É muito fácil gostar, mas talvez seja mais fácil ainda desgostar de “50 Tons Mais Escuros” , segunda parte da adaptação da série best-seller de E.L James. Lançado dois anos depois de “50 Tons de Cinza”, o novo filme suscita o mesmo afã do original. Com cenas de sexo um pouco mais picantes do que se vê em blockbusters hollywoodianos, mas bem menos explícitas e imaginativas do que parte do público gostaria.
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Depois de muito bafafá nos bastidores, a Universal trocou o comando da produção. James Foley, responsável por fitas sensacionais como “Dominados pelo Desejo” e “O Sucesso a Qualquer Preço” no início dos anos 90 e que agora estava mais dedicado à TV, dirigindo séries como “House of Cards” e “Billions”, substitui Sam Taylor-Johnson, que teve estranhamentos nos bastidores de “50 Tons de Cinza” com a E.L James, que impôs seu marido, Niall Leonard, como roteirista das duas sequências – gravadas simultaneamente.
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Foley, a exemplo do que já havia acontecido com Johnson no original, faz o possível para melhorar diálogos pedestres e cenas dramaticamente insatisfatórias. Algumas de suas soluções são brilhantes, como a cena em que Anastasia Steele (Dakota Johnson) finalmente percebe a necessidade por controle que Christian (Jamie Dornan) possui, mas outras são realmente risíveis, como o clímax, na festa de aniversário de Christian oferecida por sua mãe (Marcia Gay Harden) envolvendo Elena (Kim Basinger), a mulher que introduziu o senhor Grey no mundo do fetiche e da dominação.
É inegável, porém, que Foley trouxe um novo olhar para a série. E um bom olhar. Christian Grey ganha em complexidade. Estamos novamente mergulhados nessa história de amor cheia de luxo e com alguma perversão e o personagem emerge mais intrigante para o olhar do público do que Anastasia. Foley enquadra essa história de amor de maneira atípica e flagra um Christian Grey que tenta se aproximar da idealização do príncipe encantando que Anastasia parece defender, mas sofre muito nessa tentativa. Testemunhar o personagem se debater em sua tentativa irrestrita de ter algum controle sobre Ana é o que o novo “50 Tons” tem de mais interessante.
“Eu cá estava com minha fantasia de encontrar um homem perfeito e, então, você apareceu”, diz Anastasia na cama após uma noite de sexo convencional - como ela queria - com Grey. Em outro momento, ela reclama: “isso não é uma relação Christian, é uma posse”.
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Não é preciso ir tão a fundo na trama de “50 Tons Mais Escuros” para saber que se trata de uma história de amor, não de sexo, ainda que com o bem-vindo acréscimo de colocar o sexo em evidência em um gênero costumeiramente refratário a ele. Ana quer modelar Christian a suas expectativas e o mesmo acontece com o rapaz, nada mais usual nas relações amorosas dentro e fora das telas de cinema. Nesse segundo volume, no entanto, testemunhamos os personagens dispostos a fazerem concessões. É o que o novo filme avança de efetivo em relação ao primeiro.
A produção derrapa mesmo é no desenho de Elena. Kim Basinger, que fora aprendiz do dominador Mickey Rourke em “9 e ½ Semanas de Amor”, aqui faz essa personagem tão importante no passado de Christian. Desperdiçada, a atriz parece estar ali apenas como peça figurativa. Sua grande cena é a mais frustrante da sequência e o filme perdeu a oportunidade de fazer mais do que apenas sugerir que ela vai “partir para o barraco” no terceiro e derradeiro capítulo.
De todo modo, Jamie Dornan continua um Christian Grey de momentos. O ar sério e traumatizado do britânico nunca soa natural e ele precisa realmente ser bem dirigido para elevar a libido da audiência que tanto quer desejar Christian Grey. E dá-lhe desabotoar aquela camisa branca tão bem passada! Dakota Johnson continua sem timing para suas caretas e bocas, mas acerta no tom entre a moça sonhadora e o expoente feminista moderno. Anastasia quer resgatar Christian, mas não se incomoda de gozar bastante no ínterim. Em essência é justamente isso o que “50 Tons de Cinza”, o “pornô para mamães”, vende. Tudo bem ser livre, poderosa e independente na vida, mas gostar de ser dominada na cama.