Paradoxalmente, sexo, pornografia e o corpo são alguns dos maiores tabus da sociedade – mas, ao mesmo tempo em que despertam repulsa, são, também, fontes do desejo humano. Investigando diversas perspectivas a respeito dessa temática, o iG elaborou uma s érie de reportagens dentro da série Sexografia que explorou, dentre outros tópicos, a relação do sexo com a arte, literatura e cinema . Avançando nesse debate, o que acontece quando diretores ousam se apropriar da pornografia em seus trabalhos e transformá-la em elemento narrativo de suas obras? Alguns nomes, como Lars von Trier, testam o limite da moral e elevam o sexo em frente às câmeras para um novo nível de compreensão – e apreensão pelo público.
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Pornografia e cinema
Em uma sociedade extremamente sexualizada não é novidade falar de sexo, mas o que torna o debate tão pertinente é explorar ângulos que ainda não estão no radar das discussões. Um dos pilares mais latentes da cultura atual é a pornografia : colocando o sexo como fim em si a serviço do prazer do espectador, a indústria do pornô é uma das maiores e mais fortes de todo o mundo, afinal, sexo vende – e muito. O cinema ainda é tímido na tarefa de apropriar-se dessa ferramenta que é tão universal e, ao mesmo tempo, controversa. Contudo, alguns diretores já tentam digerir a pornografia e transformá-la em uma linguagem artística em frente às câmeras.
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O americano Tom Kalim é um dos nomes que se arriscam nesse contexto. Em “Swoon” (1992) a relação homossexual entre dois assassinos é o foco central da história, enquanto que em “ Pecados Inocentes ” (2007) é o incesto entre mãe e filho que ocupa a trama principal do filme. Sem o sexo ali, escancarado na cara do público, alguma coisa ficaria faltando nas obras de Kalim. Os personagens do segundo título citado, por exemplo, representam uma burguesia decadente, mergulhada nos excessos e a beira de um surto que pode vir a qualquer momento. A atmosfera morna esconde atrás de si a perturbação e a histeria de uma tragédia anunciada. Ocultar o sexo, nesse contexto, seria omitir uma importante parte desse mundo de uma incansável busca por um sentido.
Tom Kalim levanta a bandeira do “pornógrafo moral” e, como disse em recente passagem pelo Brasil a convite do MASP para falar sobre seus trabalhos, acredita no potencial subversivo da pornografia. O sexo nesse contexto pode ou não servir para o prazer, mas certamente não virá desacompanhado de outras questões que dão margem para reflexão. Em “Pecados Inocentes” Barbara Baekland (Julianne Moore) se relaciona com o filho por não aceitar sua homossexualidade – a interação entre eles está longe de ser saudável. A tensão é clara, mas o desfecho da história só culmina quando ela faz sexo com o filho, Tony (Eddie Redmayne), e poucos minutos depois é assassinada por ele.
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Outros diretores também colocam o sexo a seu serviço para construir suas narrativas: Pedro Almodóvar em “A Pele que Habito” (2011), por exemplo, mostra o sexo como trauma, o sexo perturbador que desencadeia atos doentios. Lars von Trier é o cineasta da atualidade que mais foi além ao tratar da questão: em “Ninfomaníaca Vol. 1” (2013) o sexo e a história se fundem e resultam em uma narrativa que dialoga fortemente com a pornografia por cenas explícitas carregadas de um erotismo inquietante. É difícil delimitar espaços, mas, no final, a questão que emerge é o que faz o sexo tornar-se pornográfico?