Os canais pagos de televisão, como HBO e Paramount, e de streaming, como Netflix e Amazon, lançam neste mês a temporada de séries, filmes e documentários com produções próprias. As séries são destaques. Dezenas delas estreiam tanto contando novas histórias como dão continuidade a temporadas. Os “showrunners”, os idealizadores dos programas, pretendem assim suprir a síndrome de abstinência de um público viciado em diversão.
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O motivo da corrida pela atenção do público se deve ao final recente de duas grandes séries de sucesso duradouro: “Game of Thrones” (HBO), com oito temporadas, e “Big Bang Theory” (Warner), com doze. Analistas enxergam no fato o fim da “era de platina da televisão”, iniciada há dez anos, com superproduções, boas ideias e interação do público.
As séries deram à luz hábitos como assistir a vários episódios de uma vez, que os americanos chamam de “binge watching” (compulsão de assistir) — e que no Brasil passou a ser chamado de “maratonar”. Tudo isso gerou três mudanças adicionais. A primeira foi convencer o espectador a trocar o cinema pela televisão e os dispositivos móveis. As séries também forçaram o cinema a investir nos efeitos visuais, nas franquias de super-heróis e na ocupação das salas com um único filme. A terceira alteração é que as histórias inteligentes e intrincadas de roteiristas renomados têm abandonado o cinema pelos estúdios de TV, antes desprezados como usinas de banalidade.
Talvez para evitar a repetição de fórmulas e se alinhar à mudança da sensibilidade do público, as sitcoms leves foram ofuscadas nesta temporada por histórias de suspense, fantasia, terror e distopia futurista.
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Entre as estreias, destacam-se pela originalidade o drama psicológico “Euphoria” e a comédia “Years and Years”, em torno de uma família disfuncional inglesa, ambas pela HBO. A Amazon aposta em uma fantasia cômica apocalíptica, “Good Omens”, minissérie inspirada no livro de Neil Gaiman e Terry Pratchett . O canal AMC traz o terror “NOS4A2” (leia-se “Nosferatu”).
Horror digital
O suspense garante sequências. A nova temporada de “O Jardim de Bronze” narra como o arquiteto e pai de família argentino Fabián (Joaquín Furriel) vira detetive. A terceira temporada da espanhola “La Casa de Papel” anuncia assaltos ainda mais espetaculares. Mas as distopias parecem ser as mais queridas. A terceira temporada de “Handmaid’s Tale” mostra como a oprimida June se liberta e se junta à resistência antimachista. A britânica “Black Mirror” e suas cenas de horror digital chega à quinta temporada. A história de “3%”, em terceira temporada na Netflix, retrata o Brasil no futuro, dividido entre miseráveis e elite.
“Há dez anos, eu não imaginava aonde isso iria parar”, diz Pedro Aguilera, realizador de “3%”, a primeira série brasileira a ter sido lançada em canal de streaming, “O tema soa premonitório”, diz. “Talvez a gente tenha captado as mudanças. Quando começamos, em 2009, ninguém maratonava. Os modos de ver se alteraram .”
A repercussão mundial de “3%” foi tanta que encorajou a Netflix lançar mais séries brasileiras, como “O mecanismo” e “Bandidos na TV” — baseada no caso do apresentador de TV de Manaus Wallace Souza, que encomendava assassinatos para denunciá-los e aumentar a audiência de seu programa.
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O realizadores querem tirar proveito dos velhos sucessos. Quem conseguirá arrebatar fãs apegados? Difícil saber. O risco é o público maratonar pelo passado. Pensando nisso, David Benioff e D. B. Weiss, criadores de “GoT”, relançam a série com material inédito e comentários. Vale tudo quando se trata de aprisionar o espectador a suas obsessões.