Após lutar pelo impeachment de Dilma Rousseff e apoiar Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais em 2018, o músico Lobão, 62, se mostra, desde o primeiro ano de governo, um oposicionista ao bolsonarismo. Segundo ele, "Bolsonaro não tem condições morais de administrar o país".
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Em seu novo livro "Lobão: 60 anos a mil", que deve chegar às livrarias em março, ele relata os detalhes de seu afastamento do presidente e ataca o escritor e guru Olavo de Carvalho, próximo de Bolsonaro, Lobão diz que durante a campanha o capitão reformado cometeu "estelionato eleitoral". Trair promessas de campanha como o combate à corrupção são apontadas como um dos principais problemas, que deveria fazer com que o presidente se afastasse do cargo.
Segundo o músico, Olavo de Carvalho "é o cérebro e a alma" e o líder dos ataques em defesa do governo feitos contra adversários e também aliados nas redes sociais.
Ainda assim, Lobão diz, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo
, que não se arrependeu: "Não, não me arrependi. Não havia alternativa. Não poderia ficar mudo, porque fui um dos primeiros a ficar na oposição ao PT
e a levar pedra do partido, em 2014, 2015. Então, depois de tanta luta, optei pelo Bolsonaro, porque achava uma imoralidade, uma obscenidade, o PT se eleger de novo após o impeachment da Dilma. Seria muito mais maligno do que entrar numa aventura com o Bolsonaro. Não houve desencanto. Meu tempo de tolerância é que foi muito mais curto (do que com o PT), porque os descalabros agora aconteceram numa intensidade e rapidez fora do comum", explicou.
No livro, Lobão chega a chamar Bolsonaro
de "demente", mas garante que: "Sem nenhum tipo de destempero, posso dizer que ele não tem realmente condições de administrar o Brasil. Nem morais nem emocionais nem intelectuais. Eu o conheço pessoalmente. Quando falo que ele tem desequilíbrio moral, é só ver as milícias, as rachadinhas, o nepotismo, o estelionato eleitoral em que o governo se transformou. Emocionalmente, você o vê dando uma banana, xingando todos os presidentes do mundo. Intelectualmente, nem se fala. Um cara que não consegue ler três linhas de um livro já mostra que nunca teve apetite intelectual. Então, não se trata aqui de ira nenhuma. São fatos que ele nos mostra e que estou, friamente, localizando nas áreas emocional, moral e intelectual", diz.
Questionado sobre quais seriam as falsas promessas, o músico é enfático. "Houve traições desabusadas das promessas de campanha. Todo mundo sabe. Ele prometeu não concorrer à reeleição
, mas só fala nisso desde antes da posse. Esvaziou a luta contra a corrupção
, retirou o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Ministério da Justiça. Transformou o (Sérgio) Moro num eunuco da Justiça".
Defensor do impeachment de Bolsonaro , Lobão explica sua posição, que não seria somente a incompetência e a falta de condição moral para administrar. "Defendo o afastamento não só pela incompetência, porque é um perigo ter ali uma pessoa do nível do Bolsonaro, que fala o que ele fala. Ele é uma pessoa absolutamente horrorosa, um desserviço e um insulto para a Nação. Não tem o mínimo de dignidade para ocupar o cargo. O PT criou uma época de animosidade no País. A única salvação era ter um governo de aglutinação e apaziguamento. Mas não. Temos um governo que desde o começo detona a própria base, os chamados "isentões", que não são considerados puros dentro da receita bolsonarista. Isso tudo é um coquetel molotov para uma distopia social muito grave", defende.
Grande apoiador do "Fora, Dilma", ele assume que a presidente não cometeu crime de responsabilidade para ser retirada do cargo: "Vamos falar claramente: a Dilma
só foi impedida porque jogou o País na pior recessão
da história. Com o (ex-presidente Fernando) Collor, aconteceu algo parecido. O Bolsonaro ainda está no vácuo do (ex-presidente) Michel Temer, que deu uma ajeitadinha na economia", pontua.
Artista de rock, Lobão critica também o governo no tocante a cultura e avalia como um "desastre" a gestão. Ele cita "o cara da Funarte (Fundação Nacional das Artes), Dante Mantovani, para apontar o "obscurantismo total" e citar que, "quando não são pastores, são terraplanistas, olavistas" e defender que o governo dá palco para aristas que apoiavam os governos petistas, atacando-os.
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Questionado sobre a nova secretária da Cultura, Regina Duarte , ele defende que "É um tremendo cinismo, porque a agenda cultural não vai mudar. Fica essa cortina de fumaça cor-de-rosa, porque ela é muito fofa, mas já está sob ataque dos bolsolavistas, porque demitiu uma pastora. Ela não terá a liberdade de fazer o que deseja. Mesmo que tenha, está no lugar errado, na hora errada. Está na hora de derrubar o governo, democraticamente. Não dá para remendar um governo "irremendável".