Há certa obsessão do cinema nacional com a ditadura e dessa obsessão resultam bons filmes e outros nem tanto. "Deslembro", projeto impregnado de passionalidade por Flavia Castro, que assina roteiro e direção, infelizmente pertence ao segundo grupo.
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O longa, que é produzido por Walter Salles, trata da formação da identidade e da importância da memória, seja ela afetiva, racional ou fática, neste processo. Tudo a partir da adaptação imposta a Joana (Jeanne Boudier) por sua mãe que resolve voltar ao Brasil durante a anistia após exílio na França. "Deslembro" começa com todos falando francês, inclusive o marido e revolucionário chileno da mãe de Joana.
A memória do pai Eduardo, papel de Jesuita Barbosa, passa a ser uma questão de maior importância à medida que ela descobre o Brasil. A necessidade de se politizar porque a política faz parte de tudo à volta e de lidar com questões que não a orbitavam empurram Joana para um amadurecimento forçado. Este é um filme de rito de passagem, mas em outro tom.
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É justamente nesse arremedo que o filme se entorta. Falta ritmo, falta capricho à dramaturgia e falta articulação às ideias. É tudo belamente filmado, adornado por uma trilha sonora diegética de excelente gosto, mas a direção é burocrática e falta refinamento ao roteiro.
É difícil alcançar alguma identificação com Joana e o fluxo entre francês, português e espanhol parece apenas birra da realização. Há muita prepotência na maneira como os conflitos são apresentados e os reais objetivos da realização acabam ofuscados por toda essa celeuma cinética.
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"Deslembro" é um filme que se preocupa tanto com seu pedigree que acaba negligenciando tanto suas personagens como seu público.
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Ficha técnica
Deslembro
Gênero: Drama
País de Origem: Brasil
Duração: 96 minutos
Classificação Etária: 14 anos
Direção: Flavia Castro
Roteiro: Flavia Castro
Elenco: Jeanne Boudier, Sara Antunes, Hugo Abranches, Eliane Giardini e Jesuita Barbosa
Data de estreia: 20 de junho