Com um orçamento bem mais baixo que edições anteriores – durante coletiva a curadora Josélia Aguiar citou que tiveram R$ 1 milhão a menos que ano passado – a 15ª edição da Flip certamente se destacou por privilegiar a diversidade em sua programação composta majoritariamente por mulheres e com um terço de negros, mas algumas mesas e debates deixaram a desejar, extrapolando o assunto que de fato levou milhares de pessoas à Paraty, ou seja, a literatura . Listamos cinco momentos da Flip que foram os destaques desse ano.
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Revivendo Lima Barreto
O autor homenageado desse ano na Flip foi Lima Barreto e boa parte da programação foi pensada de forma a contemplar boa parte de sua obra e vida. Concebida a partir da biografia recém-lançada da pesquisadora Lilia Schwarcz, “Lima Barreto – Um Triste Visionário”, a abertura concedeu ao ator Lázaro Ramos a incumbência de “reviver” trechos dos escritos do autor entrelaçados com fragmentos de sua história pessoal que foram recuperados pela historiadora.
Barbárie da guerra
Na mesa “Em Nome da Mãe”, composta pela brasileira Noemi Jaffe e pela ruandesa Scholastique Mukasonga – que foi a segunda mais vendida dessa edição, atrás apenas de Lázaro Ramos – abordou a memória e os horrores que a guerra pode representar para uma pessoa. Sobrevivente do genocídio que tirou a vida de suas irmãs e sua mãe, Scholastique relata em seus livros sua visão sobre a barbárie pela qual passou em seu país natal. Já Noemi explora a vivência de sua mãe como judia durante a Segunda Guerra Mundial: “eu como escritora preciso lembrar o que ela quer esquecer”, comentou.
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Multifacetada
Viúva de José Saramago e atual presidente do instituto que leva o nome do falecido, Pilar del Rio foi uma das atrações mais celebradas desse ano na Flip. Sua mesa “Na Contracorrente” originalmente contava com a participação da arqueóloga Niéde Guidon, que não pôde participar por questões de saúde. Apesar do desfalque, a espanhola que é jornalista, ativista e tradutora fez valer sua participação. O machismo que resulta em uma “ditadura dos homens” e os diretos humanos foram os pontos centrais de sua fala na Igreja da Matriz. “As injustiças multiplicam-se no mundo, as desigualdades agravam-se, a ignorância cresce, a miséria alastra”, disse a escritora.
Roubando a cena
Foi do meio do público que um dos momentos mais marcantes da Flip brotou: durante debate da Flipinha, Diva Guimarães, professora aposentada de 77 anos tomou a palavra para si e fez um emocionante desabafo sobre racismo. Arrancando lágrimas e aplausos do público, Diva falou sentir na pele o fardo de sua raça em uma sociedade que a discrimina. O vídeo com o depoimento da professora que apresenta a educação como cura para a ignorância do racismo já foi assistido mais de 10 milhões de vezes na página oficial do evento no Facebook. “Obrigada pela coragem de compartilhar sua história com a gente”, disse Lázaro Ramos, convidado da mesa, no final da fala de Diva.
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Racismo na literatura
Na edição de 2016 da feira literária Conceição Evaristo fazia parte da programação paralela e levantou a questão da ausência de negros nas mesas centrais da Flip. Esse ano a autora foi uma das convidadas de maior destaque e sua participação foi amplamente aplaudida. “Esse momento significa a comprovação da força coletiva. Não estou aqui sozinha. E não podemos deixar de afirmar que não foi concessão. Esse lugar é nosso por direito”, disse a escritora. Falando sobretudo de racismo, Conceição Evaristo ressaltou episódios em que o preconceito é latente e comparou Clarice Lispector com Carolina Maria de Jesus.