Juliette Binoche é uma atriz tão exuberante, tão maior que a vida, que é capaz de atuar em italiano e francês em um mesmo filme e mesmerizar mais o público justamente quando não fala nada. Em “A Espera”, filme que integrou a competição oficial do Festival Internacional de Cinema de Veneza em 2015 e que estreia nesta quinta-feira (2) nos cinemas brasileiros, a atriz faz Anna, uma mulher imersa em luto e solidão.
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Francesa, Anna foi para a Itália e casou-se com um dos primeiros que encontrou que falava bom francês. A confissão ela faz a Jeanne (Lou de Laâge), enquanto conversam ameninadades à espera do filho de Anna, Giuseppe, que é namorado de Jeanne. A jovem foi à casa de Anna a convite do namorado e por lá fica uns dias na expectativa de sua chegada.
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Acontece que Giuseppe está morto. Os primeiros cinco minutos do filme de Piero Messina são constituídos de rituais fúnebres, o semblante choroso de Binoche, cânticos religiosos e o som pesado de um martelo. Não há diálogos. Ali estão os primeiros vestígios de que se trata de um daqueles filmes em que o que não é dito tem mais valor e potência dramática do que o que as palavras insinuam.
Anna contraria nossas expectativas e não diz a Jeanne que seu filho e namorado da moça está morto. Ela não faz questão de disfarçar o luto, mas entrega a morte a outro membro da família, como se fosse possível enlutar-se por outro no mesmo compasso em que tenta aproximar-se de seu filho depois de morto por meio de Jeanne.
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Com muita sutileza e poder de sugestão, Messina se desdobra sobre o luto vivenciado por duas mulheres que se encontram desajeitadamente e sob circunstâncias que não dominam de todo. Jeanne não sabe exatamente em que pé sua relação com Giuseppe está e Anna tenta tocar uma parte da vida de seu filho que lhe era desconhecida.
Apesar de versar sobre morte e descobrimento, e de emular a ilusão como instrumento da sanidade, seja ela mental ou emocional, o cineasta não se furta a permear o registro de certa sensualidade, ecoando uma característica bastante europeia na liberdade com que certos temas são tratados pelo cinema. Não à toa, o espectador fica à mercê do fluxo entre o italiano e o francês. “A Espera” é um filme que trabalha justamente a expectativa, mas de uma maneira inesperadamente anticlimática.