Continuação de “Dorothy Tem Que Morrer” escrita pela americana Danielle Paige, “A Ascensão do Mal” é a segunda parte de uma trilogia que recria de uma forma contemporânea e obscura o universo encantado que todos conhecem através de “ O Mágico de Oz ”. Dessa vez Dorothy não é a protagonista da história, mas é a grande vilã que precisa ser derrotada por Amy Gumm, uma jovem comum com uma vida um tanto tediosa até que é transportada para o universo de Oz e se torna a grande esperança para derrubar sua governante tirânica.
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Reciclagem temática
Para quem gosta de versões alternativas de clássicos com um “dark twist” – como as incontáveis releituras sombrias de “Alice no País das Maravilhas” – “ A Ascensão do Mal ” pode ser interessante. A reconstrução do espaço físico de Oz de uma forma decrépita e caótica é, sobretudo para o público adolescente no qual a coleção mirou, é convincente: logo o leitor se sente ambientado dentro de um mundo que está desabando por causa de uma governante ditatorial que lhes tirou a liberdade. A “infusão” com tipos baseados na realidade é natural e contribui para a ponte entre Oz e os Estados Unidos.
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Voltado para “jovens adultos”, faixa que engloba o público entre 15 e 20 anos, a segunda parte da coleção de Danielle Paige é, basicamente, um drama adolescente com cara de fantasia – os pensamentos, pesares, amores e preocupações da protagonista Amy Gumm roubam a cena do que poderia ser uma releitura bem mais intensa de Oz. Mesmo que a luta contra Dorothy seja o propósito da jornada de Amy, seu romance com Nox acaba tomando proporções que ofuscam cenas com muito mais potencial.
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Chance perdida
Em um contexto onde vemos liberdades sendo tolhidas da população, direitos civis são postos em jogo a todo momento por governos autoritários e discursos de ódio ganhando força como nunca, a autora deixou escapar a oportunidade de trabalhar com uma alegoria para introduzir questões políticas tão delicadas para jovens a partir de uma história de fantasia – o que é, na verdade, uma ferramenta poderosa de transformação.
Dorothy é uma ditadora que abusou e destruiu seu reino em nome do poder, há povos sendo massacrados e a Ordem das Bruxas luta para depor seu governo e restaurar o posto de Ozma, legítima herdeira do trono. Com menos romance adolescente essas questões poderiam acrescentar muito mais profundidade para o livro nesses aspectos – sem tirar o mérito da história, afinal, a coleção da autora foi um sucesso de vendas e tem ótimas avaliações do público, mas seria um trabalho bem mais sofisticado trazer alegorias políticas para a obra.
Formato questionável
Tudo em “A Ascensão do Mal” é demasiadamente óbvio. Não há espaço para o leitor preencher a partir do seu próprio entendimento ou implantar questões que ultrapassem a primeira camada textual do livro – tudo que é relevante (e até irrelevante) é entregue “de bandeja” para o público com fartas e excessivas descrições que são, além de tudo, bastante previsíveis. Por ser narrado em primeira pessoa pela sua heroína deveria haver muito mais dúvida sobre a veracidade dos fatos, mas ao invés disso há quase uma onisciência que acaba com brechas que seriam muito mais proveitosas para o leitor.