Você já imaginou um futuro sem livros? Para os fãs da leitura essa hipótese nem deveria existir, mas o autor Fausto Panicacci abordou essa questão em “O silêncio dos livros”, seu mais novo livro. Em entrevista ao iG Gente , o escritor contou como foi o processo de criação e em como essa discussão se faz necessária nos dias de hoje.
Leia também: Dez livros que vão te ajudar a entender a sociedade em 2019
“O silêncio dos livros” foi escrito entre 2012 e 2017, e mesmo sendo lançado agora em 2019, Fausto Panicacci afirma que o livro não retrata o momento atual do País. “Não era um retrato de um momento em particular e nem sobre a condição política. Eu escrevi bem antes dessa época”, declara.
Quando questionado se a “extinção” dos livros poderia chegar até os dias de hoje, Fausto acredita que existe essa chance. “Sempre existe essa possibilidade, quando as pessoas têm ideais totalitários, vão tentar controlar não só os livros, mas tudo que está em volta”, conta.
O autor também conta que a palavra “silêncio”, no título de seu livro, não é apenas de silenciar a literatura. “Tem um sentido duplo. Claro quando se tem essa frase na capa e falando da proibição deles, vem à ideia de silenciá-los. Mas além do sentido de silenciar a literatura, tem algo mais poético que é o silêncio para se concentrar e deixar de lado o ruído desse nosso mundo”, explica.
Brasil e Portugal
“O silêncio dos livros” se passa no Brasil e em Portugal, e a ideia de trazer esses dois cenários para o livro surgiu a partir da vivência do próprio escritor. “Sou um brasileiro que estava vivendo em Portugal, como a história me surgiu nesse período, fez com que acontecesse lá”, revela.
Santiago, um dos personagens, passa pelo mesmo roteiro que Fausto e durante a história tenta entender a língua portuguesa. “Em uma das histórias eu faço romantização da formação do Brasil para tentar entender a língua portuguesa. Também faço uma ligação dos estados que falam português com a carta de Pero Vaz de Caminha”, declara.
Leia também: “Game of Thrones” fica menos sofisticada ao perder a referência dos livros
Construção do livro
“O silêncio dos livros” é narrado por Alice, uma criança portuguesa de 10 anos e mesmo tendo esse diferencial, Fausto Panicacci garante que o título “não é um infanto-juvenil”. Quando questionado sobre o porquê dessa escolha, ele explica que o intuito era evidenciar o “medo” da extinção dos livros: “Eu quis observar essa realidade para aumentar esse estranhamento”.
O autor revela que durante o processo de montagem da personagem, ele precisou voltar na sua própria infância: “Voltei na minha infância para tentar imaginar de que forma ela via o mundo”.
Você viu?
Ele também explica como foi juntar o universo infantil com a literatura sem mudar o gênero de sua obra. “O curioso é mesclar a linguagem mais ligada à literatura com a sensibilidade de uma criança, sem transformar o livro em uma obra infantil, mas mostrar como a menina está chocada com o mundo que está sendo apresentado a ela”, esclarece.
Quando questionado sobre a interligação dos personagens durante a história, Fausto explica como Alice, Santiago e Elizabeth ficam próximos. “Alice busca refúgio nos livros e ao descobrir que eles podem ser extintos, ela encontra Santiago, que carrega um caderno de anotações e na capa está escrito o nome ‘Hilário’ e ela fica curiosa. Em seguida, eles conhecem Elizabeth, ambos em busca de não deixarem os livros e a fotografia serem extintas de Portugal”, revela Fausto.
Já no Brasil, Hilário, um jovem estudante de arquitetura e órfão de pai e mãe, tem sua vida arruinada após ser acusado de um crime que não cometeu. “Ele cresce no orfanato e conhece um professor universitário, além de ter uma grande inteligência. Ao ser preso, Hilário fica no isolamento e vira uma espécie de estudo. A sua liberdade depende da identificação do gene e durante esse tempo, ele só pode ficar na biblioteca do presídio”, explica Fausto Panicacci.
O autor
Fausto é doutor em Ciências Jurídicas, formado em Direito, estudou fotografia, História do Cinema e História da Arte. Ele explica que essa parte jurídica o ajudou no momento que tem uma audiência no livro. “A parte jurídica inspirou uma parte da história, mas ‘O silêncio dos livros’ não é jurídico e nem é um drama de tribunais. Ele só tem uma parte no tribunal”, conta.
Já sobre a história, Panicacci explica que começou a escrever durante o tempo que passou em Portugal e que a ideia só saiu do papel porque sua esposa o incentivou. “A história me ocorreu quando eu estava em Portugal, quem me encorajou a colocar no papel foi minha esposa e grande incentivadora”, confessa.
“Minha ideia era contar uma boa história e foi isso que eu tentei produzir. Eu escrevi parte em um caderno e fui colocando impressões dos lugares até que tive uma ideia de como ia ser e comecei a estruturar. O final mudou várias vezes, todo momento eu deixava minha criatividade falar mais alto”, explica.
Leia também: Não tem tempo para ler um livro? Audiolivros podem ser a solução
Expectativa para o livro
Fausto também conta que sua relação com os livros está presente nas páginas de seu novo título: “A minha declaração à literatura é muito pessoal. Como o texto tem muitas histórias, logo existem momentos inspirados na minha relação primária com os livros”.
Panicacci também espera que seu novo título ajude as pessoas a se colocarem no lugar do outro: “Espero refletir a vida atual e a importância dos livros. ‘O silêncio dos livros’ mostra como é importante nos colocar no lugar do outro para enxergar o mundo por múltiplas formas e entender que a nossa maneira de ver o mundo não é única”.
Quando questionado sobre como ele acha que o público irá receber seu livro, Fausto confessa que além de querer uma boa recepção, espera provocar uma reflexão. “A ideia é provocar uma reflexão. O romance não é um campo de gerar respostas, mas sim de perguntas. De causar impressões. Prefiro que meu romance seja sentido. Espero que ele leve o papel do livro, das nossas vidas, da tecnologia e de como nossas relações humanas estão se transformando”, conta.
Sobre o futuro do seu livro , Fausto diz que não tem planos para uma sequência: “Ele foi pensado para ser único. Alguns amigos próximos sugeriram que eu escrevesse uma continuação, algum outro volume que retomasse um ponto de algum personagem. Mas estou escrevendo outros dois romances que não tem ligação com esse”.