Museu Nacional, “Pantera Negra” e mais: os fatos marcantes da cultura em 2018
Da vitória de Thanos a crise editorial brasileira, o ano foi cheio para a cultura, com muitos debates sociais e políticos. Relembre os fatos mais marcantes
O ano de 2018 foi marcante para a cultura, e talvez um divisor de águas na relação entre famosos e fãs. Entre as eleições no Brasil e a tragédia no Museu Nacional, vivemos grandes transformações culturais. Mas também tivemos muitas estreias no cinema, vimos surgir o primeiro filme da Marvel com chances reais de concorrer ao Oscar.
O ano foi intenso para a cultura , e nessa retrospectiva 2018 relembraremos os momentos mais marcantes, desde o triunfo de “A Forma da Água” no Oscar, passando pela dominação do streaming, até a cartada final de Thanos que abalou as estruturas dos heróis no cinema.
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Equilíbrio no Universo
A Marvel conseguiu, ao longo dos últimos 10 anos, estabelecer nos cinemas os filmes de heróis dos quadrinhos. Do começo tímido com um filme por ano, eles aumentaram e muito essa conta, chegando em 2018 com três filmes, um deles uma história original. E se Thanos (Josh Brolin) tentou equilibrar o Universo ao eliminar metade dos seres vivos em “Vingadores: Guerra Infinita”, “Pantera Negra” desfez esse equilíbrio ao superar todas as expectativas em sua estreia.
O filme de Ryan Coogler ultrapassou US$ 1 bilhão de arrecadação e se tornou a 10ª maior bilheteria do cinema. Lançado em fevereiro, o filme conseguiu manter o status até a temporada de premiação, e é o primeiro longa de super-heróis com chances reais de chegar ao Oscar indicado como Melhor Filme.
O ano teria ainda mais três estreias de heróis com “Homem Formiga e a Vespa”, "Deadpool 2" e “Aquaman”, sendo que o último foi um acerto da Warner/DC, que não tem tido resultados eficientes com filmes do gênero nos últimos anos.
Se nos cinemas os heróis estão com tudo, no streaming eles seguem o caminho oposto. Em 2018 as séries “Luke Cage”, “Punho de Ferro” e “O Demolidor” foram canceladas após suas respectivas temporadas estrearem. Embora os dois primeiros sejam mais fracos, esses produtos têm boa aceitação por parte do público e “Demolidor” particularmente fez uma temporada espetacular. Mas nem isso foi suficiente para a Netflix mantê-los no catálogo. Propriedade da Disney, os personagens da Marvel vão ganhar casa nova em 2019.
O estúdio do Mickey prepara o lançamento de seu próprio streaming e, embora esses personagens não devam aparecer em nenhuma produção original por enquanto, o cancelamento já é uma movimentação para a Disney manter seus heróis dentro de casa.
Por falar em Disney, a companhia foi responsável por uma das maiores transações comerciais da indústria do entretenimento, ao comprar a Fox por US$ 71 bilhões. Depois de um “namoro” durante alguns meses, a Fox aceitou a proposta do estúdio e será incorporada a ele nos próximos anos.
O fato é preocupante por um lado, tanto por conta da autonomia criativa da Fox, quanto da dominação da Disney na indústria, mas gera novas possibilidades ao colocar tantos nomes sobre um mesmo chapéu.
Também dona de outra grande franquia, Star Wars, o estúdio viu o primeiro fracasso desde que reviveu a história de George Lucas. Depois de problemas internos que culminaram na demissão dos diretores durante as gravações, eles estrearam “Han Solo: Uma História Star Wars”, que foi um fracasso de crítica, que já vinha dividida desde “Star Wars: Os Últimos Jedi”.
Briga acirrada
Embora a Netflix esteja abandonando seus heróis, a companhia teve um ótimo ano. Dominando a cultura pop, ela liderou caminho para um ano cheio de comédias românticas, gênero que voltou com força em 2018 e o principal responsável por isso foi “Para Todos os Garotos que Já Amei”. O filme, que foi o mais reassistido na plataforma, puxou uma fila de histórias novas, como “Podres de Ricos”, “Com Amor, Simon” e “Barraca do Beijo”, embora também seja responsável por “Sierra Burgess é uma Loser”, um dos piores filmes já feitos.
Outro fenômeno que dominou o ano foi “La Casa de Papel”. Enquanto “Game of Thrones” e “Stranger Things” ficaram de fora da programação neste ano, a série espanhola ganhou popularidade no Brasil e teve a segunda temporada exibida pelo streaming, que já garantiu o terceiro ano da produção.
Antes uma espécie de “locadora on-line”, a Netflix sofreu profundas transformações, motivadas pelo seu próprio sucesso. Além da Disney, outras empresas começaram a apostar no formato e, consequentemente, tiraram seu conteúdo de lá para colocar nos próprios canais. Sendo assim, 2018 viu o resultado de uma aposta alta da plataforma em produções autorais: foram cerca de 700 produtos, entre novas temporadas, séries inéditas, filmes, documentários, especiais e animações.
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Dentro dessa lista está “Roma”, novo filme de Alfonso Cuarón, aclamado pela crítica e centro da mesma polêmica que a Netflix vive anualmente: filmes devem estrear no cinema antes de chegar ao streaming? Em 2017 em Cannes houve uma discussão sobre se a plataforma deveria competir pela Palma de Ouro e neste ano o festival decidiu que não, justamente por não ter o fator “cinema”. Sendo assim, e buscando uma cobiçada vaga no Oscar, a plataforma exibiu “Roma” nos cinemas por cerca de duas semanas antes de chegar oficialmente na plataforma em 14 de dezembro.
Mas nem tudo são flores para a empresa de streaming. No Brasil, além dos competidores mencionados acima, eles enfrentarão uma batalha com a Globo. Neste ano a empresa carioca investiu pesado em sua plataforma digital, o Globoplay, apostando também em produções próprias, como “Ilha de Ferro” e “Assédio”. Conforme a Globo engrossa seu catálogo, ela se torna a maior competidora da Netflix no País.
Histórias originais
Os heróis podem até dominar as bilheterias, mas esse ano a produção cinematográfica contou com histórias originais de grandes diretores. A fantasia ganhou destaque e Guillermo Del Toro começou o ano premiado por “A Forma da Água”. Mas também vimos novos filmes de Spike Lee (“Infiltrado da Klan”), dos irmão Coen (“A Balada de Buster Scruggs” – também na Netflix) e de Lars Von Trier, que mais uma vez chocou o mundo, agora com a história de um serial killer em “A Casa que Jack Construiu”.
Em Cannes, o cineasta japonês Hirozaku Koreeda ganhou a Palma de Ouro pelo aclamado “Assunto de Família”. O júri deste ano teve mulheres em destaque, com Cate Blanchett, Kristen Stewart e Ava DuVernay, mas os filmes em competição ainda foram prioritariamente feitos por homens.
Cultura e política lado a lado
A política molda as nossas vidas e nos últimos anos tem tomado mais espaço nas conversas. Na cultura, claro, não seria diferente, e vimos em 2018 diversas movimentações políticas movidas pela arte. A Lei Rouanet, incentivo governamental criado pelo Ministério da Cultura para fomentar a produção cultural nacional, foi colocada em pauta, debatida, criticada e defendida ao longo do ano.
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Mais recentemente, ao ganhar um prêmio de “melhores do Ano”, Fernanda Montenegro fez um discurso defendendo a classe artística: “Nós somos de uma profissão digna, parte de uma cultura teatral milenar. Não é possível fazerem de nós, gente de palco, atores de TV e cinema - responsáveis pela derrocada econômica desse país. Não somos corruptos. Somos dignos", disse.
Mas antes dela, outros artistas fizeram manifestações políticas. Além do período eleitoral, que incentivou artistas a se manifestarem, vimos a classe artística mais engajada politicamente. Roger Waters, líder do Pink Floyd, fez turnê no Brasil e usou seus shows para criticar o então candidato Jair Bolsonaro. Durante sua primeira parada, em São Paulo, ele citou governantes fascistas pelo mundo e incluiu Bolsonaro na lista, gerando grande comoção a favor e contra e fazendo com que o músico fosse vaiado.
Nas apresentações que fez na sequência, ele “censurou” o nome do presidente, mas seguiu reproduzindo “Ele Não” no telão, inclusive às 22h do dia anterior à eleição, prazo a partir do qual ficava proibido se manifestar.
2018 também marcou os 50 anos do Maio de 1968, considerada uma das maiores manifestações sociais – e culturais- da contemporaneidade. Em dezembro também se completaram 50 anos do AI-5, ato institucional emitido durante a ditadura que estabeleceu censura prévia em todas as manifestações artísticas (entre outras coisas).
Tragédias e o que vem a seguir
O ano foi marcado por uma tragédia social e cultural que ainda não pode ser mensurada. O Museu Nacional do Rio de Janeiro foi completamente destruído por um incêndio, levando com o fogo artigos científicos e biológicos que contam a história da América Latina .
Embora muitos cientistas, antropólogos e estudiosos trabalhem incessantemente para recuperar o possível, cerca de 90% dos 20 milhões de itens no local se foram para sempre.
Além disso, este ano vimos grandes livrarias fecharem suas portas, colocando em questão o futuro da literatura e da produção editorial nacional. Em outubro a Livraria Cultura entrou com pedido de recuperação judicial, enquanto a Fnac fechou sua última loja no Brasil. Para completar, a Saraiva acumulou um saldo devedor de R$ 296 milhões no terceiro semestre do ano.
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Não foi um ano fácil para a cultura , e a tendência não é melhorar. Mas vimos o debate sair da classe artística e as produções culturais se tornaram uma das pautas que protagonizaram esse ano tão intenso.