Diretora de 'Golpista do Tinder' critica contratos de Simon Leviev
'Que tipo de mensagem isso passa?', disse Felicity Morris ao falar da falta de empatia com as mulheres retratadas na obra da Netflix
Uma história real difícil de acreditar, um golpe envolvendo vítimas em diversas partes do mundo e um golpista que parece vindo direto de uma obra de ficção. Lançado no último dia 2 de fevereiro, o documentário “O golpista do Tinder”, da diretora Felicity Morris, vem repercutindo em todo mundo e gerando inúmeros debates.
O filme colhe os depoimentos de Cecilie Fjellhøy, Pernilla Sjöholm e Ayleen Charlotte, três mulheres que conheceram Simon Leviev no Tinder e acabaram extorquidas em centenas de milhares de dólares.
Após duas semanas de exibição na Netflix, o documentário entrou no top 10 em 94 países e alcançou 64,7 milhões de horas de visualização. No Brasil, passados quase 20 dias da estreia, segue dentre os 10 filmes mais assistidos do serviço de streaming.
Uma das criadoras da série documental “Don't f**k with cats: Uma caçada online”, Felicity Morris teve acesso ao caso após ler a reportagem do jornal norueguês “VG”, que viralizou em todo mundo, em 2019. Os detalhes sobre a investigação jornalística também estão presentes no documentário.
"Não fosse a coragem da Cecilie em decidir contar essa história na imprensa, nunca teria descoberto este caso", conta Morris.
Diante da repercussão de “O golpista do Tinder”, Simon Leviev, nome falso usado pelo israelense Shimon Hayut, de 31 anos, passou a ser alvo de muita curiosidade. Como é visto no próprio filme, o pretenso golpista chegou a ser preso, mas já está solto. No momento, tem surfado na onda do documentário.
Apesar de ter sido banido do Tinder, Hayut segue vivendo uma rotina de luxo e recentemente assinou com uma agente em Los Angeles para desenvolver um reality show de namoro. Ele também pretende lançar um podcast em que trata do que fazer e do que não fazer em relacionamentos amorosos.
"Nunca foi nossa intenção dar a Simon uma plataforma para contar mais mentiras. Ele foi preso por crimes que cometeu em Israel, mas nunca foi indiciado por nenhum dos fatos apontados pelas garotas. No momento, parece que Simon, mais uma vez, é uma pessoa com fundos ilimitados, o que é muito difícil de lidar para as mulheres do filmes", lamenta Morris.
"Agora, ele tem uma agente o representando em Los Angeles. Que tipo de mensagem isso passa para as mulheres, para as vítimas? Um homem condenado, que já esteve preso duas vezes, está sendo representado por uma agente mulher em LA. Que mensagem isso passa para as pessoas?", disse.
A agente em questão é Gina Rodriguez, que também atua como produtora em Hollywood, e que publicou em seu Instagram: “Assisti ao filme ‘O golpista do Tinder’, da Netflix, e achei incompleto porque nunca ouvimos o outro lado.
A narrativa parece muito tendenciosa e eu não consegui formar uma opinião. Ao invés disso, tive mais dúvidas e sou uma mulher. É por isso que entrei em contato com Simon. Sempre há dois lados. Goste ou odeie, quero ouvir o lado dele.”
Apoio às vítimas
Felicity também lamenta o que ela chama de “repercussão misógina” ao documentário, com muitas pessoas criticando as mulheres e usando expressões como “golpe do baú”.
"O que tentamos mostrar foi que aquelas mulheres não receberam nada do Simon, não entraram naquela relação pensando que ganhariam alguma coisa. Cecilie, por exemplo, passou a maior parte de seu tempo com ele em casa, assistindo TV, comendo pizza. Com exceção do primeiro encontro, ela nunca foi levada para restaurantes caros ou coisa do tipo", relata a documentarista.
"Uma coisa em que Simon era muito bom era em se passar por este namorado perfeito, este homem comprometido, gentil e que sabia tudo sobre a vida dessas mulheres", comentou.
A diretora critica o fato de muitas pessoas preferirem reagir falando coisas como “eu não cairia nesse golpe”, “como podem ser tão estúpidas?”, e que o melhor a se fazer seria ter empatia pelas vítimas.
"Temos que parar de culpar as vítimas. No fim das contas, tudo o que essas mulheres fizeram foi confiar em um homem altamente manipulador e bom no que faz", diz. "A ideia de que elas devem ser culpadas por confiar é uma retórica que realmente precisa acabar".
Apesar dos ataques e das piadas envolvendo as mulheres retratadas no longa, Morris destaca que também ocorreu uma grande onda de apoio, com pessoas de todo mundo se mostrando solidárias ao ocorrido.
Sem novos projetos de documentários em vista, Felicity Morris tem se dedicado a explorar ainda mais o universo do “golpista do Tinder”.
"Tenho feito um podcast chamado “The making of a swindler”, com a Bernadette Higgins, que é produtora do documentário. Por ser um longa documental e não uma série, deixamos muita coisa de fora que fomos descobrindo com o tempo. Mais vítimas, não apenas mulheres. Histórias sobre a infância de Simon, outras acusações que foram feitas contra ele", detalha a realizadora.
Segundo a Variety, a Netflix possui planos para transformar a história retratada em “O golpista do Tinder” em um filme de ficção. A diretora Felicity Morris afirmou não estar envolvida no projeto ou saber maiores informações sobre o mesmo.
Shimon Hayut segue negando todas as acusações. Em entrevista ao Canal 12 de Israel, ele afirmou: “Nunca tirei um dólar delas, essas mulheres se divertiam na minha empresa, viajavam e viam o mundo com meu dinheiro.”