Ainda em 2018 é possível ver o resquício de uma locadora de vídeo por aí. O esqueleto da Blockbuster aparecia aqui e ali, antes da rede ser incorporada as Lojas Americanas, enquanto esse tipo de estabelecimento se firma como uma lembrança nostálgica, assim como as fitas K7 e as câmeras com filme. Mas, outro tipo de estabelecimento concorre para entrar nesse grupo de memórias do passado: as bancas de jornal.

Bancas de jornal correm o risco de entrar em extinção, assim como aconteceu com as locadoras
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Bancas de jornal correm o risco de entrar em extinção, assim como aconteceu com as locadoras

Antes presentes a cada esquina das grandes metrópoles, as bancas de jornal têm sofrido uma redução brusca nos últimos anos. Um dado do Sindicato dos Vendedores de Jornais e Revistas de São Paulo de 2012 já apontava o fechamento de uma banca por dia na capital paulista. Parte disso se deve a internet, e outra pela crise editorial generalizada que se estabeleceu no Brasil. Fato é que esses pequenos espaços dedicados a jornais e revistas tem ficado mais escassos e correm risco de extinção.

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“A banca tradicional esta fadada ao fracasso totalmente”, comenta Adriano Campos, consultor do Sebrae-SP. Por tradicional entende-se que vende mídia impressa. “Não acredito que tende a desaparecer porque muitas delas estão em localizações muito estratégicas. O que tende a reduzir bastante é o tipo de produtos que elas tem lá”, completa.

Crise jornalística

Fechamento de diversos títulos da Abril agrava crise das bancas de jornal
Reprodução
Fechamento de diversos títulos da Abril agrava crise das bancas de jornal

No começo de agosto anunciou-se uma das maiores crises editorias brasileiras quando a editora Abril extinguiu 10 de suas revistas publicadas. O ocorrido é consequência, principalmente, da proliferação de informação via redes sociais e uma queda brusca na credibilidade do jornalismo em geral.

Enquanto esses problemas devem ser consertados para garantir que se preze pela boa informação e pelo profissionalismo, as tais consequências continuam se ramificando e criando novos prejudicados. O jornaleiro Ivan Paiva, mais conhecido como Ceará, é dono de uma banca no Brooklin, em São Paulo, e conta que a falta das publicações vai afetar, e muito as vendas, mas que a crise é bem mais antiga.

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Há 22 anos a frente da banca, Ivan começou vendendo jornais no farol. Ele conta que na época vendia dois mil exemplares no farol em duas horas de trabalho. “Hoje eu vendo mais jornal pra coco de cachorro”, comenta, tentando manter o humor frente os tempos difíceis. Ceará viu suas vendas caírem cerca de 60% nos últimos anos e um dos motivos que o mantém no trabalho é a afinidade com seu público.

“Estou em local privilegiado, com poder aquisitivo bom”, conta ele, que é conhecido na região e tem clientes fieis que passam para bater um papo além de comprar algo.

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Divino Gaspar, dono de uma banca próxima a PUC-SP em Perdizes conta que as publicações que ainda tem relevância para ele são as voltadas para a educação, já que o local é ponto de passagem dos estudantes. “Revista de moda, decoração, turismo já caiu tudo”, lamenta. Ele era dono de uma segunda banca, em frente ao prédio da TV Cultura, mas a vendeu e descobriu que o novo dono fechou dois anos depois da compra.

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Bancas de jornal sem jornal

Gaspar é dono da Banca Vitória, em São Paulo: hoje jornais e revistas representam apenas 20% do faturamento
Marcio Mecca
Gaspar é dono da Banca Vitória, em São Paulo: hoje jornais e revistas representam apenas 20% do faturamento

Ao sair da estação Pinheiros do metrô em São Paulo, uma imensa banca ocupa a calçada que leva a rua Teodoro Sampaio e seu grande comércio. O ponto é movimentado durante todo o dia e, logo, sinônimo de boas vendas. Mas, quando se olha com atenção, não são os jornais que se destacam na banca, mas sim mochilas, óculos de sol, bichos de pelúcia e toda sorte de bibelôs, acessórios e outras dessas coisas que a gente normalmente não precisa, mas acaba querendo.

Essa tem sido a solução para compensar a falta de interesse na compra do bom e velho jornal. Aquela imagem do brasileiro comprando o noticiário a caminho do trabalho já não acontece mais. Adriano comenta que esse novo “mix” de produtos é a melhor saída para os donos de bancas, incluindo itens de conveniência e de compras não planejadas, como guarda-chuva, por exemplo. Adriano também indica a prestação de serviços como carga de bilhete único ou de celular.

Ceará não gosta muito dessa ideia. Ele conta que já foi sugerido que ele fizesse recarga do bilhete que permite o acesso ao transporte público paulistano, mas que considerou a hipótese muita arriscada por conta de segurança – já que garantiria um caixa maior e aumentaria a chance de assalto, além do lucro ser baixo (abaixo de 1% do valor recarregado). “No meu ponto de vista movimenta a banca, mas é um movimento em falso”, acredita.

Gaspar faz recarga de celular, mas só vende pelo cartão, justamente para evitar o acumulo de dinheiro de papel na banca e ficar mais visado. Ele conta que começou a variar os produtos oferecidos há três anos, quando começou a sentir a queda na venda de publicações. “A hora que eu percebi que o negócio estava ficando muito fraco, comecei a explorar o que tinha aqui”, conta.

Hoje, os itens de tabacaria são os mais vendidos, junto com alimentação e equipamentos eletrônicos como cabos e carregadores. “Hoje meu faturamento gira em torno de 80% dessas coisas”, comenta.  

Extinção

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Bancas de jornal correm risco de extinção

Do mesmo jeito que a Blockbuster foi absorvida pelas Lojas Americanas e os DVDs deram espaço nas prateleiras para barras de chocolate, meias e até eletrônicos, os espaços das bancas serão gradualmente substituídos por esses itens diversos do dia a dia. A banca, como conhecemos, não deve durar muito mais tempo.

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“Não queria que isso acontecesse com as bancas de jornal . Me sinto tão feliz dentro da banca,  me sinto um leão. Abro e fecho com o maior prazer”, comenta Ceará. Leão ou não, Ceará é um dos muitos que tem que se adaptar aos novos tempos e deixar o jornal de lado para sustentar seu trabalho.

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