Com um notável estouro em 2018 e carregando o questionável título de “ novo rádio ”, o Podcast vem ganhando espaço nas plataformas de streaming. Em uma pesquisa feita pela Associação Brasileira de Podcasters (ABPOD) no ano passado, 55,4% dos ouvintes desses programas estão no Sudeste – sendo 36,6% apenas de São Paulo, seguido por Rio de Janeiro com 10,8% e Minas Gerais com 8% de ouvintes.
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Porém, está enganado quem pensa que essa é a primeira vez que a onda do Podcast estoura no Brasil. No ano de 2005, esses programas bombaram no país. O “Braincast”, por exemplo, foi um dos pioneiros e continua sendo produzido até hoje. Em 18 de agosto de 2006, ia ao ar o piloto desse programa sem saber se esse formato daria certo ou não aqui no Brasil.
“Éramos amigos, que tinham boas conversas e acreditavam que o papo seria interessante pra mais gente. O que se provou verdade, anos mais tarde. O ‘Braincast’ surgiu como nosso primeiro conteúdo multimídia nesse sentido, em uma época de crescente popularidade dos iPods e MP3 players – quando nem o YouTube existia”, conta Carlos Merigo, fundador do programa.
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Mas se essa onda de podcasts tem crescido a cada dia, Edward Schmitz, um dos idealizadores da Escola do Podcast, acredita que o “boom” ainda vai chegar no Brasil. “Logo teremos um salto com a popularização do podcast, pois tanto o Google, que tem o Google Podcast, como o Spotify, que comprou duas empresas do ramo – a Anchor e a Gimlet – por US$ 500 milhões, entraram de cabeça nesse assunto”, explica.
A forma como o assunto é desenvolvido acabou sendo um dos pontos fortes. “O Podcast gera maior fidelidade por parte do ouvinte, ele se incorpora à rotina das pessoas como nenhuma outra mídia. Alguém que gasta uma hora todos os dias no deslocamento para o trabalho está muito propenso a criar o hábito de consumir esse produto”, acredita Edward.
Lara Krumholz, especialista no assunto e vice-presidente da DynAdmic na América Latina, acredita que não existem motivos específicos para esse “boom” do Podcast no Brasil, mas acredita que o que pode ter ajudado é que esse tipo de conteúdo cativa a criatividade de quem produz e de quem ouve.
“O formato permite explorar um potencial criativo infinito em um modelo de baixo custo na produção dos conteúdos”, fala Lara. “Além de produzirem conteúdos diversificados, especializados e, ao mesmo tempo, direcionados a distintos nichos, eles também seguem a lógica do ‘boom’ das plataformas de streaming”, conclui.
Seguindo essa crescente, muitas empresas e veículos de comunicação começaram a lançar Podcasts e a especialista explica o motivo: “Os meios de comunicação devem estar onde o público está e as grandes empresas de mídia não podem ficar de fora. Foi assim com os conteúdos impressos que passaram a ser digitais. Agora essas empresas também estão produzindo o Podcast porque, se não estiverem presente, podem perder público”.
Novo rádio?
Com uma pegada diferente do rádio, principalmente pelos episódios dos programas não serem ao vivo, Lara acredita que o Podcast pode ser “considerado uma reinvenção do rádio”. “O grande diferencial é a maior possibilidade temática e a liberdade para escutar no momento mais oportuno, poder parar, ouvir depois ou repetir o conteúdo, quando se trata de temas mais complexos”, acredita.
Indo contra a ideia de Lara, Edward Schmitz acredita que os podcasts podem ser considerados, sim, um “novo rádio”. “Da mesma maneira como o YouTube e a Netflix ‘tomaram’ espaço dos canais de TV, o Podcast fará com o rádio. Qualquer pessoa pode ter o seu ‘canal de rádio’ – um Podcast”, pontua.
Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, também conhecido como Tutinha, presidente do Grupo Jovem Pan, conta que há muito tempo a rádio produz Podcast, mas sente que a forma de fazer esse conteúdo mudou, isso porque o público está mais interessado nesse tipo de produto.
“A cada ano que passa inventam uma moda. Agora é o Podcast. O público tem procurado por isso. A Jovem Pan tem quase 35 podcasts, de programas de rádio que viram Podcast até histórias especiais em conteúdos exclusivos para esse formatot”, fala Tutinha que adianta que a rádio Jovem Pan está levantando um arquivo, desde 1950 até os dias de hoje, para montar Podcasts históricos como a narração dos gols de Garrincha e a missão do primeiro homem a pisar na Lua.
Para Tutinha, o Podcast é “um pouquinho de uma história contada no rádio” e ele acredita que essa nova febre veio para somar e não vai superar o rádio – que tem registrado uma crescente em termos de audiência. “Acho que o Podcast veio para ficar. A cada dia estamos melhorando ainda mais os nossos produtos, criando histórias de superação, histórias de vida, do dia a dia e outras mais. Viva o rádio. É a bola da vez.”
Prazo de validade
Por outro lado, com tanto Podcast surgindo, os temas começam a se repetir e o questionamento de que esse fenômeno pode vir a ficar “escondido” novamente paira no ar. Carlos Merigo acredita que, na verdade, o que tem prazo de validade são os Podcast com conteúdo raso. “Pessoas que estão começando os programas porque acreditam ser o formato da moda, mas que, sem consistência ou relevância, vão acabar abandonando”, fala.
“Isso aconteceu com diversos outros formatos, como os blogs e canais de vídeo. Por outro lado, o apetite da audiência e das marcas anunciantes só aumenta. Como sempre, sobrevive quem estiver produzindo conteúdo de qualidade com capacidade para crescer e manter o ouvinte interessado e fiel”, conclui Carlos.
Edward Schmitz acredita que essa onda não vai passar tão cedo. “O podcast veio para ficar e ‘roubar espaço’ de outras mídias, especialmente em vídeo, mas também o rádio, cuja programação é fixa”, declara.
O jornalista Sérgio Spagnuolo, um dos autores da pesquisa “Estatísticas e dados do segmento de Podcasts no Brasil em 2019”, da agência Volt Data Lab, explica que nos Estados Unidos esse formato é muito popular e por lá não param de surgir novos programas e a previsão é que no Brasil essa tendência se repita.
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“O rádio é uma coisa mais dinâmica, boa pro noticiário do dia a dia, ao passo que o Podcast se aprofunda mais em certos temas ou traz mesas redondas. O imediatismo do rádio é insuperável, mas creio que a rádio com programas mais longos pode de fato ser eventualmente ofuscada ou até mesmo substituída pelo Podcast”, avalia Sérgio.