Netflix faz a mais cara campanha da década para garantir Oscar de Melhor Filme
Gigante do streaming tem, pela primeira vez, chance de brigar pelo principal prêmio do cinema e investe pesado para garantir “Roma” no Oscar 2019
Por Gabriela Mendonça | , iG São Paulo |
Não é de hoje o desejo da Netflix de se tornar um estúdio celebrado e dono da estatueta dourada do Oscar. O serviço, que virou referência e agora enfrenta uma nova fase com a ascensão de concorrentes, tem investido em quantidade e qualidade - com o objetivo de garantir que os conteúdos de qualidade sejam parte das conversas do período de premiação.
Entre as séries eles conseguiram certo reconhecimento, mas o grupo do cinema (leia-se: figurões da indústria) insiste em excluir o streaming da “brincadeira”. Muito já se debateu sobre se serviços como a Netflix devem ou não ser considerados para premiações, já que não são exibidos no cinema, e em 2018 o serviço deu sua cartada final tornando irresistível sua presença.
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Isso por que eles apostaram em Alfonso Cuarón que resgatou suas próprias memórias de infância para entregar o inspirado “Roma”. Um filme bastante pessoal, com uma estética específica, falado em espanhol e filmado em preto e branco não é uma aposta simples, mas foi o suficiente para que aqueles que descartavam o streaming o chamassem de volta na conversa.
E, assim como Leonardo Di Caprio por muito anos, eles querem esse Oscar sim senhor. Não à toa, a campanha de marketing envolvendo “Roma” é a mais cara da última década. De acordo com dados do The New York Times , a empresa já investiu cerca de US$ 20 milhões na campanha do longa, que venceu o Festival de Veneza depois de ficar de fora de Cannes. Só em um anúncio durante um jornalístico matinal na TV americana foram gastos US$ 170 mil.
Além disso, assim como todos os estúdios, o streaming tem feito diversos eventos para a indústria. Enquanto Brad Pitt promove “Se a Rua Beale Falasse” e John Krasinski reúne amigos famosos como Chris Pratt para garantir “Um Lugar Silencioso” na briga, “Roma” tem o apoio, entre outro famosos, de Charlize Theron e Angelina Jolie, além de Diego Luna, uma das estrelas de outro sucesso do diretor, “Y Tú Mama También”.
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Outras fontes da indústria dizem que o valor gasto pelo serviço é ainda maior, superando os US$ 25 milhões gastos por “A Rede Social” em 2010. Como presentes para os votantes, o estúdio apostou em um livro sobre o filme que custa cerca de US$ 175, acompanhado de uma carta escrita pela protagonista do filme, a estreante Yalitza Aparicio.
Os esforços (e o dinheiro) da Netflix incluíram ainda a contratação de Lisa Taback, uma das maiores estrategistas de premiações em Hollywood, que ganhou o cargo de vice-presidente de premiações. Toback tem vitórias como “Moonlight”, “O Discurso do Rei” e “Shakespeare Apaixonado” no currículo.
Os desafios de “Roma”
O filme de Alfonso Cuarón já colhe algumas vitórias, como Melhor Diretor e Melhor Filme em Língua Estrangeira no Globo de Ouro, além de quatro vitórias no Critics Choice Awards. O resultado é positivo para o filme, mas não significa muito para o Oscar, já que os votantes não são os mesmos. A crítica e os jornalistas (que votam nas premiações acima) são quase unânimes em seu amor pelo longa, mas a Academia é formada por membros da indústria que ainda não veem com bons olhos um streaming entre os peixes-grandes. Seja por medo, nostalgia ou o que for, os integrantes da academia não parecem tão inclinados assim a deixar o filme prosperar, não importa se ele é uma obra-prima ou uma produção esquecível. Ranço parece a palavra adequada para explicar a relação da indústria cinematográfica hollywoodiana com “Roma”. E a Netflix tem feito o que pode justamente para tirar esse gosto amargo.
Ranço vs. O filme do ano
Com ranço ou não, a indústria está certa em um aspecto: alguns filmes merecem a tela grande, e o longa de Cuarón é um desses. Ser exibido nos cinemas, aliás, é fator obrigatório para tornar um filme elegível ao Oscar, o que fez com que o streaming apostasse em uma curta temporada nos cinemas antes de chegar a plataforma.
Cuarón, que além de escrever, dirigir e produzir assume a fotografia, transformou uma história pessoal em um retrato de uma época, de um país e de conflitos sociais e, de fato, “Roma” é um grande filme. E o debate sobre TV vs. cinema segue sendo relevante justamente por conta das peculiaridade e do nível de originalidade do longa.
“Quantos cinemas você acha que passariam um filme mexicano, em preto e branco, falado em espanhol e mixteco, que é um drama sem grandes estrelas? Quão grande você acha que seria uma lançamento convencional?”, perguntou Cuarón ao falar com a imprensa depois de sua vitória no Globo de Ouro. Ele não está errado. No final de 2018, Barry Jenkins viu uma cópia pirata de “Moonlight” sendo vendida em um pequeno povoado mexicano e sua reação foi de comemoração, já que por outros meios talvez o filme nunca ficasse ao alcance dos 11 mil habitantes da região. Enquanto a indústria, aqui e ali, perpetua esse debate, cineastas seguem buscando formas de fazer acontecer suas criações, independentes do meio em que estejam disponíveis.
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“Roma” já é o favorito a Melhor Filme Estrangeiro, mas a Netflix quer mais e sua sede é evidente até demais. Mas, enquanto eles pensam alto e gastam seus milhões, os fãs de cinema ganham novas produções para apreciar e todo mundo sai ganhando.