Maio é um mês especial para a cultura geek. Depois do dia 4, quando é comemorado o Dia de Star Wars, o dia 25 também preenche o calendário como uma data de grande comemoração para o mundo geek, sendo comemorado o Dia do Orgulho Nerd ou Dia da Toalha.
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Existem pelo menos três motivos para comemorar o dia 25 de maio, mais conhecido como Dia do Orgulho Nerd. O primeiro é para homenagear o autor da saga “O Guia do Mochileiro das Galáxias”, Douglas Adams, que é uma leitura obrigatória para todo nerd raiz e que tem como símbolo a toalha, único item que o protagonista, Arthur, pega antes de embarcar em uma aventura na nave alienígena que ameaça a Terra.
O segundo motivo é que, nesse mesmo dia em 1977, estreou o filme “Star Wars – Uma Nova Esperança”. E o terceiro pode ser encontrado na série Discworld de Terry Pratchett, outro escritor aclamado pelos nerds, onde há o “Glorioso 25 de maio”, quando a monarquia dá lugar à república. Mas afinal, o que é ser nerd?
Não existe uma resposta muito certa para essa pergunta, mas para Weslley Domingues, social media de 21 anos, é como se fosse uma religião. “Esse mundo não é conquistado por você, ele te conquista aos poucos. É como uma religião, amar e gostar do inexistente”, explica.
Já para Natália Scuriza, analista de cobrança de 19 anos, ser nerd vai muito além de ver um filme ou ler quadrinhos, é mais uma questão de identificação. "É você se identificar por um personagem que é gente igual a gente e criar carinho. Acompanhar uma saga até o fim. Ter dezenas de tralhas do seu herói favorito. Cantarolar uma trilha sonora clássica. É se sentir feliz folheando um quadrinho”, conta.
A assessora Fabiene Mattos define o perfil do nerd como “o cara antenado, que entende de tudo que rola na cultura pop, no mundo da tecnologia e dos quadrinhos. Que gosta de ficar sozinho trancado no quarto enquanto não zera aquele jogo maravilhoso de estratégia que acabou de comprar. É acompanhar e adquirir produtos que só um nerd raiz sabe o valor que tem. É chorar, vibrar e morrer de ansiedade com os filmes que são lançados”.
A musicoterapeuta Luana Caetano, de 28 anos, acredita que todo mundo é um pouco nerd. “Quando existe um assunto que te interessa muito e você se dedica a estudá-lo, discuti-lo, você está sendo nerd naquele assunto. Pode ser na sua área de atuação profissional, com hobbies, com literalmente qualquer coisa”, explica.
O estudante Gabriel Hashimoto, de 22 anos, acredita que a questão de ser nerd é quando você tem afinidade com algum tema específico. “É ser diferente... Cada pessoa possui afinidade com algum tema ou grupo e fica com o ‘título’ desse grupo. Mas para mim é o mais próximo que tenho para virar um super-herói”, conta.
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Inserção no mundo nerd
Weslley Domingues não se recorda quando entrou nesse mundo geek, mas lembra que quando era mais novo ia em locadoras alugar fitas cassetes de seus filmes preferidos. “Desde pequeno sou fã desse universo, lembro de alugar fitas cassetes de ‘Batman: Eternamente’ pra devolver só na segunda – essa era a Netflix da época”, relembra em tom nostálgico. “Coleciono quadrinhos, action figures e camisetas, há algum tempo retornei a ter pôsteres, e claro, quando dá . Minha vida é a cultura pop e minhas raízes são a cultura nerd”, confessa.
Natália Scuriza se considera nerd desde que se entende por gente, mesmo que ela não quisesse fazer parte desse universo, seria impossível. Natália nasceu no dia 4 de maio, quando é comemorado o Dia do Star Wars. “Desde que eu nasci, porque eu nasci com a força. Sempre gostei desse tema de herói e ficção científica, adorava comprar o que fosse do Homem-Aranha, de balão à toalha de banho”, relembra.
O jornalista Gustavo Crispa confessa que todas as suas memórias têm ligação com o universo geek. “Desde bem jovem eu já gostava de jogar vídeo game por horas, ler mangás, HQs e revistinha que falavam de coisas que eu amava”, conta.
Fabiene Mattos confessa que entrou nesse universo depois de ter tido filhos e que mesmo sendo considerado “tarde” para ingressar nesse mundo, hoje é expert no assunto. “Me descobri nerd depois de velha e com filhos (risos). Quando me vi uma jovem mãe de meninos, comecei a explorar quadrinhos e histórias de heróis, não deu outra: me apaixonei. Comecei a seguir e a me inteirar de tudo que acontecia nesse mundo, lendo quadrinhos, assistindo filmes e desenhos animados. Me tornei uma expert e gosto muito mais do que meus dois meninos juntos”, afirma.
A história de Luana Caetano vai além dos super-heróis. Além de ser fã de quadrinhos e filmes, ela sempre foi boa aluna e era rotulada como CDF. “Eu sempre amei ‘X-men’ (tanto o clássico como o evolution) e ‘Sailor Moon’ (série de mangá). Foram meus desenhos da infância junto com os filmes da Disney. Mas além disso, passei também pelo estigma da nerd “cdf”, fui boa aluna, tinha boas notas, não me envolvia em problemas e os professores gostavam de mim”, confessa.
Já Gabriel Hashimoto não consegue lembrar-se de uma única fase em sua infância que não tenha um resquício do universo geek: “Quando penso na infância sempre lembro que segurava um brinquedo do Batman, super-homem, homem aranha e afins. Então desde de criança já gostava desse tipo de enternecimento”.
A jornalista e fundadora do fan site de Robert Downey Jr, Larissa Reis, de 22 anos, se considera nerd há 9 anos. “Acho que desde quando eu assisti ‘Homem de Ferro 2’ nos cinemas, então foi em 2010. Fiquei encantada com aquele universo que tinha acabado de começar, pelo menos na Marvel”, confessa.
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Ser nerd é pop
A popularização desse universo se deu após a Marvel investir de uma forma intensa em suas produções e assim, tornar essa cultura algo mais acessível para o público. “No início dos anos 2000 o nicho era restrito, não havia contato entre o nerd e a sociedade, mas a sociedade só reconhecia os filmes do Superman de Christopher Reeves e os fatídicos Batman's. Creio que o ‘BOOM’ veio com os filmes da Marvel, primeiramente com ‘Homem de Ferro’, de 2008”, explica Weslley Domingues.
Natália Scuriza acredita que o crescimento desse universo é graças ao hype dos filmes de super-heróis. “O hype é filme de herói... Sendo DC ou Marvel, todo mundo conhece algum filme e tem um personagem preferido. Ser nerd deixou de ter uma conotação negativa, e virou algo pop. Todo mundo quer ser desse universo e falar de filmes geeks”, conta.
Para Gustavo Crispa, a popularização do mundo geek se deu porque a sociedade está entendendo e sendo mais receptiva com coisas novas e diferentes do seu mundo. “Vejo a popularidade como consequência de uma sociedade mais aberta e conectada, todos têm acesso a tudo com mais facilidade e acabam descobrindo gosto por aquilo que antes era considerado ‘coisa de nerd’”, fala.
Apesar do aumento do público geek, Fabiene Mattos acredita que isso não seja algo tão legal, pois distancia o real propósito desse universo. “Eu tenho a impressão de que ser nerd está virando moda e não acho isso legal. Hoje, é cool ser pop/Geek/nerd, mas não há profundidade e conhecimento nesses novos adeptos. Acredito que isso incomode sim, principalmente os nerds mais raiz, porque acaba perdendo um pouco da identidade original”, explica.
Já Gabriel acredita que o crescimento desse universo vem das produções baseadas nas histórias em quadrinhos. “Acredito que é por causa do domínio das produções hoje serem baseadas em histórias em quadrinhos. Principalmente os de super-heróis. Então antes o que era de fato um nicho hoje se tornou uma ‘massa’. Dado como o consumo de camisas, brinquedos, filmes aumentaram”, afirma.
O amor pelo cinema e pelas histórias em quadrinhos, fez com que Gabriel decidisse usar seu Instagram como uma forma de expor sua opinião sobre determinados filmes. Intitulado como “Um minuto de cinema”, o estudante de publicidade espera transformar esse hobby em trabalho. “Fazer o 1 minuto é um hobby que espero transformar em trabalho, cinema é praticamente minha vida... Respirar é igual filme. Como possuímos grandes produções de heróis nos últimos meses, possuo até o momento crítica desses filmes”, explica.
Larissa Reis também sente esse mesmo amor por cinema e por Robert Downey Jr, que é tão grande e juntou tudo isso ao criar o fan site para o ator. “A ideia surgiu em 2012. Depois de assistir o filme do ‘Homem de Ferro’ nos cinemas, fiquei apaixonada pelo ator que até então nem sabia o nome, mas reconheci ele de outros filmes. Eu tinha GOSTADO tanto do filme, fui pesquisar mais sobre o Robert e de repente: amor a primeira vista”, confessa.
Para Larissa, esse crescimento do universo ajudou não só aos fãs, mas a marcas para produções: “Com certeza isso ajudou, muitas marcas fazem sucesso por conta disso, marcas grandes vendendo produtos virados ao público geek e nerd, a Piticas por exemplo”.
Mulher no mundo geek
Mesmo com o crescimento, o universo nerd ainda é considerado um espaço masculino. Natália Scuriza revela que as mulheres tem sempre a necessidade de provar algo: “Nós mulheres temos que provar que sabemos qual a diferença entre inumanos e mutantes, mas um homem não precisa fazer isso, porque é homem. Esse é um meio muito machista”.
“Sempre sexualizaram a mulher, principalmente nos quadrinhos. Com collants minúsculos, posições bizarras com um corpo desproporcional só pra agradar os machos. Por isso tem esse pensamento de que ‘mulher não sabe nada’. Mas é capaz das mulheres saberem mais do que os homens ditos ‘nerdões’”, completa.
Luana Caetano explica que o homem nerd aproveita a popularidade desse universo para sair da sua concha de reclusão, mas que não sabe lidar com a quantidade de mulheres nesse meio. “O homem nerd tem aproveitado essa popularidade que a cultura nerd e geek ganhou na última década pra sair da sua concha de reclusão. Eles se sentem confiantes hoje pra ocupar diversos espaços que antes você não os encontrava, mas infelizmente esses meninos cresceram tendo contato com um único tipo de mulher: a que aparece nos quadrinhos”, conta.
“Uma idealização de mulher hiperssexualizada que é sempre a coadjuvante na trama ou só a namorada do herói que não acrescenta nada a história. Eles não sabem lidar com mulheres reais, e em alguns casos nem querem. Daí vem os ataques nos jogos online, ao feminismo, e toda outra pauta ou circunstância que nos coloque como pessoas capazes de serem tão heroínas quanto eles”, afirma.
“Felizmente os homens nascidos já dentro dessa cultura nerd expandida vêem tudo com mais naturalidade”, declara. A musicoterapeuta tem um primo de 20 anos, que também faz parte desse universo e que mesmo com pouca idade, não se cala quando vê alguma atitude machista: “Meu primo é 8 anos mais novo que eu, jogador de LOL e CS, e não se cala quando vê atitude machista, principalmente nos jogos online”.
O preconceito com os nerds
Mas nem sempre ser nerd foi pop. Weslley Domingues relembra que quando mais novo passou por algumas situações nem tão legais e que sofreu muito preconceito por gostar de coisas que não eram tão comuns na época. “Eu era o único da turma que lia quadrinhos e falava sobre personagens fictícios, que eram tão reais quanto as próprias pessoas ao meu lado”, explica.
O social media relembra de duas situações que aconteceram e conta o que fez para superar essas crises. “Cheguei a parar em psiquiatra, pois sofria uma grande repressão da minha turma, já que não falava a ‘mesma língua’ que eles”, fala.
“Dois casos inesquecíveis foram quando meus amigos pegaram meu caderno de artes, que havia feito diversos quadrinhos e eles zombaram de mim, me senti bem chateado com isso a ponto de chorar. E quando meu pai rasgou meus pôsteres de jogos autografados, as pessoas que não estão inseridas nesse meio não reconhecem seu amor por certas coisas”, recorda Weslley.
Fabiene Mattos relata que por ter entrado nesse universo “tarde”, foi alvo de perguntas não tão agradáveis. “Ouvi coisas parecidas como ‘não acha que passou da idade para isso?’, ou o maior absurdo que já ouvi ‘isso é coisa de menino!’. Sério, essa frase me deixa enlouquecida!”, afirma.
Fabiene também afirma que todo esse amor pelo mundo nerd chegou até a “atrapalhar” um relacionamento recente: “Não posso negar que tive problemas, inclusive na minha vida amorosa, por conta da minha paixão. Faço coleções de action figures, baldes de pipocas dos filmes, copos/canecas e camisetas da Piticas. Um ex-namorado recente me questionava a cada compra que eu fazia e foi impossível fazer com que ele entendesse e respeitasse essa minha preferência. E, claro, acabou!”.