O novo filme de François Ozon dá sequência à jornada de experimentação do cineasta francês pelos gêneros cinematográficos, algo verificado em sua impressionante média recente – um filme por ano. “Frantz” se passa na Europa pós- primeira guerra mundial. As cicatrizes ainda estão vívidas e é neste contexto que flagramos Anna (a excepcional e mesmerizante Paula Beer). Enlutada pela morte de seu noivo Frantz, que morreu no front.

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Frantz é, desde já, um dos melhores filmes do ano
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Frantz é, desde já, um dos melhores filmes do ano

Um dia, Anna flagra um jovem levando flores ao túmulo de Frantz e fica intrigada com a melancolia dele. Desajeitadamente se aproximam e ela leva o francês Adrian (Pierre Niney) para a intimidade do seio familiar com os pais do noivo morto. Se a mãe recebe o jovem como um alento, uma chance de descobrir uma faceta do filho, o pai deixa transparecer certa resistência em confabular com “o inimigo”.

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A pintura "O Suicídio", de Édouard Manet que tem função central no filme

A ligação de Adrian com Frantz comove, instiga e mobiliza aquela família postiça despedaçada pela guerra. O filme é adaptado de peça escrita por Maurice Rostand e o material já havia servido de base para o longa “Não Matarás” (1931), de Ernst Lubitsch, mas Ozon é muito mais complexo, delicado e arrebatador na articulação dos conflitos. Sempre que o espectador se convence de que sabe para onde a história está indo, tudo se reconfigura. Um triunfo narrativo de rara beleza e solidez no cinema contemporâneo.

O longa flui pelo drama, pelo mistério e pela sensualidade com desenvoltura e propriedade. A fluidez dos gêneros em Ozon não é um capricho estilístico, mas um serviço narrativo, que afere ainda mais rigor estético.

A maneira como o luto é trabalhada nos personagens já daria um grande filme, mas este é também um filme sobre Anna, sobre sua tragédia pessoal, que escala sensivelmente enquanto com ela ficamos, e também sobre o poder redentor da arte – repare na crescente importância e reverberação dramática do quadro “O Suicídio”, de Édouard Manet. Esse pluralismo, essa transversalidade da obra de Ozon, filmada em um preto e branco esfuziante, que recebe a cor sempre com potente impacto dramático, garante ao cineasta não só posição de destaque no panteão dos grandes autores contemporâneos do cinema, como dá singularidade ao filme.

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A excelente Paula Beer, como Anna em Frantz

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“Frantz” é um registro ardil das contradições e demandas humanas por um cineasta no auge da forma. Um filme que enobrece o cinema atual com um sopro do passado.

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