A natureza sempre encontra uma maneira de se fazer presente
A borboleta mantém o voo solitário, indiferente ao frenesi ao seu redor (Imagem: Michael Hannigan | Shutterstock)
A natureza sempre encontra uma maneira de se fazer presente

No turbilhão de concreto e asfalto que é São Paulo, onde a pressa dita o ritmo frenético das horas e os ruídos dos motores abafam qualquer suspiro de natureza, eis que surge um intruso inesperado: uma borboleta azul. Não, não é um devaneio primaveril, tampouco uma ilusão de ótica. É real. Uma borboleta azul, resplandecente em sua singularidade, desafia a monotonia do cinza urbano.

É como se um pedaço do céu tivesse se desprendido e decidido dançar entre os carros engarrafados, deslizando entre os edifícios impessoais que se erguem como muralhas de concreto. Onde não há verde, onde não se avistam parques ou jardins, e onde até mesmo as sacadas dos prédios se mostram despidas de vida vegetal, ali ela está, a borboleta azul, um paradoxo ambulante na selva de pedra.

Rastro de cor e beleza

Preso em minha própria rotina , questiono a origem e a missão desse ser com um par de azul na forma de asas. De onde teria vindo? Para onde se dirige? Será que, em meio ao caos e à agitação da metrópole, ela busca algo além do simples sobreviver? Seria sua missão deixar um rastro de cor e beleza na vastidão monocromática da selva urbana?

Enquanto o trânsito avança a passos lentos, a borboleta mantém o voo solitário, indiferente ao frenesi ao seu redor. Seu azul brilhante é uma pequena nota de esperança em um cenário, muitas vezes, desolador. Assim, enquanto as buzinas e as sirenes ecoam pelas ruas, a borboleta azul segue seu curso, talvez sem destino definido, mas certamente deixando para trás uma marca indelével da efêmera beleza que pode florescer até nos ambientes mais inóspitos. Talvez, só talvez, ela seja a própria poesia em voo, uma lembrança de que, mesmo no coração da cidade, a natureza encontra uma maneira de se fazer presente.

Um paradoxo inspirador

Essa suave visita me lembrou, por associação, um poema de Carlos Drummond de Andrade, chamado “A flor e a náusea”. Em determinado momento, o poeta se espanta com uma flor que brotou por uma fresta em uma calçada áspera e cinzenta. Admirado, ele escreve: “… uma flor nasceu na rua/Passem de longe/ bondes, ônibus, rio de aço do tráfego./Uma flor ainda desbotada/ilude a polícia, rompe o asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios, garanto que uma flor nasceu”. No meu caso, garanto que uma borboleta azul, como as que povoam jardins encantados, driblou em voo o trânsito opaco da rotina da cidade.

Por Kaká Werá – revista Vida Simples

Ecologista do ser e cultivador da arte do equilíbrio da natureza humana.

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