Foi em 1967 que Gabriel Garcia Márquez conclui o livro que transformaria sua carreira. Morando no México com a esposa Mercedes Barcha, Gabo apostou todas as suas fichas (e seu dinheiro) em “100 anos de Solidão”. Passou 18 meses escrevendo o livro que mudaria sua vida, lhe daria um Nobel de Literatura e criaria o movimento conhecido como realismo mágico .
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Em 2017, o livro completa 50 e sua leitura continua impressionante, surpreendente e atual. “ Cem Anos de Solidão ” é um desses livros que se movem tão lentamente quanto às horas de uma tarde quente de verão. Cada palavra disposta nas páginas escritas por Gabo têm um propósito: um ritmo. Cem anos não são um piscar de olhos e, por isso, toda a estrutura do livro colabora para a criação dessa atmosfera densa e viscosa que envolve os personagens em ações em câmera lenta. Esse não é um romance pequeno, longe disso, são centenas de páginas com infinitos amontoados de letras que dificilmente seriam lidos rapidamente – mas essa era, provavelmente, justamente a proposta de Márquez.
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A narrativa de “Cem Anos de Solidão” é arrastada – e seria falta de tato com esse universo classificar isso como crítica, quando, na realidade, é um dos pontos mais sutis que foram trabalhados pelo autor. O romance desenrola-se não no tempo histórico, mas no tempo da memória e da fruição de suas passagens. Enquanto as palavras dão as cores terrosas de Macondo , a narrativa dá sua forma. São necessários pelo menos algumas semanas, ou até meses para dar conta de “Cem Anos de Solidão” e isso faz parte de sua proposta: é preciso se envolver com o romance e tornar-se parte de sua história.
Histórias na história
E é justamente esse tempo que permite o leque de histórias e personagens propostos por Gabo. Retratar 100 anos na história de uma família é muito complexo. Entre comentar a vida pessoal, amorosa e profissional das personagens, ao mesmo tempo que representa o vilarejo em que eles estão inseridos, abre margem para uma série de novas histórias. “Cem Anos de Solidão” conta a história da família Buendía, sim, mas essa é feita por uma série de recortes, ligados uns aos outros pelo sangue.
Cada membro da família tem seu momento nos holofotes, e cada um deles tem personalidades distintas. Verdade que alguns (principalmente os de mesmo nome) tem características parecidas. E verdade que muitos deles têm em comum a solidão. Mas ainda assim, conhecemos sobre José Arcadio Buendía (da segunda geração), que foge com os ciganos e retorna muitos anos depois, Rebeca e seu saco com os ossos do pai e até mesmo Melquíades, amigo do patriarca José Arcadio Buendía, responsável pela profecia que cairia sobre a família. Essas pessoas estão conectadas, mas distanciadas ao mesmo tempo. Ao longo de 100 anos e mais de 400 páginas, conhecemos personagens tão distintos mas também aprofundados. É como se fosse uma coleção de pequenas histórias dentro de uma só.
Retrato Latino-Americano
Muitas análises já foram feitas ao longos dos 50 anos desde que “ Cem Anos de Solidão ” foi lançado, sobre a representação de Gabriel Garcia Márquez da América Latina. Macondo, um vilarejo isolado de tudo, representa justamente esse pedaço da América que parece “parado no meio”, nem pobre nem rico, nem atrasado, mas longe do progresso. Guerras, coronéis, religião, nesse pequeno fim de mundo, todos esses aspectos são retratados de maneira realística, somado sempre, é claro, ao mágico que acompanha o escritor por toda a sua carreira.
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