Com o que tenho visto recentemente me peguei refletindo sobre o papel das feiras literárias . Sou uma entusiasta e apaixonada por feiras. Já participei de diversas edições, nacionais e internacionais, como convidada e como visitante. Para mim não há lugar melhor para o debate, troca de conhecimento, de cultura e o principal: ouvir o outro lado.

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Participação de Miriam Leitão na Feira do Livro de Jaraguá do Sul foi cancelada
Divulgação/TV Globo
Participação de Miriam Leitão na Feira do Livro de Jaraguá do Sul foi cancelada

E justamente ouvir o outro lado, o lado da opinião contrária é que tem revelado um tipo de manifestação perigosa e agressiva, que, dentro desse ambiente tão diversificado como as feiras literárias, se destoa e nos faz nos perguntar: O que está por vir?

Durante a FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty) um dos convidados do chamado Barco Pirata  foi o jornalista Glenn Greenwald  , que junto com Gregório Duvivier debateriam sobre “os desafios do jornalismo”. Já logo na entrada da cidade foi colocado uma faixa com os dizeres: “Indignação é coisa Nobre! Fora de Paraty Glenn Greenwald!”, o que até então acho válido como protesto.

Mas a situação piorou no decorrer da noite. Um grupo de aproximadamente 30 pessoas se posicionaram do outro lado do rio, soltaram rojões e ligaram um som bem alto para não deixar o Glenn ser ouvido por quem acompanhava o debate. Essa atitude de impedir alguém de falar, e aí não estou questionando quem seja, mas o ato, para mim extrapola não apenas uma questão democrática, mas de educação.

Se você não gosta da pessoa ou não concorda com o que ela pensa é absolutamente um direito seu, mas daí você tentar impedir que ela fale em um evento ao qual ela foi convidada não pode ser considerado uma forma de protesto. Até porque Gleen estava ali para um debate de ideias, que justamente tem como objetivo levantar diversas visões acerca de um tema.

Faixa contra Glenn Greenwald
Divulgação/TV Globo
Faixa contra Glenn Greenwald

E se não bastasse isso, agora nos deparamos com a notícia de que a  participação da jornalista e escritora, Miriam Leitão  , na Feira do Livro de Jaraguá do Sul, foi cancelada devido a inúmeras mensagens ameaçando sua integridade física. Chegar ao ponto de uma organização cancelar uma participação é inadmissível.

Como um lugar tão aberto para receber todo tipo de pensamento se transformou em medo? Não podemos achar isso normal ou aceitável. Feira sempre foi o lugar mais acolhedor que eu já conheci. E não é uma questão de lado político, é de educação. Respeitar o espaço, a voz do outro é fundamental para a manutenção da democracia.

Eu me preocupo muito com o rumo de tudo isso. Como profissional do setor, como leitora e frequentadora, acredito que precisamos falar sobre o que está acontecendo. Estamos vivendo uma era de ódio aflorado, perigoso. Daqui a pouco seremos agredidos pelo livro que estivermos escolhendo nas livrarias  , ou pela mesa que estivermos assistindo nas feiras.

Que a gente consiga aprender a ouvir o contrário e ter discernimento para o debate e troca de ideias. Que as feiras voltem às suas origens da pluralidade cultural e do protesto consciente, que nada tem a ver com a intimidação e falta de educação. Que a gente aprenda a colocar nossa opinião de forma amistosa, sem ameaças, sem imposição. Que as Feiras literárias voltem a ser lugar de sonhos e histórias.

Para pautas e sugestões: [email protected]

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