Resiliente, corajoso, sobrevivente. Adjetivar Cristiano Burlan é fácil. Difícil é assistir a trilogia do luto, cujo último filme, “Elegia de um Crime”, chega aos cinemas neste fim de semana sem sentir-se só, limado de perspectivas e da humanidade.
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No filme, Cristiano Burlan investiga a morte de sua mãe. Mas não se trata de uma investigação formal. O culpado é sabido, embora esteja foragido. A obra abre com o diretor, também personagem, informando a polícia do paradeiro do responsável pela morte de sua mãe e esbarrando numa inerte e invisível parede de burocracia.
“Elegia de um Crime” dá sequência a “Construção” (2006), sobre a morte de seu pai, e “Mataram Meu Irmão” (2013), sobre o assassinato de um de seus irmãos. Se a tragédia familiar assombra, a capacidade do cineasta de transformá-la em arte que propõe um debate plural, importante e ressonante assombra mais.
Esses três longas, especialmente o último, expõem um cineasta visceral, preocupado com questões tão íntimas quanto sociais. “Antes de mais nada, é um filme. Eles saem do âmbito pessoal e privado e dialogam com o público em geral”, observa em conversa com o iG Gente .
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O cineasta, que também é personagem central do filme, fala sobre esse dolorido, ruidoso e singular processo criativo. “Como cineasta eu preciso ter uma relação com o meu objeto e ela não pode ser fria. No entanto, é impossível fazer cinema sem um prisma pessoal. Há sempre um olhar humano sobre o outro”.
Na frente das câmeras
Burlan diz que prefere “pensar muito” no que não quer fazer e pacificou-se com o fato de “ir para frente das câmeras” neste filme em que interage com parentes e outras pessoas ligadas ao crime ou à vida de Isabel Burlan da Silva, de quem traça um perfil cheio de memórias e afetos.
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Sem deixar de ser um filme denúncia, que abraça um debate amplo sobre violência e marginalização, para não citar o feminicídio, “Elegia de um Crime” é o esforço de Cristiano Burlan de “tentar entender como realizador o mundo que a gente vive”. Ele ressalva que muito do que descobriu com seus filmes ficou de fora das montagens finais: “Fui até onde pude por questão de sanidade”.