em crise, como esses sites se sustentam? As informações sobre o assunto são escassas, pois muita coisa acontece longe de fiscalização e, portanto, é difícil rastrear com exatidão essas atividades, mas, de acordo com a NBC News , em 2014 a indústria da pornografia lucrou por volta de US$ 97 bilhões.
Uma matéria publicada no site The Next Web , “ The Almost Invisible Men and Women Behind the World’s Largest Porn Sites ” (“Os Homens e Mulheres Quase Invisíveis por Trás dos Maiores Sites de Pornografia do Mundo”, em tradução livre), procura desvendar quem são as pessoas que controlam esses sítios. A conclusão da reportagem aponta para poucas empresas enormes que, sozinhas, dominam quase todos esses sites, como a MindGeek . Transações milionárias, empresas com pouco ou nenhum histórico e muitas incertezas ainda tem espaço quando o assunto é a indústria da pornografia , mas é certo que não existe “ crise ”, apenas a emergência de novas lógicas criadas com a internet.