Com mudanças diárias no clima político norte-americano, especialmente depois da eleição de Donald Trump, muitos acreditam que respostas políticas serão o motivo pelo qual certos filmes ganharão prêmios como o Oscar. Porém, com exceção de discursos de atores e outros artistas, o resultado da eleição em si não deve impactar na escolha dos vencedores. Há diversas razões para isso.
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Para começar, é preciso lembrar que já havia uma tendência por parte da camada mais progressista da população americana de lamentar e se opor às decisões mais conservadoras do Oscar, isso muito antes do resultado da eleição para presidência Americana, em 2016. Portanto, se houver uma resposta política na escolha de melhor filme, este retorno provavelmente vem sido desenvolvido há muito mais tempo.
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Também é bom relembrar que a Academia possui milhares de membros, que votam e decidem o melhor filme. Logo, o Oscar por si só não é tão homogêneo em relação às suas escolhas. Com o intuito de se modernizar e diversificar para as camadas mais jovens da população, a premiação criou novos regulamentos. Por exemplo, aqueles que não estão ativos no mercado cinematográfico por muitos anos, não poderão mais avaliar os indicados, algo que se tornou muito polêmico anos atrás. Esta mudança, que visa aumentar a diversidade entre os votantes, é um processo lento e sem meios reais de provar seu efeito. Portanto, não podemos assumir que se um filme com temática progressista ganhar o Oscar, esta vitória é estritamente uma resposta politica.
Além disso, há uma questão que dificulta ainda mais o voto com base política. A escolha de uma produção baseada estritamente em seu grau de progressismo ou conservadorismo, pode esconder o seu real sucesso e importância. Por exemplo, quando "Moonlight: Sob a luz do luar" foi indicado ao Oscar, alguns viram a oportunidade para que um filme com a temática afro-americana ganhasse o prêmio mais cobiçado da Academia. Porém, muitos esqueceram de analisar ou ignoraram a qualidade do próprio filme, que tem chance de ganhar o Oscar por mérito próprio.
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Apesar de "Moonlight" ser possivelmente considerado o mais progressista entre os indicados para melhor filme, especialmente devido à sua temática rara (o personagem principal é um homem negro, gay e que vive em um bairro pobre de Miami), tal conclusão pode ser precipitada. Por exemplo, algumas pessoas da comunidade afro-americana dizem que o filme mostra os negros de maneira estereotipada, pois alguns personagens são traficantes de droga ou ainda viciados. Em outras palavras, há uma reclamação de que "Moonlight" não mostra os personagens de forma mais complexa e realista.
Portanto, mesmo que alguns membros do Oscar possam até ter em mente a mensagem política de uma produção, votar em um conceito político de um filme fica complexo e difícil – sem mencionar que tal ação pode deixar de lado o próprio mérito da produção. Por outro lado, a tentativa de medir a quantidade de votos que foram dados a filmes por causa de questões políticas é impossível. Por estas razões, é muito difícil de validar a crença de que o resultado da eleição norte americana que consagrou Trump possa realmente afetar as decisões dos filmes ganhadores.
*Daniel Bydlowski é um cineasta brasileiro, que atualmente mora em Los Angeles, e em breve vai lançar o longa-metragem realidade virtual em 3D "NanoÉden"