“Coisa que gosto é poder partir sem ter planos”, diz a música “Encontros e despedidas”, composta por Milton Nascimento e Fernando Brant, projetada na voz de Maria Rita. O verso tem sido lema de Fátima Bernardes, de 59 anos, a 40 dias de deixar o matinal que, há exatos dez anos, ela sonhou e elaborou junto de sua equipe, na transição do jornalismo para o entretenimento.
Depois de 1º de julho, quando apresentará o “Encontro com Fátima Bernardes” ao vivo pela última vez, ela afirma não ter absolutamente nada programado em seu calendário pessoal. É provável que só volte a reencontrar o público em outubro, quando está prevista a sua estreia no semanal “The voice”.
Até lá, como canta outro mestre da música popular brasileira, Zeca Pagodinho, é “deixa a vida me levar”. “O que eu mais quero agora é exatamente não ter que planejar tudo, não ter todos os quadradinhos da minha agenda preenchidos. Senão não vai fazer diferença”, sublinha Fátima nesta entrevista exclusiva ao EXTRA, em que revela as motivações de mais essa virada em sua carreira, analisa erros e acertos da atração que leva a sua assinatura, responde as críticas às suas ausências no comando diário do programa e adianta como será o mês de despedidas especiais a esse ciclo que se encerra.
Qual tem sido o sentimento predominante nesses últimos dias à frente do “Encontro”?
Estamos planejando muita coisa para cada dia do mês de junho. Então, por causa dessa parte prática, eu estava no automático, não pensando na despedida em si. Mas na semana passada gravei o que vai ser a abertura do programa especial de aniversário, no dia 24 (o programa completa 10 anos no dia 25, mas cai num sábado). Nossa, eu fiquei muito emocionada! É um filme que passa, né? Eu estava escrevendo o texto e pensando em tudo o que aconteceu nesse período. Como foi bonita essa construção, como eu fui abraçada pelos atores, pelos cantores, pelo público.... Completar a minha transição é algo que eu queria muito, isso pra mim estava muito claro. Mas tem sido exatamente como na época da despedida do “Jornal Nacional”: uma sensação boa de fechar um ciclo e vir outro por aí. O momento de entregar a chave é de emoção. Não é de tristeza, ao contrário, mas de muita intensidade. Eu gosto de viver essas avaliações, repensar e gostar do que foi feito.
É curioso: foi Patricia Poeta quem a substituiu na bancada do “Jornal Nacional”, e agora acontece o mesmo no “Encontro”...
Pois é! Eu e Patricia temos trajetórias parecidas, até pela nossa formação como jornalistas. As duas com vontade de passar pelo entretenimento. Eu fiz “Fantástico”, fui para o “Jornal Nacional” e estreei o “Encontro”. Ela esteve nos mesmos programas. Os caminhos vão se cruzando.
Vai haver uma passagem de bastão oficial?
Sim, vai ter. Com Manoel (Soares, que também será titular do “Encontro”), eu já estive no palco do programa, seja ele sendo convidado para falar sobre algum tema ou como parceiro. Mas acho que com Patricia, acho que nunca. Porque ela sempre vinha para me substituir. Então, vai ser a primeira vez que nós duas vamos estar juntas no mesmo 'Encontro'. Vai ser ótimo, uma transição bem tranquila, bem suave. Eu acho muito bacana o programa ter construído uma história forte a ponto de ele já fazer parte do dia a dia das pessoas e permanecer no ar. Saber que esse espaço está garantido é muito recompensador para quem sonhou com ele lá atrás. Agora, com uma nova condução, mas ainda como um ponto de encontro com o público.
Você e Patricia não estiveram juntas em cena, mas têm conversado sobre essa transição nos bastidores?
Só por mensagem. Eu estou completamente envolvida com os últimos programas, ela também trabalha muito no “É de casa”... Mas está tudo muito tranquilo. Nem tenho o que passar pra ela, que já está mais do que integrada. Quando eu fiz a cirurgia no ombro (em outubro de 2021), ela ficou seis semanas ali. Antes, na minha cirurgia do câncer (de endométrio, em dezembro de 2020), também. Patricia tem passagens longas pelo “Encontro”, conhece bem a equipe, tanto ela quanto Manoel. Mas, claro, mais perto (da troca) a gente vai começar a falar mais sobre isso, bater papo mesmo, porque a passagem já está mais do que feita.
Quando você se lançou nesse projeto, dez anos atrás, sentia que seria um ciclo por tempo determinado?
Não tinha um prazo de validade. Por mais que Manoel Martins (diretor de entretenimento na época) me dissesse que quando o programa entrasse no ar não sairia mais, eu pensava: “Será que vai dar certo mesmo?”. Essa dúvida era gostosa. Eu sou uma pessoa que me observa muito, sempre fui assim. Recentemente, comecei a pensar: “Já estou aqui há um tempo, o programa está mais do que estabelecido, ninguém tem dúvidas sobre como ele é, como funciona... O que eu quero agora?”. Eu queria tirar todo o jornalismo do meu trabalho. Porque esse é o meu porto seguro, sempre foi a praia onde surfei. Então, passei a desejar algo completamente diferente.
O “The voice” lhe foi apresentado como uma sugestão ou foi você que mencionou a vontade de assumir o show de talentos?
Muito sinceramente, foi apresentada essa sugestão a mim. Eu não desejei o “The voice”. Eu só queria uma nova transição para o entretenimento. Quando veio a ideia do “The voice”, eu achei muito bacana, porque sempre briguei muito para que o meu programa tivesse música diariamente. Não é fácil contar com cantores e banda de manhã cedo, eles estão acostumados a trabalhar à noite e de madrugada. Mas, hoje, adoram o espaço e reconhecem sua importância. Além disso, agora eu vou experimentar fazer um programa com formato pronto, porque o “Encontro” foi criado por mim com um monte de gente junto. Não tenho nem ideia de como vai ser. Ainda desconheço o cronograma: quando grava, quantos dias são de audições às cegas... Não sei nada ainda, nem quero. Como a minha primeira temporada é só em outubro, é melhor eu ficar completamente focada agora no que a gente quer celebrar nesses 10 anos do “Encontro”.
Como serão as comemorações desse aniversário?
A equipe teve a ideia de cada pessoa ficar responsável por rever um ano inteiro. Tem dez pessoas olhando todos os programas. Nada vai escapar. Outro dia, me perguntaram se eu lembrava ter deitado numa cama de pregos. Eu não lembrava. Vão vir memórias novas, fora do que geralmente é lembrado numa reunião de pauta. A gente vai reencontrar pessoas e histórias, relembrar memes, rever artistas que começaram no “Encontro”, crianças que brilharam ali no palco e cresceram, passagens divertidas... São muitos momentos bacanas, quase 2.600 programas no total. A ideia é falar desse DNA do “Encontro”: um espaço de diversidade, respeito, atualidade, humor, dança. Eu, por exemplo, voltei a dançar um ano após a estreia do “Encontro”, em 2013. Durante do “JN”, as aulas aconteciam em horários que eu não tinha disponíveis, meus filhos eram pequenos... Estou parada há dois anos, desde o início da pandemia, mas quero retomar. Enfim, essa retrospectiva começa no dia 1º de junho. Já me perguntaram se eu quero surpresas, falei que sim, sempre é bom. Já preparei a maquiagem à prova d’água.
Você é saudosista? Quer levar algum objeto de cena ou figurino de recordação?
Eu já tenho de dois cenários: uma escultura de ferro do Corcovado e uma boneca de uma artesã. Coleciono bonecas de artistas brasileiros. Acho que eu vou querer mais, sim, boa ideia! Aquela mesinha do meio do palco tem umas coisas bem bonitinhas. Acho legal ter um souvenir, algo simbólico, de recordação, mas não sou uma pessoa que se liga ao passado, não. Estou sempre olhando para mais adiante, o meu maior exercício é prestar atenção no agora. Quero aproveitar mais o presente.
Quando e por que você começou a perceber que não estava mais tão satisfeita no comando do “Encontro”?
Não é que eu estivesse insatisfeita. Uma pessoa que tem um programa que leva o seu próprio nome funcionando... Isso tem um valor enorme! Mas a minha vida toda foi de trabalho diário, completei 35 anos de TV Globo em fevereiro. Em 2020, com a pandemia, eu comecei a pensar em mudança para ter um pouco mais de flexibilidade. O “Encontro” só ficou fora do ar durante um mês. Eu tenho uma casa numa região de praia, mas não dava pra eu fazer home office, como muita gente fez. O fato de ter tido câncer me fez ver que a gente tem que dar uma virada na vida. Uma outra coisa foi o meu filho ter ido estudar fora. Ele está na França há quase dois anos (Vinicius estuda Engenharia da Computação por lá) e eu só consegui ir uma vez vê-lo. Agora, Laura (a outra filha, formada em Psicologia) também está querendo ir estudar fora. Meu namorado (o deputado federal Túlio Gadêlha) mora em outras duas cidades (Recife e Brasília). Percebi que eu preciso ter uma lista mais equilibrada do que eu devo e do que eu quero fazer. Qualquer viagem que eu faça tem que ser no meio da tarde de sexta-feira, após o programa ao vivo, e eu tenho que estar de volta no domingo, já preparando o de segunda-feira. Eu não sei chegar de surpresa no trabalho, preciso participar de todo o processo. Então, a minha vida tem muito pouco tempo livre. Todos os dias, depois do programa, temos uma reunião que começa entre 13h30 e 14h. Depois, sempre tenho um compromisso. Agora, por exemplo, tenho feito fisioterapia quatro vezes por semana. Quando dá 18h, eu já ligo no jornal da GloboNews para saber o que está acontecendo, olho os relatórios sobre as pessoas que vão estar no programa no dia seguinte, os temas que preciso estudar, assisto ao “Jornal Nacional”, emendo em “Pantanal”, porque a gente está falando sobre a novela. Não passa um domingo em que eu me desligue totalmente, preciso saber sobre a rodada do futebol, o que está sendo mostrado no “Fantástico”... São muitas responsabilidades. E o público espera de mim que, caso aconteça alguma coisa de manhã, em termos de notícia, eu entre no ar com algo esclarecedor.
Em algum momento você quis sair da Globo, parar de trabalhar?
Jamais pensei em parar. Meu contrato ainda nem terminou, não começou o do “Voice” ainda... Tem tanta besteira sendo falada! Eu não me vejo indo para um outro lugar e começando uma nova história. Posso fazer coisas para o streaming, futuramente, pensar projetos para o Globoplay. Aliás, tenho e recebi várias ideias de outras pessoas. Mas não é esse o momento. Agora é a hora de eu fazer o que vou fazer: voltar para o horário noturno num programa que fala de sonhos e planos. Isso muito me agrada, vai me fazer bem. O “Encontro” é um espaço para pessoas que sofrem todo tipo de violência reverberar essa dor. Tantas mães eu já entrevistei que perderam filhos! Tantas tragédias familiares e nacionais eu me vejo diariamente cobrindo. Acho que a partir de agora posso contribuir de um outro jeito. É um novo desafio, e eu estou muito feliz com ele. Gosto de coisa nova, mudança traz frescor para todos os lados, jovialidade, olhos brilhando... Eu sou uma profissional inquieta, sempre falei isso para todos os meus chefes: pensem sempre em mim para mudanças, não sou apegada.
O que a motiva a continuar na TV?
Saber que eu ainda tenho muito a descobrir, a aprender. Quando eu percebo estar num lugar que eu não domino, isso me faz um bem enorme. Deve ser muito ruim ficar com a sensação de que já se fez tudo. Se você perguntar pra Fernanda Montenegro, ela vai te dizer que ainda não fez tudo, embora o público acredite nisso.
E você, realizou tudo o que queria à frente do “Encontro”?
Ah, sim. Isso, com certeza. Não ficou nada para trás. A única coisa é que eu gostaria de voltar a ter as cem pessoas na plateia antes de deixar o programa. Mas acho que não vai ser possível... Hoje (no último dia 16) foi a primeira vez da plateia sem máscaras, com 25 pessoas. Eu adoraria ver a plateia cheia de novo, mas isso não depende da gente.
Como seus pais, seus filhos e seu namorado reagiram a mais essa mudança na sua carreira?
O susto foi lá na época em que eu disse que ia sair do “Jornal Nacional”. Agora, todo mundo entendeu. Acham que eu estou num caminho bom, que vai ser bacana diminuir o ritmo diário para ter mais espaço para coisas que me agradam fora do trabalho. Eu gosto de estudar dança, por exemplo. E sempre foi tão corrido, só quando sobrava tempo... Não sei como é a rotina do “Voice”, mas certamente não será igual à que eu tenho hoje.
Já planejou o seu dia a dia a partir de julho?
Se eu planejar, me internem, gente! O que eu quero agora é exatamente o oposto disso: não ter que planejar tudo. Eu não quero estar cheia de compromissos, senão não vai fazer diferença. Quero ter esse momento de acordar sem despertador, tomar um café da manhã em casa com calma, ler o jornal, fazer a minha atividade física e aí pensar no que fazer. Não quero mais ter todos os quadradinhos da agenda preenchidos. Nem viagem eu tenho planejada a partir de julho, absolutamente nada. A única coisa que eu sei é que nesse mês a minha sobrinha vai chegar da França, para fazer um estágio no Brasil, e vai ficar aqui em casa. É a única certeza que eu tenho pra esse mês.
Você costuma acordar em que horário, diariamente?
Às 6h45, mais ou menos. Acordo, tomo um banho e saio com o cabelo molhado. Às 7h10 já estou no carro indo trabalhar. Deixo a roupa separada no dia anterior. No camarim, enquanto seco o cabelo, já leio o roteiro daquele dia, vou pra maquiagem, a gente faz uma reunião, volto pra sala e mexo na internet pra saber o que está na nuvem de assuntos mais comentados do dia. Às 9h30, eu me visto, 9h45 tem uma outra reunião final. Volto para o camarim, dou os últimos retoques e às 10h45 eu estou no palco.
Aos fins de semana você consegue acordar um pouco mais tarde, ou o relógio biológico não permite?
Consigo! Eu vim sem relógio biológico, só acordo com o despertador tocando. Aos fins de semana, desperto naturalmente, entre 9h e 10h. Não gosto de perder a manhã dormindo, mas tenho um cansaço acumulado, porque às vezes não consigo dormir antes de 1h. Então fica puxado. Aí tenho que dar uma compensadinha no sábado e no domingo. Mas eu não saio à noite em dias de semana. Até jantar na casa de amigos eu evito, nem chamo ninguém pra minha casa. Realmente, é uma rotina muito certinha. Eu janto, vejo o “Jornal Nacional”, faço as fichas, aí vou falar com o Túlio, porque ele sai da Câmara tarde...
Qual é a combinação entre você e Túlio com relação a se encontrarem pessoalmente?
Nunca ficamos mais do que duas semanas longe um do outro. Normalmente, ele vem numa semana, eu vou na outra. Tentamos equilibrar, porque viajar toda semana é puxado para ambos. Se ele vem pro Rio, eu “descanso”. Se na outra semana eu e ele vamos pra Recife, os dois viajam: eu do Rio e ele de Brasília. Na semana seguinte, pra ele poder descansar, eu vou até Brasília. Às vezes, se tem uma data comemorativa, tipo Dia das Mães, em que eu fiquei no Rio, a gente não se vê.
Vocês moraram juntos no Rio durante a pandemia, quando ele pôde trabalhar de casa. Como foi essa experiência?
Ele ficou direto aqui em casa por cinco meses, porque Brasília ficou o ano de 2020 todo de home office, até a chegada da vacina. Essa nossa convivência intensa deu muito certo, a gente se combina muito bem. Tenho um quarto em casa que funciona como escritório, brincava que ali era Brasília. Ele passava o dia lá, mas a gente conseguia se ver, almoçar junto, jantar. Não temos perspectiva de morar junto definitivamente. Ele não pode vir morar no Rio; eu tenho meus pais e filhos aqui, também não posso ir morar em Brasília nem em Recife. A gente já leva o tipo de vida junto que consegue ter, se dividindo entre três cidades. Não mudaria nada dizer “agora somos casados”. Já somos companheiros, parceiros, a gente já se sente comprometido um com o outro desde o início do relacionamento (2 de novembro de 2017). Então, (casar e morar junto) não é algo que a gente planeje. Sabemos que a nossa vida é esse triângulo, e tentamos estar a maior parte do tempo possível juntos. E assim vamos levando, sem sofrer pelo que não tem solução.
Sua outra filha, Beatriz, tem se mostrado uma boa cantora. Já pensou nela se apresentando no “The voice” e virando as cadeiras dos técnicos do programa?
Cantora nada! (risos) Ela faz aulas de canto há muitos anos, é como se fosse uma terapia pra ela, que é muito tímida. Mas leva o canto como uma diversão. Bia fez faculdade de Design, já trabalha nessa área. Está encaminhada, felizmente. Agora, sobre ir para o "The voice", só se ela tivesse se inscrito antes. Depois que eu estiver lá, perdeu a chance, não tem mais vez. Agora, já era (risos).
Cantar é uma habilidade que você sempre falou que não tem. E agora vai apresentar um programa musical, de calouros...
Não tenho mesmo, sou horrível cantando! Quando tentei cantar “Evidências” no “Encontro”, errei a letra. Vamos esquecer, né? Mas eu vou ter a chance de lidar com pessoas muito talentosas na música, com técnicos. Acho que vou aprender tanta coisa de música!
Você já gravou o piloto do programa?
Nada, menina! Disseram que eu gravei, né? Eu ainda nem falei com o Boninho! Não sei nem quais são os técnicos da próxima temporada, não sei absolutamente do “Voice”. Estou muito focada nesse último mês do “Encontro”. A abertura do programa do dia 24 de junho vai ser linda! Não posso adiantar, é segredo, mas vai ser diferente.
Você deve ter tomado conhecimento das críticas em torno da sua ausência no comando do “Encontro”... As pessoas comentam: “Quantas férias Fátima tem por ano”?
Mas, gente, isso é muito injusto! Quando você passa por uma cirurgia de câncer e consegue voltar ao trabalho em um mês, ninguém diz que você retornou mais rápido do que qualquer pessoa. Depois, eu faço uma cirurgia no ombro que me deixa com uma tipoia no braço, afastada por seis semanas. Voltei a trabalhar sem conseguir botar a mão na cabeça. Isso ninguém vê. Sinto muito, mas a Globo nunca considerou afastamento por doença como férias. Eu dormia recostada num triângulo, com um braço afastado do corpo. Isso são férias? Não! Então, quando estou curada, é lógico que vou tirar as minhas férias. A primeira coisa que ouvi dos meus chefes foi: “Você tem que ficar boa, esqueça o restante”. Nunca entendi essa cobrança das pessoas, como se eu fosse servidora pública. Eu sou funcionária de uma empresa particular que reconhece o meu trabalho e a minha necessidade de repouso também. Às vezes, falam porque gostam de mim e não querem me ver fora do programa. Eu entendo, mas preciso de descanso, de recuperação, pra voltar melhor. Quando no “Jornal Nacional”, eu não trabalhava em nenhum feriadão, e ninguém nunca falou nada. No “Encontro”, tem dias em que gravo à tarde e ninguém vê. Fiz várias aulas fora do horário de trabalho para quadros do programa... Eu sei o quanto eu dedico da minha vida para o trabalho. Se eu vou entrevistar uma escritora, leio o livro dela antes. Se o ator com quem vou falar está lançando um filme, eu assisto antes.
Quais foram os grandes encontros que o “Encontro” lhe proporcionou?
Tive a chance de conhecer pessoalmente gente que eu acompanhava desde a minha infância. Quando eu tive o meu primeiro encontro com Jair Rodrigues, por exemplo, eu fiquei muito emocionada. Porque era um artista que as pessoas da minha casa gostavam. Martinho da Vila também. Lima Duarte, Fernanda Montenegro, que eu só via como telespectadora e depois encontrei ali numa situação diferente, isso pra mim foi muito especial. Tive muitos encontros felizes. E um grande encontro, que estava na primeira carta de intenções desse programa, era o de anônimos e famosos conversando sobre assuntos da vida, não só sobre a carreira deles. As pautas do dia a dia foram discutidas de igual pra igual. A plateia sempre teve muita importância para o programa. Ela me permitiu manter contato diário com o mundo real. Quando eu saí do jornalismo, tinha essa preocupação de, dentro do estúdio, me desconectar. E isso não aconteceu porque essa plateia estava lá reverberando os assuntos, falando, não só contemplando.
De tudo o que foi pensado dez anos atrás, qual foi o maior equívoco e logo saiu de cena?
Eu acho que foi a gente fazer uma plateia circular, no início. Quando eu cheguei, tinha muita vontade desse “abraço”, o cenário era assim. Mas é difícil falar de frente pra um, de costas pro outro. E lá naquela época a gente usava pouco a plateia. O maior acerto foi tirá-la da posição de observadora do programa para a de participante ativa.
Qual foi a maior saia justa ao vivo?
Cair no palco jogando capoeira com Rodrigo Simas, achando que estava abafando de salto alto (risos)... O senhorzinho que levantou e avisou que iria ao banheiro durante o programa... Eu sou uma fábrica de memes, né? Todo dia tem alguma coisa diferente acontecendo. Teve um programa que eu não consegui abrir porque me acabei de rir com Eduardo Sterblitch dançando. Ele é uma figura que tem que estar lembrada nos grandes momentos do “Encontro”.
Por falar em riso, qual foi o real motivo de o humorista Victor Sarro deixar o programa, lá no início? Ele conta que você não riu de uma piada dele e ele foi demitido...
Que nada! Naquele início, havia duas pessoas ligadas a humor, Victor e (Marcos) Veras. Ainda não sabíamos bem como isso ia funcionar. Veras interagia com o público nas ruas, e isso funcionou muito bem. Então, a gente se decidiu por um. A história da piada sem grça que Victor conta é de quando uma pessoa que se acidentou com um caminhão de laranjas foi ao “Encontro”. Ele estava lá no palco, com a perna esticada, me contando que as laranjas que tomou ajudaram na espera por socorro, durante dias, num barranco... Aí Victor me chama: “Fátima, Fátima, pelo menos de gripe ele não morre”. A gente deu aquela risadinha para não perder o amigo, né? Mas é óbvio que não foi isso, Victor sabe. Ele brinca com isso nos shows dele, eu e minhas filhas já fomos assistir. O fato é que não tinha espaço para duas pessoas de humor no programa. Veras foi o parceiro que ficou mais tempo. E é natural essa coisa cíclica, houve repórteres que passaram pelo “Encontro” e voltaram para o jornalismo (como a veterana Lília Teles).
Qual momento considera ter sido mais difícil nesses dez anos?
Todos os de morte são muito difíceis. Um dos mais complicados foi a partida do Cristiano Araújo, por ter acontecido de manhã cedo. Nós fizemos um programa inteiro sem saber como seria. E quando morreu Tarcísio Meira e Paulo José, um na sequência do outro. Eu estava dando a notícia sobre o primeiro, quando chegou a informação do outro. Foi muito difícil! Gabriel Diniz também... É complicado fazer a transição do assunto morte para outro, mais leve. E teve a tragédia da chuva em Petrópolis, o rompimento da barragem em Mariana, mães que perderam seus filhos... É muita dor e sofrimento. Ali é um espaço para as pessoas serem ouvidas. Na pandemia, sem quase ninguém no estúdio, eu interagi com o telão, sem nenhum artista, nenhum músico no palco. Foi um período de grande desgaste emocional. Mas tudo valeu a pena, absolutamente tudo.
A alma não é pequena, não é, Fátima?
No “Big terapia” que Paulo Vieira fez de surpresa no seu programa, você brincou que aposentou o Bob Esponja mais cedo, quando a TV Globinho deu lugar ao “Encontro”. Sabe de crianças que são suas telespectadoras fiéis?
Ah, esse dia com o Paulo foi muito bom... Eu adoro uma surpresa! Confesso que é difícil me surpreender, porque fuxico tudo. Mas eu me diverti muito com ele... Sobre o público infantil, muitas mães me dizem que os filhos acompanham o “Encontro” com elas, antes de irem pra escola. Eu notei um público mais jovem mais próximo de mim. Na época do “Jornal Nacional”, as crianças e adolescentes me encontravam na rua e ficavam só olhando de longe. Depois do "Encontro", se estou dentro de uma loja, fica uma galerinha na porta esperando. No shopping, me seguem pelos corredores, fazem brincadeiras. Como a gente aborda muito assunto de internet, fala de tuítes, os jovens acabaram acompanhando mesmo. Eu tenho essa percepção.
Seu perfil no Instagram acabou de atingir 13 milhões de seguidores. Você mesma administra as suas redes sociais?
Quando é um vídeo mais elaborado, eu não sei fazer, uma equipe faz pra mim. Publicidade também é com eles. Mas quando é carrossel de fotos, postagens normais, eu mesma faço e legendo. É uma baita responsabilidade ter tanta gente me acompanhando ali também! São pessoas que esperam alguma coisa de mim. Acho que a partir de agora eu vou ter mais tempo de me dedicar a isso também, gosto de fazer. Ultimamente, tenho falado menos nos stories com eles. Mas é um espaço bom, em que a gente pode passar muito conteúdo importante. E 13 milhões é população de país, um número assustador. A adesão cresce muito rápido, diariamente. Eu sinto essa intimidade do público comigo nas redes. Dão palpites, falam do meu cabelo, da minha roupa. Em geral, as pessoas gostam de mudar elas mesmas, mas querem que as outras permaneçam iguais. Uma vez eu brinquei com uma moça que me pediu pra não cortar o cabelo: “Você não gosta de cortar o seu?”. E ela: “Eu adoro!”. E eu: “Pois é, eu também!” (risos). Mas é muito carinho e muita fidelidade a mim.
E os haters, incomodam?
Quando alguém fala alguma coisa contra mim, os fãs não aceitam. É um exército da salvação em minha defesa (risos). Eu não gosto de alimentar discussões nas redes sociais. Acho que a pessoa tem o direito de dar a opinião dela. Desde que não seja ofensiva não só a mim, mas a quem também frequenta aquele ambiente, eu não sou de ficar tirando comentário. Deixo lá, mas os fãs marcam pressão. Aí eu posso ficar tranquilinha na minha (risos).