Luana Carvalho gravava um disco com composições próprias quando a pandemia de coronavírus tomou conta do mundo. Junto com a marcha devastadora da doença, aproximava-se também a data de um ano da morte de sua mãe, a cantora Beth Carvalho (1946-2019). Aos 39 anos, Luana sentiu a necessidade de parar tudo o que estava fazendo para homenageá-la.
"Às vezes, você só quer sentar e chorar, mas herdar um legado traz responsabilidades", diz ela, que pretende lançar o projeto autoral até o fim do ano.
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Luana começou as homenagens com uma live na data que marcou um ano do velório da mãe, em 1º de maio. Lançou também uma playlist no Spotify com suas canções preferidas do vasto repertório gravado pela sambista.
O mergulho na obra da mãe foi profundo, e Luana, já mexida, ainda viveu todo o processo durante convivência intensa com a filha Mia, de 2 anos, na quarentena.
"Passei semanas colocando as músicas que minha mãe gravou para tocar e vivendo o fato de ver a minha filha ouvindo a obra da avó", emociona-se. "Elas tiveram apenas um ano de convivência e foi muito forte", afirma.
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Do mergulho, Luana emergiu com vontade de fazer algo maior. Chamou os amigos — o produtor Kassin e o músico VovôBebê (violão, guitarra, coro e gravação de vozes) — e pariu o disco “Baile de Máscara”. O álbum, que ela lança nesta quarta-feira (10) com distribuição digital pela Altafonte, foi gravado em duas semanas, remotamente.
A música “Meu Escudo” (Décio Carvalho e Noca da Portela), que abre o álbum, resume o que significa para Luana lançar um disco neste momento do Brasil: “Para suportar um mundo de desilusão / Vou usando como escudo o meu coração”, diz um verso da letra.
"O que eu tenho para oferecer em troca de todo esse descaso que acontece no país é o meu coração", afirma. "Quando ele sai do corpo em forma de canção, sinto que fiz minha parte. Se for para sangrar, agora vai sangrar fora".
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O desgosto com atual situação política e de saúde pública do país seria compartilhado por sua mãe, se ela ainda estivesse aqui, segundo Luana.
"Se minha mãe fosse viva durante a Covid, talvez fosse morrer asfixiada com o Brasil atual", diz Luana, que perdeu o pai, o ex-jogador de futebol Edson Cegonha, em 2015. "É difícil perder o escudo cronológico. Agora, sou a primeira, na ordem, a morrer. Parece mórbido, mas é a vida. Não tenho mais uma casa incondicional para ir, me esconder ou me cuidar".
Após um ano de luto intenso (“paira um torpor no início, era como se eu estivesse flutuando”), ela conta que agora consegue pisar em terra firme. Apesar de ainda ter momentos de vazio profundo. Quando Beth partiu, a filha tinha acabado de alugar uma casa grande na Gávea para morar com a mãe. Não deu tempo, a cantora morreu antes. E Luana, desde então, convive com essa ausência.
"Mas ela está aqui, sinto o tempo todo. E sinto uma saudade misturada com a confiança de que ela soube o que fazer até o fim", afirma. "O disco é a minha maneira de dividir essa saudade, de aproximar o que ela fez do que eu faço".