
Fina Estampa de Caetano completou, recentemente, 30 anos de lançamento. Passado esse tempo, não há como não o comparar a um bom vinho, pois o tempo acabou apurando o seu sabor e fazendo aflorar seu buquê.
Lançado em 1994 pela gravadora Polygram, hoje Universal Music , esse disco está entre os mais belos que o cantor e compositor baiano já fez. O sucesso na época foi tanto, que até rendeu uma versão ao vivo, em 1995, acrescido de outras faixas que não faziam parte da obra de estúdio.
Sobre o disco
Em geral, quando artistas brasileiros lançam um disco direcionado ao mercado latino-americano, costumam fazer versões de suas músicas e gravá-las em espanhol. Caetano Veloso preferiu fazer totalmente diferente, selecionando músicas que falavam diretamente a seu coração, ouvidas na infância e adolescência vividas em sua baiana Santo Amaro, canções originárias de Cuba, México, Porto Rico, Argentina e Paraguai. À época ele acrescentou que essas músicas não deixam de ser dele também, pois “estão ligadas a recordações de família e de amizade que me dão uma espécie de direito sobre elas – e sem dúvida lhes dão um imenso poder sobre mim”.
Seleção
Muitas das músicas escolhidas por Caetano fazem parte do que poderíamos chamar de clássicos populares da música latina , várias delas dos anos 40 e 50 no século passado, como “Rumba azul”, “Capullito de alelí”, “Contigo en la distancia”, “Lamento borincano” e “María bonita”, entre outras. Merece destaque a gravação da guarânia “ Recuerdos de Ypacarai ”, de Demetrio Oritz e Zulema de Mirkin, canção que é considerada por alguns uma música brega, mas que na releitura feita por Caetano ganhou outra dimensão, cheia de delicadeza, explorando sutilmente toda a sua beleza.

O título
Caetano explicou, na época, de uma forma bastante poética, o porquê do nome Fina Estampa dado para o disco. Essa música, composta pela peruana Chabuca Granda, sempre despertou no cantor um certo fascínio, “por ser, à primeira vista, uma canção feita por uma mulher sobre um homem à maneira das canções feitas por homens sobre mulheres”. Ainda dentro de sua leitura poética, partindo dos versos “Cuando por esa vereda/ Tu fina estampa pasea”, ele aprofunda a sua análise, desta forma:
Mas o fato é que, como a palavra “vereda” em português só é usada para designar uma trilha no mato e nunca uma rua ou estrada urbana, esse deslumbrante “cavalheiro” (ou cavaleiro?), que se esconde e exibe o sorriso por sobre um chapéu, sempre me apareceu uma visão de Oxóssi, o orixá da religião afro-baiana a que dizem que pertenço e de quem, portanto, teria as características. Desse modo, “ Fina Estampa ” me parece o título certo para um disco tão requintado e delicadamente orquestrado por Jaques Morelenbaum – e em que canto com tanto cuidado – ao mesmo tempo que funciona como uma referência a um eu meu bonito, representado na figura do orixá entrevisto nas palavras da valsa de Chabuca.
Fica aqui o convite para quem ainda não ouviu Fina Estampa , seja na versão de estúdio ou ao vivo, fazer essa audição, com certeza não se arrependerá, pois essa é uma das melhores obras de Caetano Veloso . E quem já a conhece, aproveite para ouvir novamente e se deliciar com suas lindas músicas.
Esta coluna é um espaço destinado à cultura e músicas latinas. Mais informações sobre esses temas você encontra em www.ondalatina.com.br e o Canal Onda Latina: https://www.youtube.com/@canalondalatina