Literatura é considerada uma das mais altas formas de cultura, entretanto, seus maiores cânones ainda estão ligados à figura masculina. Em um momento em que tanto se fala na questão da representatividade, autoras mulheres ainda não são a primeira opção para a maioria das pessoas. Enquanto há centenas de homens considerados como notáveis nessa área, quantas mulheres são consideradas pilares da literatura? Quando se propõe, ainda, uma intersecção com a sexualidade a figura torna-se ainda mais defasada. Onde estão as autoras lésbicas da literatura?
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Reflexão e representatividade
A invisibilidade das autoras lésbicas se manifesta em duas faces: ou seu trabalho por serem de mulheres ou sua sexualidade foi ocultada, como é o caso de Virginia Woolf, escritora inglesa que teve seus principais trabalhos publicados durante a década de 1920. “Lesbianidade era algo visto com tal desprezo que ela teve que reprimir isso por muito tempo”, comenta Beatriz Canale, leitora da obra de Woolf. Para Tainá Oliveira, o principal ponto que lhe fascina nos trabalhos da inglesa é que, mesmo em um meio hostil, a autora tinha na literatura um refúgio para seus sentimentos. “Eu a admiro pela resistência que foi necessária em sua própria vida particular enquanto mulher e lésbica”, disse.
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Ao longo dos anos diversas autoras se abriram sobre sua sexualidade e transformaram vivencias pessoais em obras escritas que tocaram outras mulheres que, assim como elas, tiveram de enfrentar o que é ser homossexual em um ambiente que ainda lhes é hostil. Lídia Bizio ressalta esse caráter presente no quadrinho “Você É Minha Mãe?” de Alison Bechdel, que aborda o conflito entre a autora e sua família que tem dificuldades em aceitá-la. “Ela faz uma grande reflexão sobre o que é ser lésbica na nossa sociedade [...] uma lésbica lendo esse livro pode se perguntar ‘qual o meu papel na sociedade? Qual a minha relação com meus progenitores?’”.
Em um universo heteronormativo em que as narrativas dificilmente contemplam o amor entre duas mulheres, o casal de autoras lésbicas brasileiras Karla Lima e Pia Pêra também converteram suas experiências como casal em romances que por mais simples que pareçam tem um grande impacto para as mulheres que os leem, como aponta Thayanne Martins, leitora dos livros do casal. “Me sinto bem representada porque não força a ideia, como se fossemos totalmente diferentes [...] me vejo bastante nelas e a gente acaba vivendo a histórias delas”, conta sobre sua visão.
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A visibilidade da literatura feminina está sendo a cada dia mais debatida como reflexo da efervescência do feminismo, mas, mesmo assim, o trabalho das autoras lésbicas nesse ambiente continua relegado ao segundo plano – e, como para qualquer outro tópico, a representatividade é fundamental. “Virginia Woolf, com certeza, inspirou muitas gerações de lésbicas perdidas que não encontravam qualquer referência na literatura – e eu fui uma delas”, encerra Beatriz Canale.