Marcelo Zambelli, ex-diretor de novelas da Globo, esteve no Festival de Cinema de Vassouras
Mark Saglia/Divulgação
Marcelo Zambelli, ex-diretor de novelas da Globo, esteve no Festival de Cinema de Vassouras


Marcelo Zambelli liderou um painel no Festival de Cinema de Vassouras, no Rio, na tarde deste domingo (18), e compartilhou suas experiências ao longo de 30 anos trabalhando como diretor nas produções do entretenimento da Globo, sobretudo nas novelas da emissora. E aproveitou para abrir a caixa preta, revelando orçamentos, segredos de bastidores e detalhes do ritmo industrial de execução de uma trama.


"É um volume brutal e aterrorizante fazer novela. Pensando em uma novela das 21h, são 50 minutos de capítulo por dia. Fazemos dois longas e meio por semana. São por volta de 40 cenas cada capítulo, que totalizam 240 por semana, e mil cenas por mês. É um mastodonte, que a Globo já transformou num processo industrial e conseguiu resolver. E como gravar mil cenas em um mês? As pessoas não se dão conta dos desafios", começou.

"As novelas das 21h têm cinco ou seis frentes diárias, fora dos estúdios. E cada frente tem seu diretor, contra-regra, figurinista. Isso tudo é despejado na edição, são cinco ilhas de edição, o processo é de enlouquecer. Fora isso, tem que lidar com o ator que não comparece à gravação porque está fazendo fisioterapia, ou o cachorro está doente. Tem que ir lidando com as variáveis. Mas quando você consegue botar o circo no ar, é muito satisfatório."

Zambelli foi um dos diretores do núcleo de Jorge Fernando (1955-2019) e dirigiu novelas como Verão 90 (2019), Êta Mundo Bom! (2016) e Ti Ti Ti (2010). Ele deixou a emissora no início de 2021, após três décadas, mas ainda mantém seu vínculo indireto com a empresa, produzindo conteúdos para o Globoplay.

Produção de novelas

O diretor explicou que atualmente a Globo avalia a viabilidade de uma novela de acordo com seu orçamento. Se a sinopse é boa, mas a direção prevê um custo alto, ela não entra em produção. E a trama que acaba aprovada tem que seguir todos os rigores impostos pelo departamento financeiro.

Marcelo Zambelli
Mark Saglia/Divulgação

Marcelo Zambelli dirigiu a novela Verão 90, na Globo

"O orçamento de uma novela é determinado pelo tempo que ela fica no ar. As novelas das 21h têm capítulos maiores, então custam mais caro. Atualmente, a média de custo de um episódio é de R$ 350 mil a R$ 400 mil. E não pode passar disso. A Globo não é um saco sem fundo de dinheiro. Se o produtor gastar mais do que o orçamento, ele perde a bonificação que a emissora costuma dar", explicou.

"Antes, a criação mandava e a coisa era mais frouxa. Hoje o orçamento é o balizador de qualquer coisa. Quando a gente entra num processo de orçamento que está estourando a gente tem que pensar em soluções. E aí entra a criatividade da equipe envolvida", completou.

Em Verão 90, Zambelli disse que quando a novela chegou perto do 70º episódio, o orçamento para investimento em figurantes já estava no gargalo, e ainda havia 80 capítulos pela frente. Para concluir, precisou pegar dinheiro "emprestado" com departamentos que haviam economizado, como figurino e cenografia, e também alterar as gravações de algumas cenas.

"Um exemplo: no restaurante da cidade cenográfica, eu precisava fazer uma vivência de rua, com carros e gente passando na rua. Em vez de gravar com a rua aparecendo, começamos a gravar para dentro do restaurante, só com o cenário do estabelecimento. Os diretores foram instruídos para isso, e assim fomos economizando", explicou.

Ritmo industrial

Normalmente, são gravadas cerca de 30 cenas por dia para fechar um capítulo de uma novela. E Zambelli admite que o ritmo enlouquecedor faz com que a direção escolha cerca de cinco cenas para dar um verniz maior, e todas as outras acabam entrando em uma escala de produção.

"Novela é pizzaria. Se você tem um pedido de 30 pizzas, 25 serão de mussarela, e tem uma que é de shitake, outra de rúcula, que são mais elaboradas. Mas a maioria é mussarela. É um processo industrial e tem que ser assim", explicou.

Além do ritmo avassalador dentro de estúdio, há outro fatos que o diretor aponta como desafiador: as gravações em shopping centers. Os horários disponíveis para executar o trabalho, segundo ele, acaba com qualquer ideal de glamour que envolva o universo das novelas.

"As gravações precisam ser das 7h às 10h, quando o shopping estiver fechado. Se você tem uma Claudia Raia ou uma Mariana Ximenez, por exemplo, elas têm que, no mínimo, estar às 5h30 no local pra caracterização, cabelo e maquiagem. Para isso, precisam acordar umas 4h30 para tomar banho e se deslocar até o local. O glamour acaba ali", avaliou.

Atualmente, Marcelo Zambelli tem atuado de maneira independente e aguarda a finalização da série Os Parças, com Whindersson Nunes como protagonista, que ele dirigiu no segundo semestre do ano passado. A comédia entrará no catálogo do Globoplay no início de 2024.

*A coluna viajou a Vassouras (RJ) a convite da organização do Festival de Cinema.

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