O cinema britânico tem a rara habilidade de conjugar drama e humor em uma mesma nota, a um só tempo e “Daphne”, primeiro longa do curta-metragista Peter Mackie Burns , é um exemplar eloquente dessa realidade.
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Emily Beecham (“Ave, César!”) vive a Daphne do título. Uma mulher de 31 anos que vive sua vida no piloto automático. Ela se sente jovem demais para determinadas demandas sociais e um tanto madura para outras. Ela se divide entre o emprego no restaurante, em que seu chefe parece gostar dela um pouco além do que preconizam as relações profissionais, e a fuga constante da mãe com câncer.
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Entre um senso de humor peculiar e aguçado e rompantes de crueldade, Daphne vai se revelando uma mulher infeliz. Do tipo de resistir ao jogo de sedução de uma pessoa realmente interessada nela e se entregar a um sexo casual e desprovido de qualquer intimidade ou consideração.
Burns acompanha sua protagonista o tempo todo. Ora com a câmera em mãos, rígida e inclemente, ora distante, fria, mas compadecida. A maneira como Emily Beecham aborda a angústia de sua personagem, um tipo incrivelmente carismático, mas surpreendentemente antipático, é um alento. Daphne é daquelas personagens que são um sonho para bons atores e Beecham não desperdiça sua chance.
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Quando vivencia uma experiência traumática, um assalto com lesão corporal, Daphne é instigada a sair de sua zona de conforto. Encarar seus anseios e suas frustrações e se colocar para o mundo como jamais o fizera até então. Nesse sentido, o filme se resolve como uma pequena crônica de uma mulher que se força, ainda que de maneira pouco consciente, a sair de um enclausurado estado de conformismo.