Linchamento virtual de famosos reflete polarização política do País
Minorias estão se reunindo na internet para realizar uma espécie de "linchamento virtual" de famosos; o iG Gente conversou com uma especialista de comportamento digital e um Youtuber para entender o caso
Por Reginaldo Tomaz | , iG São Paulo |
“Nego do Borel morreu”, “RIP Valesca”, “Anitta foi expulsa do Vale”. A cada dia que passa frases como estas estão cada vez mais presentes no âmbito digital. Isso faz parte de um fenômeno de “cancelamento” de artistas, ou seja, quando o público para de consumir a arte de tal personalidade por ela não se posicionar politicamente ou não levantar alguma bandeira. Liderado pelo movimento LGBT+ e feminista, a onda está dominando a internet e colocando os famosos em xeque.
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Recentemente, a ex-Panicat Nicole Bahls , por exemplo, foi cancelada pelo público após expressar sua opinião sobre cenas de sexo homossexual nas novelas. Além dela, outros artistas como Nego do Borel, Anitta e Valesca Popozuda também foram figurativamente dados como mortos pelo movimento, cada um por um motivo específico. Afinal, por que a internet está cancelando famosos?
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Especialista em redes sociais, cultura e comportamento digital, Ana Freitas vê o movimento de linchamento virtual como um reflexo do momento em que vivemos, ou seja, "extremamente politizado, extremamente polarizado, e é um fenômeno potencializado pela facilidade de conexão que as redes proporcionam”.
Além disso, a especialista explica que a formação da onda vem de uma linha do capitalismo onde o cliente está mais exigente, buscando não apenas o produto (música) que deseja, mas uma empresa (artista) que tenha o produto que siga seus valores, sejam éticos ou políticos.
“É um reflexo de um momento novo do capitalismo, que é um momento em que o consumidor - inclusive de entretenimento - está buscando maior propósito no consumo e produtos alinhados com seus valores”.
Para o produtor de conteúdo Gabriel Parise, gestor do canal homônimo ao seu nome, o movimento é algo que demorou para acontecer. “É algo que nós (LGBT+) fomos entendendo com o tempo, entendendo quem somos e nossa importância na sociedade, não somos menos que ninguém. Esse posicionamento de cancelar artistas é acima de tudo um protesto”.
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- Se o cancelamento existe, por quê existe?
Cancelar artistas é sinônimo de parar de consumir sua arte e consumar os famosos “dislikes” e “unfollows”, fazendo-os perder números no streaming e nas redes sociais - afetando diretamente o sucesso de suas obras e a distância que suas mensagens podem alcançar.
Para Ana Freitas, outro objetivo do movimento é o fator dinheiro. “A intenção é afetar diretamente o lucro desses artistas”. Corroborando a especialista, Gabriel Parise disserta: “A internet hoje é tudo, se o artista não é conhecido nela, ele não é ninguém. Hoje tudo é view, like.. e isso tem tudo a ver com a imagem da pessoa. Se ela não têm uma imagem boa, outras pessoas e marcas não vão querer se associar a ela”.
Nego do Borel, por exemplo, após se envolver em polêmicas de transfobia e ser acusado de Pink Money, prática de se escorar em algo da cultura LGBT+ para lucrar, teve contratos de publicidade perdidos, seu DVD cancelado e foi alvo de vaias em diferentes apresentações.
Nas redes, alguns internautas consideram o ato de “cancelar” radical. Sobre isso, Parise não discorda, mas explica que com o tempo tornou-se necessário: “Essa é a forma que, infelizmente, as pessoas aprendem... da pior forma. Se por um lado é radical, por outro é uma força necessária. Tem de doer no bolso, apelar para o profissional. De novo, infelizmente, foi a maneira que encontramos para protestar e mostrar que estamos aí”.
- Um futuro de paz?
Sobre até quando teremos este movimento no radar, a especialista Ana Freitas especula que isso ainda pode durar um tempo, já que a internet facilitou a organização de pessoas que pensam do mesmo jeito, dando-as espaço para este tipo de boicote
“Hoje o Zeitgeist (clima intelectual) aponta nesse sentido. Meu palpite é que isso siga enquanto as redes sociais expuserem de maneira tão transparente as visões de mundo, a intimidade e o cotidiano de artistas, e também enquanto seguirmos num contexto de sensibilidade e polarização política”.
Já para Parise a solução já pode ser vista no horizonte e o nome dela é representatividade. “Na minha época não tínhamos uma drag queen para admirar. Quando a gente tem um artista LGBT, como a Pabllo Vittar, no topo... isso faz com que eles ( pessoas da sociedade) nos enxerguem e nos vejam de maneira igual”.
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Contudo, o erro não é o fim da linha, alguns ressuscitaram dos mortos. Valesca Popozuda , Nicole Bahls e até Anitta são exemplos disso, ambas artistas provocaram os internautas e se desculparam. “A informação e a humildade são as melhores coisas para combater esse tipo de coisa. Não tem problema errar desde que reconheça”, finaliza o criador de conteúdo.