Fazer humor político não é algo fácil, mas Armando Iannucci, criador da série “Veep”, parece dominar os artifícios dessa ciência tão precisa e delicada. Não à toa seu primeiro filme como diretor, “A Morte de Stalin”, é uma comédia de erros que lembra muito o humor frenético e com altas doses de deboche da ótima série da HBO.
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Não se trata de uma colagem ou algo que o valha. “A Morte de Stalin” é um filme com um ponto de vista muito sólido e nada estranho às convicções do ocidente sobre o momento histórico da União Soviética quando da morte de seu líder Josef Stalin em 1953. É das circunstâncias ensejadas pela partida do todo poderoso da URSS que o filme de Iannucci se ocupa.
O filme começa com o desespero flagrante do responsável por uma casa de espetáculos soviética com o manifesto interesse de Stalin em ouvir uma gravação da apresentação da orquestra naquela noite. Ocorre que nenhuma gravação foi feita. O pavor ensejado pelo ditador é tamanho que o homem faz o possível e o impossível para realizar a gravação. É um ponto de partida entusiasmante e com a assinatura de Iannucci.
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A estrutura de poder soviética, toda ela resolvida para atender os caprichos de Stalin, se depara com um vácuo de poder e desorganizadamente se movimenta para preenchê-lo. Iannucci imagina com certo escárnio e muito cinismo como se deu o processo de sucessão do ditador.
Dos bastidores tumultuados às intrigas forjadas, passando por agendas e métodos conflitantes, a entourage de Stalin ganha viço e pose com performances salutares de nomes como Steve Buscemi , Jeffrey Tambor, Jason Isaacs e especialmente Simon Russell Beale que dá vida a Lavrentiy Beria, um dos políticos mais próximos de Stalin que ensaia um governo populista e menos opressor e começa a encontrar oposição dentro de seu grupo.
“A Morte de Stalin” traz consigo a representação de certos clichês dentro da estrutura político-partidária, mesmo quando se há apenas um partido no Poder , como era o caso do Partido Comunista da União Soviética. É observar a lógica essencialmente capitalista dessa engrenagem naquele contexto que torna o filme tão eloquente e capcioso.
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O humor político em Iannucci flui do mais físico ao bonachão, da conotação sexual ao fundo histórico e encontra em “A Morte de Stalin” uma alegoria vivaz e ruidosa da disruptura entre a idealização da atividade política e sua rotina.