Monstros feios e endiabrados, os gremlins não surgiram como personagens de cinema cômicos e sombrios. Embora tenham se popularizados pelos filmes homônimos de 1984 e 1990, eles já são conhecidos há bastante tempo. Há relatos sobre eles que datam de meados do século 5, quando a língua inglesa estava em formação, e de suas traquinagens desde a Segunda Guerra.
Também nem sempre foram retratados como criaturas familiarizadas com cidades e de olhos grandes, dentes pontiagudos e garras afiadas, como se fossem resultado do cruzamento de morcegos com lagartos. No passado, estavam mais alinhados com duendes, espíritos, criaturas de contos de fada e até homens em miniatura. Seu habitat eram florestas, pântanos e céus.
Origem dos monstrinhos
Nos filmes que os consagraram, os gremlins surgem de uma metamorfose pela qual passam os mogwais, bichinhos fofos, simpáticos e supostamente de origem chinesa que não podem de jeito nenhum ser alimentados após a meia-noite. Se isso acontecer e depois eles entrarem em contato com a água, as consequências podem ser terríveis. Convertidos em gremlins, seu lado maléfico, eles se multiplicam, vandalizam e destroem tudo pelo caminho e atacam pessoas.
Fora das telas, porém, a história deles é um pouco diferente. Segundo o folclorista John W. Hazen, a palavra “gremlin” é originária do inglês antigo “grëmian”, que significa algo como “irritar” ou “incomodar”. Eram conhecidos por antigas tribos de origem germânica que dominaram a Grã-Bretanha e se estabeleceram nela há séculos. Mas na sua mitologia essas criaturas eram, na verdade, espíritos de duendes avistados por pescadores e marinheiros.
Carol Rose, pesquisadora da Universidade de Kent, na Inglaterra, porém, tem outra versão. Ela acredita que o termo “gremlin” foi cunhado a partir da combinação das palavras “grimm”, em alusão aos irmãos Grimm, escritores de fábulas infantis do início do século 19, e “fremlin”, uma cerveja inglesa tão antiga quanto eles. Parece que alguém tinha o hábito de beber enquanto lia os contos dos Grimm e depois jurava ver seres fantásticos. “Gremlin” também aparece em um romance de 1938 como sinônimo de “místico” e para descrever a Escócia.
Causadores de acidentes
Durante a Segunda Guerra (1939-1945) e mesmo antes, também há relatos de pilotos da Força Aérea Real britânica (RAF, na sigla em inglês) e seus aliados que afirmaram ter sido vítimas de gremlins. Eles os descreviam como criaturas bizarras e travessas que tocavam o terror quase sempre durante voos sobre o território europeu, incluindo áreas de mar. Charles Lindbergh, pioneiro da aviação americana, chegou a escrever um livro em que narra seu encontro com essas “presenças fantasmagóricas”.
Jornais antigos traziam depoimentos sobre a existência de uma horda de espíritos misteriosos e maliciosos ou mesmo trolls em miniatura que sabiam de tecnologia e maquinário e mexiam com os controles de voo, sabotavam motores, causavam panes elétricas, acidentes inexplicáveis e não poupavam nem mesmo os inimigos nazistas. Eram oportunistas e não faziam distinção entre os oponentes, queriam apenas se divertir. Os governos britânico e americano teriam até tentado investigar o “fenômeno” e mandaram confeccionar manuais e pôsteres com ilustrações sobre as táticas adotadas pelos gremlins e maneiras para distraí-los e evitar acidentes fatais.
Hoje, porém, mais do que alucinações, aparições ou seres lendários, são lembrados como os responsáveis por terem ajudado a levantar o moral dos pilotos. O historiador Marlin Bressi explica que por mais odiados que fossem, serviam como bodes expiatórios dos problemas tecnológicos e mecânicos dos aviões. Ao levarem a culpa por erros e falhas humanas, evitavam assim acusações entre os membros dos esquadrões e que poderiam prejudicar os combates.
Personagens populares
Ainda durante a guerra, Roald Dahl, que serviu como aviador pela Inglaterra e quase morreu em um acidente aéreo, publicou em 1943 um livro sobre eles, “Os Gremlins”. A obra quase virou um filme infantil de Walt Disney e fez tanto sucesso que rendeu revistas em quadrinhos, vendeu mais de 50 mil cópias no seu primeiro ano e deslanchou a carreira de Dahl como escritor. Foi ele quem criou “A Fantástica Fábrica de Chocolate”, “Matilda” e “As Bruxas”.
Em meados da década de 1980, Steven Spielberg e o diretor Joe Dante então tiveram a ideia de produzir um filme sobre os gremlins e o sucesso foi tamanho que em 1990 ganhou uma sequência e até hoje é lembrado como um clássico do cinema desse período. Os personagens foram vagamente inspirados nas descrições do livro de Roald Dahl, sendo que sua aparência assustadora se baseou mais pelos relatos e anotações dos pilotos da Segunda Guerra.
Segundo alguns deles, as criaturas tinham cerca de um metro de altura, braços longos, olhos vermelhos, orelhas grandes e pontudas e algumas possuíam chifres, pelos e asas de morcego. Quanto ao comportamento delas, registraram que dançavam, riam e saltitavam loucamente sobre a fuselagem externa dos aviões, batendo e puxando tudo e não se intimidavam com nada. Portanto, se você pegar um voo e enfrentar turbulência, já sabe o que pode ser...
Fontes: Livros “Spirits, Fairies, Gnomes, and Goblins: An Encyclopedia”, de Carol Rose; “Ghosts of the USS Yorktown: The Phantoms of Patriots Point”, de Bruce Orr; “Storyteller: The Authorized Biography of Roald Dahl”, de Donald Sturrock; “Funk and Wagnalls Standard Dictionary of Folklore, Mythology and Legend”, de Maria Leach e Jerome Fried; “The Illustrated Encyclopedia of Aviation and Space, Volume 6., de Sasser Sanford Jr.