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O trio principal de "Despedida em Grande Estilo", já em cartaz nos cinemas, bateu um papo com o iG em Nova York

"Vocês podem fechar a matraca para a gente começar esta coletiva de imprensa?"

Quem fala, do alto de seus 83 anos, é Alan Arkin, Oscar de melhor ator coadjuvante em 2007 por “Pequena Miss Sunshine”, indicado ao prêmio da Academia de Hollywood outras três vezes, duas nos anos 1960, a mais recente por “Argo”, em 2012. Suas vítimas são, pela ordem, sir  Michael Caine , 84, dois Oscars no bolso, Morgan Freeman , 79, um Oscar, Ann-Margret, 75, indicada a duas estatuetas e o diretor Zach Braff , 42, conhecido pela série televisiva “Scrubs” e pelo delicado “Hora de voltar”, que o apresentou ao grande público. Todos estão reunidos em um salão de um luxuoso hotel nas imediações do Central Park para tratar, por mais irônico que pareça, da história de três operários da velha América encalacrados com sua aposentadoria e decididos a assaltar um banco afim de viverem dignamente os derradeiros anos de suas vidas. “Despedida em Grande Estilo” faz pensar, com graça e atuações nada preguiçosas de craques do cinema americano, sobre como a sociedade e o Estado tratam os aposentados.

"Quando fui convidado para dirigir estes quatro, mais o Christopher Lloyd (que faz uma ponta no filme), fiquei nervoso pacas", diz Braff, imediatamente interrompido por Ann-Margret, que retruca: "Ficou não. Fala sério". Por sua vez, atravessada por Caine: "Eu era o mais nervoso". Freeman não se contém: "Por causa do seu papel?".   Alan Arkin ataca novamente: "Gente, pelo amor de Deus, alguma organização aqui, pode?"

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Pode. Mas não foi fácil. A se levar em conta o clima de reunião de velhos amigos no encontro com a dúzia de jornalistas em Manhattan, o set do filme foi uma festa só.

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Alan Arkin em cena de "Despedida em Grande Estilo"

"Foi assim mesmo. Eles são divertidos e agradáveis, e todo mundo se conhecia bem, se admirava, eu era o elemento novo na turma, tirando as pegadinhas do Morgan. Por exemplo, uma vez, depois que eu arrumei toda uma cena complicada, dentro do banco, a luz, marquei os movimentos dele, ele se virou calmamente para mim e disse, sério: 'É, mas meu personagem jamais faria isso. Muito menos deste jeito'. E depois caía na gargalhada com minha cara de espanto", recorda Braff.

Embora seja, no papel, um remake de filme homônimo lançado em 1979 com George Burns, Art Carney e Lee Strasberg e um final muito mais soturno, a versão século XXI  de “Despedida em Grande Estilo” é menos sombria e mais centrada na realidade do mundo pós-globalização, com os protagonistas lidando com o fim dos resquícios do estado de bem-estar social nos EUA, a migração do trabalho para a Ásia e o desaparecimento de suas pensões na desregulamentação dos bancos ianques. É justamente o banco onde a aposentadoria do trio está “congelada” a vítima de plano maquiavélico de Joe (Caine), com a ajuda mais ou menos entusiasmada dos improváveis comparsas Willie (Freeman) e Albert (Arkin). Este último, no roteiro de Theodore Melfi (diretor de “Estrelas Além do Tempo”), ainda ganha uma distração no romance com Annie (Ann-Margret).

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Sir Michael Caine em cena de "Despedida em Grande Estilo"

"Melfi e eu decidimos fazer um comentário sobre como tratamos nossos idosos nos EUA, mas aposto que não é muito diferente em seu país. Quando empresas são vendidas para corporações multinacionais ou simplesmente são fechadas em fusões complexas, as pensões desaparecem. Eles não estão roubando o dinheiro dos outros, eles querem recuperar o dinheiro deles! Há um momento no filme em que Joe diz, com alguma razão: o' pior que pode acontecer com este assalto é eu ir para a cadeia, onde terei alimentação e saúde garantidas, algo impossível de se ter sem o pagamento de minha já parca aposentadoria', diz Braff.

O melhor da história, é claro, está na possibilidade de se ver Caine, Freeman e Arkin nas mesmas cenas, para além, no caso dos dois primeiros, das pequenas interações da franquia “Batman”. O trio, com os auxílios luxuosos de Ann-Margret e Lloyd, se jogam nos papeis, fazem rir com as tentativas de se tornarem mais fisicamente aptos para um assalto à mão-armada em um dos bancos mais movimentados do Brooklyn, e emocionam na dose certa, evitando a pieguice, ao colocarem o dedo em um problema social infelizmente cada vez mais próximo da realidade brasileira, especialmente com a discussão em torno da inevitabilidade da reforma da Previdência Social.

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"É um filme que trata, como você pode imaginar, da inevitabilidade de se envelhecer, se você, claro, teve sorte, porque sabemos bem qual é a outra opção", observa Freeman, que segue: "Sabe como entrávamos no clima no set? Na hora das filmagens, pedíamos ao Zach para colocar música dos anos 50" (e começa a cantarolar um doo-wop). Arkin, com cara de poucos amigos, o interrompe:  "Você não tem ideia, Morgan canta o tempo todo. Sem parar. Imagina isso durante as filmagens". Ann-Margret imediatamente acompanha Freeman harmonizando com o amigo em uma segunda voz menos grave. Caine coça a cabeça e lembra, desviando ligeiramente o assunto: "Isso me lembra aquele filme que fiz com Mike Myers, de espião, que tinha uma música para cada take, era uma loucura aquilo, como era mesmo o nome do filme"? Braff o salva:  “Austin Powers!”. Caine reage: "Isso mesmo"!

O trio se prepara para o assalto que vai garantir a aposentadoria em
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O trio se prepara para o assalto que vai garantir a aposentadoria em "Despedida em Grande Estilo"

O ator é subitamente interrompido por um alto-falante anunciando que “a situação com o alarme de incêndio já foi resolvida, está tudo sob controle”. Os atores se entreolham e parecem, por um útimo de segundo, prontos para entrarem em ação tal qual seus personagens em “Despedida em Grande Estilo”. Acabam caindo na risada.

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"As pessoas me perguntam se o segredo para se envelhecer feliz e leve, no nosso caso, está ligado ao fato de vivermos a vida encarnando tantos personagens diversos, experimentado outras possibilidades de felicidade. Não é simples assim. Para nós, como para qualquer outra pessoa mais experimentada em anos, a chave está em se você teve uma aspiração e ela não foi alcançada. Isso se transforma em desilusão e depois em raiva. A chave é você poder viver do que gosta e fazer o que gosta com quem gosta", filosofa Freeman.

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Michael Caine e Morgan Freeman em cena de "Despedida em Grande Estilo"

Michael Caine complementa. "Minha vida, por conta de ser um ator, tem sido nada menos do que um paraíso. Fiz exatamente o que queria fazer na vida. Não me tornei um ator para virar uma estrela do cinema e ficar milionário ou famoso. Eu vim de uma família de trabalhadores britânicos, não tinha nem como sonhar com aquilo, eu estava felicíssimo sobrevivendo com pontas no teatro inglês dos anos 50, fazendo muitos mordomos e copeiros. Até hoje me lembro de quando tinha 14 anos e olhei por sobre uma janela os ensaios de um grupo de teatro amador da minha cidadezinha, quando caminhava em direção ao campo de futebol. Olhei porque as meninas eram lindas. Eles me disseram: “pode entrar’. E eu entrei. Um adolescente de 14 anos querendo arrumar uma namorada. A namorada não aconteceu. Mas aqui estou. Fim da história".

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