É possível contar nas mãos os mestres que estão em atividade no cinema atual. Um William Friedkin aqui, um Martin Scorsese ali, mas o cinema moderno anda carente de mestres – aquela categoria de cineastas infalíveis. Park Chan-Wook , o sul-coreano responsável por “Oldboy” (2003) e “Lady Vingança” (2005), já pertencia a essa categoria, mas “A Criada”, seu mais novo e espetacular filme, dissipa toda e qualquer dúvida sobre seu merecimento de figurar em tão distinta seleção.
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À vontade com a alcunha de mestre, Chan-Wook faz de “A Criada” uma verdadeira aula de narrativa. Mais: proporciona um espetáculo de ilusionismo em plena era da superinformação e conta um conto maliciosamente sensual sobre ganância, tradição e amor na Coréia sob ocupação japonesa na década de 1930.
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Um oportunista (Jung Woo-Ha) vê a possibilidade de seduzir a herdeira de uma fortuna japonesa que vive sob as rígidas rédeas de um tio autoritário e para isso escala Sookee (Kim Tae-ri), uma charlatã escorregadia, para atuar como criada de Hideko (Kim Mon-hee) e ajudá-lo na tarefa de seduzi-la. O plano começa a descarrilar quando Sookee começa a se apaixonar por sua patroa.
Chan-Wook capricha na narrativa e na confecção das expectativas do público, apenas para subvertê-las por completo mais à frente. À parte a exuberância técnica apresentada pelo filme, dos figurinos à direção de arte, “A Criada” sobeja em algo raro no cinema atual: frescor. Apesar de contar uma história relativamente banal (quem nunca viu um golpe do baú antes?), Chan-Wook o faz com a gentileza de um artesão e a malícia de uma cortesã. Não é à toa, que o filme é perigosamente sensual e oferta a cena de sexo lésbico mais explosiva desde “Azul é a Cor Mais Quente” (2013).
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Trata-se de um daqueles filmes que quanto menos dele se falar, melhor. Chan-Wook domina com anta expertise as matizes do cinema de gênero, mas também do cinema de autor, linhagens complementares, mas que apenas os mestres são capazes de harmonizar, que o queixo do fã do bom cinema vai ao chão mais de uma vez durante a sessão. “A Criada” é cinema tão superlativo que causa estranhamento. Mas do melhor tipo possível.