Em sua 14ª edição a Flip voltará a ter uma cara mais tradicional, levemente diferente das edições anteriores. A jornalista Joselia Aguiar assumiu a frente da curadoria da feira em agosto de 2016 e nesse curto período procurou trazer mais diversidade para esse ano e, por isso, escolheu homenagear o autor Lima Barreto. A programação da Flip 2017 chamou a atenção pelo grande número de mulheres e negros entre os convidados, mas, afinal, quais são as expectativas dessa edição?

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Com nomes ainda desconhecidos no Brasil, como Marlon James, Flip 2017 investe na diversidade na programação
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Com nomes ainda desconhecidos no Brasil, como Marlon James, Flip 2017 investe na diversidade na programação


Menor?

A primeira vista a Flip 2017 parece menor, mas uma análise mais completa mostra justamente o inverso: olhando para toda a história do evento, essa será a terceira maior edição já realizada em número de convidados, perdendo apenas para as duas edições anteriores, que foram assinadas pela curadoria de Paulo Werneck. Os 46 nomes da programação desse ano serão distribuídos em 18 mesas distintas – e nesse ponto, de fato, houve uma queda, posto que nos últimos anos foram realizadas mais de 20 mesas.

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Se há mais convidados e menos painéis disponíveis, o que isso significa? Na programação idealizada por Joselia Aguiar todas as mesas terão pelo menos dois integrantes, ou seja, a ação suscita o debate entre os convidados. Edições anteriores eram comuns as mesas com somente um autor e que o tema era apenas o seu próprio trabalho – algo muito mais próximo de uma exposição centrada em quem estava falando. “A Flip é um lugar de debate, um lugar para as pessoas entenderem um ponto de vista que não conhecem”, ressalta Joselia.

Gráfico: relação entre o número de convidados da Flip em cada ano que foi realizado o evento
Verônica Maluf/iG São Paulo
Gráfico: relação entre o número de convidados da Flip em cada ano que foi realizado o evento

Além dessa reformulação no formato mais amplo, houve a introdução dos “frutos estranhos” na programação antes de seis das mesas que acontecem. O nome integrante faz com que surjam perguntas, mas a própria curadora explica: “a série ‘Fruto Estranho’ é um conjunto de apresentações, serão intervenções poéticas e performáticas”.  A experimentação elaborada por ela dialoga com a intenção primária dessa edição que, justamente, estreia essas relações entre as artes e a literatura.

“Qualidade implica diversidade”

A grande bandeira que a Flip levanta esse ano é a da representatividade. A maioria absoluta dos palestrantes são mulheres e 30% de todos os convidados são negros – mas isso não implica que esses sejam os assuntos que norteiam os debates. A curadora fez questão de ressaltar que em 2017 a festa literária é uma homenagem ao escritor Lima Barreto, não somente sobre o racismo. “Essa expectativa de que falar no Lima Barreto é falar em racismo aprisiona o autor dentro de um papel [...] Isso é um preconceito às avessas”, aponta.

Quem se acostumou com o modelo de outras edições que, em geral, buscavam nomes que por si só já brilhavam – como o autor inglês Neil Gaiman, atração de 2008, ou Irvine Welsh em 2016 – esse ano os autores pareciam bem mais modestos e a programação estava muito mais horizontal nesse sentido. Isso, contudo não se traduz em nenhum tipo de demérito, uma vez que possibilitou que novos olharem penetrassem a Flip.

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Com maioria de mulheres, como a ruandessa Scholastique Mukasonga, Flip 2017 apresenta autores pouco conhecidos
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Com maioria de mulheres, como a ruandessa Scholastique Mukasonga, Flip 2017 apresenta autores pouco conhecidos

Os destaques desse ano são o jamaicano Marlon James e o americano Paul Beatty – vale ressaltar que ambos são negros e vencedores do Man Booker Prize –, William Finnegan, ganhador do Pulitzer em 2016, Scholastique Mukasonga, aclamada por escrever sobre seu país de origem, Ruanda. Se, por um lado, esses convidados ainda não são conhecidos pelo público, por outro a Flip poderá abrir o caminho para que eles ganhem seu espaço com os brasileiros. “Muita gente conhecida já veio até mais de uma vez [...] por isso trazemos nomes fortes que mereciam ser conhecidos por aqui”, esclarece a curadora.

Caos político

Em 2016 as manchetes sobre a Flip traziam logo de cara o “Fora Temer” que foi puxado por diversos autores e artistas antes das mesas. A discussão política, por vezes, ofuscou o debate central sobre literatura e cultura e acabou prevalecendo em diversos momentos no ano passado. Como as comparações são inevitáveis e com o caos institucional ainda mais profundo que há um ano, já é de se esperar que essas cenas se repitam e possam novamente roubar o protagonismo do principal foco da festa. Falando dessa forma isso pode até soar como um problema, entretanto para Joselia Aguiar essa perspectiva é até enriquecedora. “As pessoas não percebem que falar de literatura é político por si só”, comenta. Em outro momento a curadora garantiu que não há qualquer recomendação ou restrição feita aos convidados da Flip 2017.

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