Um ano depois de lançar o álbum "De Volta Pro Amanhã", o Sorriso Maroto segue colhendo os frutos de mais um trabalho bem sucedido. Prestes a embarcar para Nova York, onde será atração do Brazilian Day, o grupo revela ter sentido alívio pelo disco ter sido bem aceito pelos fãs. "A gente sempre tem uma certa insegurança sobre o que as pessoas esperam", confessou o vocalista Bruno Cardoso em entrevista ao iG na sede da Deezer , em São Paulo.

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A banda Sorriso Maroto lançou o álbum
Divulgação
A banda Sorriso Maroto lançou o álbum "De Volta Pro Amanhã" em 2016

"Nesse momento, um ano depois desse disco, já muda isso, a gente tem um feedback mais firme, as pessoas começam a pedir músicas. Aquelas que pra gente eram dúvidas, já são certezas, a gente sabe que a galera quer ouvir", continuou o cantor do Sorriso Maroto.

Completando 20 anos de carreira, a banda coleciona sucessos em sua trajetória e já mudou de estilo algumas vezes. De um som mais romântico, o grupo emplacou hits mais "saidinhos", como  Assim Você Mata O Papai , de 2012. "O Sorriso é uma banda mutante dentro da concepção musical", explicou Bruno, lembrando que a mudança de característica foi exaustivamente debatida entre os músicos.

Na entrevista abaixo, o Sorriso Maroto fala sobre sua trajetória, o álbum "De Volta Pro Amanhã", o domínio do sertanejo no Brasil e o futuro da música.

Leia:

iG: Agora, um ano depois do lançamento, como vocês veem o disco "De Volta Pro Amanhã"?
Bruno Cardoso:  No primeiro dia do disco na rua, o disco físico, a gente sempre ficava na sensação de 'e aí, como as pessoas vão reagir a esse trabalho?'. Mesmo que as músicas comecem a tocar no rádio e nas playlists, a gente sempre tem uma certa insegurança sobre o que as pessoas esperam, qual é a visão das pessoas quanto ao trabalho. Nesse momento, um ano depois desse disco, já muda isso, a gente tem um feedback mais firme, as pessoas começam a pedir músicas. Aquelas que pra gente eram dúvidas, já são certezas, a gente sabe que a galera quer ouvir. Quando a gente começa a divulgar, as pessoas querem ouvir a do rádio, aí em um determinado momento elas querem ouvir as outras do disco. É o que a gente está vivendo agora. Isso mostra como o projeto cresceu, como as pessoas absorveram bem o projeto. Estamos vivendo uma fase bem legal, fazendo shows importantes nas capitais.

iG: Quando vocês lançam um projeto novo, o sucesso já é esperado?
Bruno Cardoso:  O sucesso nunca é esperado. Nossa reação é até pessimista. Por mais que a gente esteja muito confiante, o mercado é muito dinâmico e as coisas acontecem de uma forma muito meteórica, então a gente sempre se pergunta se está no caminho certo. O pessimismo vem dessa desconfiança de achar que estamos na contramão do que está acontecendo. Chega uma hora que a gente se pergunta: 'e aí, será que as pessoas vão entender? Será que vai dar certo?'. Se der errado, vamos acreditar que estávamos fazendo o certo. É um risco constante que a gente vive e é muito gostoso quando acontece o contrário. É uma carga de responsabilidade, um misto de dúvidas e riscos. A gente entra com tudo no jogo e isso só se resolve mais ou menos um ano depois, quando as músicas começam a tocar, e a gente pensa 'puxa, funcionou'.

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O Sorriso Maroto vai levar o show de
Divulgação/Vitor Branco
O Sorriso Maroto vai levar o show de "De Volta Pro Amanhã" para Nova York em setembro

iG: Essa insegurança já impediu vocês de fazer alguma coisa?
Bruno Cardoso:  Já adiamos muita coisa. O Sorriso é uma banda mutante dentro da concepção musical. No começo dos anos 2000, a gente tinha um lado romântico muito forte. As pessoas olhavam o Sorriso Maroto e viam um repertório bastante romântico dentro do show e dos discos. Já no finalzinho dos anos 2000, o Sorriso veio sinalizando um novo comportamento, com músicas mais animadas e mais balançadas. Isso já era pra ter acontecido em 2006. A gente ficou desde lá nessa discussão. Lembro que a gente colocou o título do disco de "É Diferente", que a música principal era um samba, mais balançada e suingada, e a gente nem trabalhou essa música. A música do disco foi Futuro Prometido , que é uma música mega romântica. Aí a gente já adiou essa vontade. A gente só conseguiu fazer uma virada de chave no final de 2009, no disco "Sinais", com a música Pra Mim Não É . A gente veio adiando por três anos uma sensação que vinha desde 2006, de trazer um Sorriso Maroto mais maroto. E aí vieram outras músicas com essa característica. Mas isso foram coisas que adiamos e muito. Essa discussão levou um tempo de amadurecimento muito grande. A pergunta era essa, por que mexer se as pessoas gostam do Sorriso romântico? E acabamos provando para nós mesmos que as pessoas também gostam do Sorriso Maroto mais maroto.

iG: Mas essa mudança não foi só da banda, né?
Bruno Cardoso: Não. Acho que o que deu pra gente a segurança de fazer a virada de chave foi que o comportamento geral mudou. As pessoas estão mais agitadas, mais baladeiras, estão curtindo mais a noite. Elas estão mais abertas. Hoje a bebida virou um apoio pra tudo que você faz e a música estimula o consumo da bebida. As festas que a gente participava na época eram motivadas por uma sensação musical mais agitada. Hoje, a bebida está atrelada às músicas mega românticas, na sofrência mais drástica. O cara precisa estar quase no limite. Na época em que a gente estava com Não Tem Perdão , a última frase dizia "caso de traição não tem perdão", e o refrão termina com "não serei o mesmo sem o teu amor". Esse tipo de frase hoje, as pessoas falam que é sofrência, está na moda. Na nossa época era dor de cotovelo, mela-cueca. Tinha um monte de expressões que vinham atrelado a esse tipo de música. Agora as pessoas estão curtindo a sofrência como se fosse uma novidade, mas isso já existia, só trocou o nome. O Sorriso Maroto já é um veterano da sofrência.

iG: Nos últimos anos, muitas pessoas que não eram tradicionalmente fãs de pagode e samba têm cultuado bandas como Molejo e Raça Negra. O que vocês acham disso?
Bruno Cardoso:  Maravilhoso, acho tudo ótimo. São bandas da nossa referência. Muito legal poder conviver e viver com eles. A gente está junto com os caras que a gente viu fazendo sucesso no começo da nossa carreira. Fora que hoje você tem um público que talvez não seja oriundo do samba acompanhando esse processo. É legal eles observarem o trabalho dessas bandas e ouvir outras bandas. O público do pagode não é de uma banda, é de todo mundo.

iG: Ainda existe preconceito contra o pagode?
Bruno Cardoso:  Hoje eu vejo a música completamente diferente. Quando a gente surgiu, em 1997, ainda tinha um certo preconceito das pessoas. Hoje, a música já está feita de uma forma completamente diferente. A informação passou a chegar de uma forma mais objetiva a quem realmente curte aquilo.
Sérgio Jr.:  As pessoas mudaram a forma de ver as coisas. A década de 1990 ajudou muito, desmistificou algumas sensações erradas que as pessoas tinham. O povo de uma maneira geral foi amadurecendo e vejo isso de uma forma muito positiva, a música está muito mais democrática no coração das pessoas. A gente faz música porque a gente ama. Mas quem tinha mais preconceito, eu vejo isso acabando. Com o funk também.
Bruno Cardoso:  A música popular sempre foi um telhado de vidro. O funk sofreu seus preconceitos, o samba a mesma coisa, o sertanejo, o pagode da Bahia, o axé. Tudo que tem uma grande exposição acaba virando alvo de questionamentos. Entra numa discussão sem fim. A gente está super alinhado com isso e enxerga que hoje a música está realmente mais democrática. As pessoas estão aceitando melhor as tribos, as opções que temos. Não temos como fechar os olhos ao funk, ele é nosso, é brasileiro, ele tem misto de samba, sons africanos, está fundido com um monte de outros ritmos. O samba, o pagode baiano, o sertanejo, é tudo nosso. Isso é motivo de orgulho, a gente produz música, a gente tem um produto cultural muito forte em cada região do País.

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Em 2017, o Sorriso Maroto comemora 20 anos de carreira
Divulgação/Marcos Hermes
Em 2017, o Sorriso Maroto comemora 20 anos de carreira

iG: O pagode foi muito forte nos anos 1990, mas perdeu força. Por que isso aconteceu?
Bruno Cardoso:  É cíclico. Tudo que é demais, chega uma hora que satura. É necessário. Não é 'ah, mas os artistas de antigamente...'. Chega uma hora que enche o saco mesmo. Já deu. É a mesma coisa que você ficar contando uma piada o tempo todo. Beleza, acho bacana sua piada, mas quero ouvir outra coisa, um outro cara contando de outro jeito, de um outro tema. É normal, é sadio. A gente teve o momento do samba na década 90, como o axé teve o momento dele. O funk teve momentos de estrondo monstruosos, o pessoal do Bonde do Tigrão viajou o mundo inteiro fazendo funk. Foi o momento e assim vai. Agora o momento é da música latina. Despacito é a Macarena dos anos 2000. Daqui a pouco vai passar e vai vir outra coisa. É até importante pra gente observar como a música é dinâmica, ver que a música é feita por nós e mais um milhão de pessoas fazendo a mesma coisa.

iG: Hoje, quem domina a música é o sertanejo, e eles estão gerando muito mais dinheiro que o pagode no auge. Como vocês veem isso?
Bruno Cardoso:  A música está mais profissional. Essa questão da digitalização trouxe pra gente uma coisa muito boa que é você mesmo ser seu próprio empresário, seu próprio produtor. Hoje você pode montar seu canal, sua playlist, comunicar sua música por você mesmo. Isso é muito legal, mostra que o artista de hoje está muito mais empreendedor do que o artista de 20 anos atrás. Ele tem uma visão de negócio completamente diferente do artista de antigamente. A tecnologia também ajuda, trouxe uma dinâmica completamente diferente. Na época em que a gente começou, a gente ainda vivia resquícios de uma fase em que a gravadora dava toda a estrutura. Hoje em dia, a gente tem que se mexer, tem que estar aqui com o celular na mão. É uma mudança de comportamento que traz resultado. Colocando pro lado do sertanejo, eles conseguiram fazer algo dentro de um mercado agroeconômico que é muito rentável. Musicalmente falando, eles são milionários porque os eventos trazem muitos recursos. São festivais que têm toda uma estrutura que já gera uma condição de fazer grandes investimentos. Você pega uma música que tem um potencial muito grande de comunicação, um País praticamente segurado pela agroeconomia e boas cabeças pra gerir tudo isso.

iG: Quando vocês começaram, o rádio era o meio mais importante, mas agora o streaming vem ganhando muito espaço. O que é mais importante hoje?
Bruno Cardoso:  A gente ainda está nessa discussão: 'e aí, qual é a melhor comunicação, rádio ou digital?'. Ainda está meio confuso. Pro samba, ainda é 50/50. O Sorriso Maroto fez uma ação com a Deezer e lançou o "15 Anos" com exclusividade. Antes, a gente experimentou fazer isso com o iTunes. Porém, é uma conta gringa, você tem que ter cartão internacional, fazer download, comprar música, é um sistema completamente diferente. A gente sempre foi devagar nesses números. A gente ficava se perguntando porque não estava indo. Aí veio essa parceria e a gente ficou em primeiro lugar. O nosso público já estava no digital, porém o sistema que a gente usava ainda não estava bem aplicado pra eles. Eles não sabiam o que era iTunes, mas sabiam o que era Deezer. Essas experiências continuam ainda. A gente fica analisando e tentando encontrar formas de comunicar nossa música digitalmente. O rádio ainda é importante, continua presente. É um outro canal. Eles precisam ouvir o rádio e saber que aquela música também está no streaming.
Sérgio Jr.:  A gente não sabe quem puxa quem. A nossa sensação é que o rádio conduz as pessoas ao digital, mas a gente teve uma surpresa enorme quando lançou esse projeto "De Volta para o Amanhã" e colocou a música antes na Deezer. No dia em que a música foi lançada no rádio, a gente teve um show à noite e todo mundo estava cantando no show. Isso não era efeito do rádio, era do digital. O que mais atrapalha o digital hoje em dia é que nosso País é muito grande, muito vasto, e o perfil econômico das pessoas é diferente. Quem tem o perfil gratuito vai pulando faixa, ouve de três em três, aí entra um anúncio... Isso complica. A falta de conhecimento, de manuseio do digital, também é um mistério. O cara prefere ir na loja, comprar um CD e botar pra tocar. Nessa mudança de hábito, o rádio ainda tem muita força. Quando esse processo amadurecer mais um pouco, talvez o rádio já fique em segundo plano.

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