"Olhando para as Estrelas", o filme de estreia do diretor Alexandre Peralta , traz uma proposta interessante: acompanhar a vida de duas alunas da Associação Fernanda Bianchini - a primeira e única companhia profissional de ballet clássico para cegos no mundo.
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Por não se tratar de um filme institucional, em que o foco é pura e simplesmente o trabalho da associação, " Olhando para as Estrelas " emociona com o mais simples dos elementos: o dia-a-dia. Ao focar nas histórias de Geyza , a primeira bailaria da companhia, e Thalia , uma de suas alunas adolescentes, as dificuldades do dia-a-dia de cada uma vão sendo expostas, intercaladas com as aulas de ballet e a forma que Fernanda Bianchini encontrou para ensinar a arte, apesar das dificuldades.
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De acordo com o diretor, essa escolha acabou afetando o produto final de maneira significativa: como optou por focar em duas personagens, muitas histórias boas se perderam - contudo, isso não torna o longa menos emocionante. Feito para quebrar paradigmas e derrubar pré-conceitos, o filme também mostra a forma como a arte impacta a vida de quem é tocado pelo trabalho da associação.
"Não gosto de cair na história da superação, mas o trabalho feito afeta muito a vida delas. É um trabalho de pessoas que estão fazendo o que gostam, que muda a vida de quem participa. Queria demonstrar o quanto isso é importante na vida das bailarinas , e o poder que a arte tem de moldar as nossas vidas", explica Peralta.
A arte
No longa, é evidente como a arte impacta a vida das personagens, transformando-as para melhor. Impacta, também, quem assiste. Apesar de não ser um filme que cai no clichê da história de superação das personagens - que, obviamente, existe, por se tratar de um filme sobre pessoas reais -, a forma como as jovens lidam com a deficiência que adquiriram ainda na infância é inspiradora.
A escolha, para o diretor, foi algo natural. Depois de conhecer a associação, ele ficou mais de duas semanas estudando as alunas, ouvindo histórias, documentando as aulas. Assim, ouviu falar da história da primeira bailarina da companhia, que já está há mais de 20 anos no projeto. Através dela, chegou na adolescente, que é uma de suas alunas. Além disso, realizou um trabalho longo, em que se aproximou das jovens e conquistou a confiança delas. O resultado disso são momentos marcantes da vida de cada uma delas, como a troca de prótese ocular da adolescente e o casamento da mais velha.
"Foi uma transformação muito grande, como eu pensei. Comecei com certos preconceitos, ideias determinadas sobre pessoas com deficiência visual, como todo mundo tem. O processo foi o contrário, aprendi que não existe tanta diferença assim, e isso foi o foco do filme. Eu tinha bastante curiosidade. Não sobre como é feito, mas sim, de que maneira é feito. Sempre vale perguntar, o que a gente espera, qual é a duvida", afirma o diretor.
Um exemplo claro de um desses momentos é após o casamento de Geyza. Sozinha, a jovem vai se virando para cuidar do marido e da casa - ao mesmo tempo em que frequenta o ballet e cuida do filho e de si mesma, já que engravidou ainda na lua de mel. E acompanhar esses arcos de história por cerca de dois anos e meio foi, com certeza, um dos maiores desafios da carreira do jovem cineasta.
A dança
Sendo o ballet uma forma de expressão artística clássica, cuja maior referência é a visual, Fernanda Bianchini enfrentou muitos preconceitos e pré-conceitos de suas antigas professoras quando decidiu começar a dar aulas da dança para jovens cegas de uma instituição de ensino, que diziam que não seria possível ensinar os movimentos, o uso da sapatilha de ponta e as coreografias.
Conforme é retratado no filme, a professora desenvolveu suas próprias técnicas para gerar referências e ensinar os passos para suas alunas. Além disso, encontrou outros professores, que também não têm deficiência visual, e que acreditam no seu projeto e na capacidade das alunas.
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"A experiência que a gente teve com esse filme é a de que as pessoas se emocionam muito. Não é um filme dramático, é um filme em que as pessoas riem em alguns momentos, há um balanço. É um tema que é delicado, e a gente optou por fazer um trabalho de documentar, e com as escolhas artísticas de como utilizar o som, o visual, a fotografia, tudo foi bem pensado. Espero que as pessoas se emocionem, se sintam tocadas pela arte", finaliza o diretor de "Olhando para as Estrelas".