Serginho Groisman: “Aposentar é uma coisa inimaginável"

O apresentador fala sobre seus 23 anos na TV, como a vez em que puxou o cabelo de Silvio Santos, e lamenta a despedida de Ronaldo

Esqueça aquele apresentador agitado que corre de um lado para o outro no centro do estúdio, indagando “Quem tem pergunta? Quem tem pergunta?”, e logo dá a voz para o jovem entrevistado com o bordão “Fala, Garoto!”. Longe das câmeras, Sergio Groisman não tem toda aquela agitação. Ao menos visível aos olhos. Dono de uma voz baixa, fala pausada e tranquilidade corporal, Serginho tem sim é uma inquietação mental. Está sempre em busca de conhecimento. “Tenho que estar sempre bem informado. Eu acho que, às vezes, o meu defeito é não estar tão bem informado quanto eu precisaria para conversar direito com as pessoas”, afirma o apresentador do programa "Altas Horas", da Rede Globo, aos surpreendentes 60 anos de idade.

Foto: Claudio Augusto
Depois mais de duas décadas de entrevistas, Serginho diz que ainda deseja receber Chico Buarque, João Gilberto e Roberto Carlos em seu programa

Serginho só altera o tom de voz quando fala de futebol. Principalmente, quando seu time do coração, o Corinthians, está envolvido no assunto. Na semana em que Ronaldo anunciou sua aposentadoria, não escondeu a decepção. “Fiquei triste porque ele saiu nesse momento que alguns caras foram lá, em nome de uma torcida, mas nunca foi em meu nome. Não me senti representado”, lamentou.

Seu programa vai ao ar nas madrugadas de sábado. Mas o apresentador é visto no prédio da emissora, em São Paulo, de segunda à sexta-feira. Ele comanda toda a produção direto de sua sala repleta de porta-retratos, canecas, quadros de diferentes momentos de sua carreira e presentes recebidos de entrevistados, como um violão. Serginho folga aos finais de semana, quando não está viajando a trabalho. Mas no horário da atração, acompanha tudo também pelo Twitter.

Além do "Altas Horas", comanda o “Ação”, também na Globo; o “Tempos de Escola”, na TV Futura; e o “Alô, Brasil”, que entra no lugar dos comerciais para TV via satélite. “E vou fazendo outras coisas na vida também. Nunca fico só fazendo televisão ou só assistindo televisão”, esclarece.

O filme “Fiel” e o livro sobre “Meu Pequeno Corintiano” fazem parte desses projetos. “Ainda vendo esse livro, ganho uns R$ 400 de royalties pelas vendas”, comentou. E com seus bordões que o acompanham em todas as emissoras, também fatura alguma coisa? A resposta vem com uma risada e uma história. Em tempo de SBT, o apresentador sugeriu a Silvio Santos que o nome do programa fosse “Fala, Garoto”, o que foi negado pelo patrão. “Ele falou: ‘não! Vai ser Força. Jovem’. E eu disse que parecia torcida organizada. Daí lembrei que, quando eu ia ao cinema, por causa da censura, tinha um selo antes de começar o filme escrito “Programa Livre”. Dei esse nome por causa disso. E o ‘Fala, Garoto’, o Silvio sabiamente, pegou e registrou para o SBT. Nunca poderei ter um programa com esse nome”.

"As conversas com o Silvio (Santos) sempre foram maravilhosas. E a primeira já foi essa: puxa meu cabelo, senta aí e vamos conversar"

Confira o bate-papo completo com Serginho Groisman:

Foto: Claudio Augusto
Entre os prêmios e os presentes recebidos de entrevistados, como o violão que ganhou do cantor Edson e da banda Barra de Saia, que decoram sua sala na Globo

iG: A que você atribui o sucesso da fórmula de seu programa que tem dado certo há tantos anos?
Serginho Groisman: Primeiro, a ficar um pouco invisível no programa. Não faço questão de estar presente toda hora, tanto é que divido a apresentação com a plateia. Isso vem de uma ideia ainda da universidade, que eu ficava pensando em como democratizar a televisão, como fazer com que o público  possa vir ao programa e interferir. Respeito a opinião do espectador que vem aqui. Em segundo lugar, tenho uma equipe que está há muito tempo comigo e a gente sempre está preocupado com a questão cultural, onde misturo o que é mais popular com o que as pessoas não conhecem; além de conversar sobre o que está acontecendo no mundo. E também adorar muito o que faço. Estou há tanto tempo na televisão, mas eu me emociono quando vejo um cara que gosto, poder estar a um palmo dele e ver ele cantar. Eu sou muito fã de muita gente que trago aqui. Tenho  prazer com isso, que começou lá no (colégio) Equipe.

iG: Como foi esse início?
Serginho Groisman:
Quando entrei na escola, já comecei a passar uns filmes no centro acadêmico. Depois, fui para o colégio Equipe, fazer cursinho. Foi nos anos 1970, uma época que estava muito difícil para a cultura brasileira. E aí, lá tinha um teatro e tinha uma quadra grande. Os artistas começaram a ir para lá fazer show, coisa que eles não podiam fazer em outro lugar. Ali passou todo mundo. O Caetano (Veloso), (Gilberto) Gil, Clementina, Raul Seixas, Novos Baianos... Aí eu comecei a ter amizade com essas pessoas. Eu apresentava os eventos, comecei a ter contato com os ídolos da minha vida. Poder pegar o Caetano no meu fusca para levar do hotel pra o show era o máximo.

iG: Você vai fazer 61 anos. Em algum momento você se sente velho, pensa em se aposentar?
Serginho Groisman: Acho que a pessoa que pensa em se aposentar é porque já começa trabalhando com o que não gosta. Não é só televisão. Qualquer pessoa que trabalhe, tem que buscar o prazer no trabalho. O trabalho faz parte da minha vida. Aposentar, para mim, é uma coisa inimaginável.

iG: Quer ser como a Hebe, que comentou recentemente que quer 'morrer no ar'...
Serginho Groisman : Não é só para a televisão, é para a vida inteira. Sou jornalista, se eu parar de fazer televisão, não vou parar de trabalhar. Não consigo me imaginar sentado em casa vendo o tempo passar.

iG: E se imagina longe das telinhas?
Serginho Groisman: Enquanto as pessoas gostarem do que eu faço, estarei fazendo o que gosto, do jeito que gosto. Tenho uma liberdade e um prazer absurdos. Dirijo meus programas há muitos anos. Venho aqui, cuido de tudo, tenho essa energia para fazer isso.

Foto: Claudio Augusto
Sou jornalista, se eu parar de fazer televisão, não vou parar de trabalhar. Não consigo me imaginar sentado em casa vendo o tempo passar
“Eu apresentava os eventos e comecei a ter contato com os ídolos da minha vida. Poder pegar o Caetano (Veloso) no meu fusca para levar do hotel pra o show era o máximo”

iG: O que você assiste na TV?
Serginho Groisman: Não sou muito fiel à televisão. Vejo futebol, porque adoro meu time, o Corinthians. Gosto de ver jornalismo também. Agora, não sou fiel a novelas, programas. Sou infiel com a televisão. (risos)

iG: Que entrevista mais te marcou?
Serginho Groisman:   Já tiveram entrevistas muito fortes. Mas acredito que o que me marcou muito foi quando fiz um programa ao vivo da casa de detenção aqui de São Paulo, no Carandiru, que não existe mais. A gente fez uma eleição entre os detentos e eles elegeram a Sula Miranda pra cantar. Aquele programa foi dividido em três partes: na primeira eu conversava com eles sobre o que acontecia lá dentro, na segunda eles ouviram a Sula Miranda e na terceira eles entrevistaram o diretor. Eles começaram a reclamar do jeito que a família era tratada, de como muita gente estava lá e já tinha cumprido pena, muitas reclamações. Alguns meses depois, aconteceu aquela invasão no Carandiru, quando morreu muita gente que participou desse programa. Então isso me marcou muito, por ser uma coisa muito maluca. Maluca no sentido de ser muito inédito, você fazer um programa com dois mil e tantos detentos ao vivo, conversando com eles. Foi maravilhoso para mim.

Foto: Claudio Augusto
Fazer um programa com dois mil e tantos detentos ao vivo, foi maravilhoso para mim

iG: Tem alguém que você ainda não conseguiu entrevistar?
Serginho Groisman: Ah, tem. O Chico Buarque , por exemplo. O João Gilberto , que eu gostaria que viesse aqui. Roberto Carlos não veio. O cantor, né? O jogador também não veio. Tem muita gente.

iG: Qual foi a maior saia-justa que passou no ar?
Serginho Groisman: Eu troco muito nome. Às vezes, se vocês notarem eu falo “estamos aqui voltando com o Lobão, a “oshibrin” (diz alguma palavra sem sentido), e o...”. Falo assim baixinho, sério. Tenho umas panes de memória. A vida inteira foi assim com nomes, com rostos. Eu me enrolo muito. Lembro até que no SBT eu troquei o nome da Elza Soares pelo da Ângela Maria . Chamei Paulo Gracindo em vez de Paulo Silvino . Já tive saias-justas de ter que contornar algumas perguntas. Já pediram para a Roberta Close falar como fez para cortar o “bilau” dela. Já teve um programa que foi gravado, a gente tava falando sobre strippers. Aí uma menina desceu e pediu para fazer um strip. Ela ficou pelada. Totalmente nua.

iG: De onde veio essa ideia, essa vontade de trabalhar com adolescentes?
Serginho Groisman: É um programa feito com adolescentes, mas é um programa adulto. Eu tinha um programa de rádio, chamado “Matéria Prima”, de quatro horas por dia, em que já trazia escolas. Essa é uma idade em que as pessoas não têm ainda muito compromisso nem com família nem com patrão, então elas fazem perguntas que muitos jornalistas gostariam de fazer, mas não fazem por uma série de questões. Esse adolescente levanta, faz a pergunta que está na cabeça dele. O inesperado tem um pouco a ver com essa idade. Ter a plateia desencanada de vínculos, faz ela ser mais livre. Claro que também tem a coisa da energia, é uma plateia bonita.

iG: O entrevistado é preparado para esse inusitado? Porque muitas vezes o convidado pode não querer falar sobre determinado assunto
Serginho Groisman: Não posso chegar para a plateia e falar: “olha, pediram para não falar isso”. Vai surtir o efeito exatamente contrário. Só vão perguntar daquilo. Não tem como combinar qualquer coisa com a plateia. Então, o entrevistado sabe. Não posso citar nomes, mas durante esse tempo tiveram algumas pessoas que não vieram porque sabem que não posso limitar.

Foto: Serginho Groisman
Serginho Groisman brinca em estúdio de gravações

iG: Como é o assédio na rua?
Serginho Groisman: Acho que a palavra nem é assédio. As pessoas que me param nas ruas são muito gentis. Claro que, como todo mundo, às vezes você está com pressa, distraído, focado em outra coisa. Não dá para parar toda hora e a todo o momento. De um modo geral, é uma coisa mais de fotografia. Autógrafo, não. Acabaram. Hoje as pessoas têm celular com foto. Precisa ter paciência, mas não mudei minha vida nunca por causa disso.

iG: Onde você costuma sair, curtir, quando não está trabalhando?
Serginho Groisman: Sou o estereótipo do paulistano: cinema, jantar, show, teatro. Sou um paulistano daqueles que a praia é o parque. Gosto de ver o Corinthians, vou ao estádio quando dá. Gosto de viajar bastante, a Globo me deu essa possibilidade. Adoro fazer isso, trabalhar unindo prazer.

iG: G ostaria de mudar de horário, se pudesse?
Serginho Groisman: Essa proposta foi minha. Quando cheguei aqui, não tinha a mínima ideia de como seria. Tanto é que o Silvio Santos falou “você não vai dar certo lá!”. Bolei essa ideia da madrugada, pensei em um programa ao vivo de quatro horas, mas ia ser uma loucura. Daí, pensei em um programa gravado, senão as pessoas iam cansar muito. Sempre nesse horário, meia-noite e meia, uma hora. Só que a grade da Globo é uma sanfona. Quando tem Big Brother, por exemplo, começa 01h30. Não tenho muita reclamação, não. Claro que eu gostaria eu começasse um pouco mais cedo, mas que não saísse da madrugada.

Foto: Reprodução / Divulgação
Serginho Groisman começou a carreira na TV com o programa 'Matéria Prima', da TV Cultura. Depois passou para o 'Programa Livre', do SBT

iG: Como foi trocar de emissora depois de tantos anos no SBT?
Serginho Groisman:
Não tenho nenhuma ambição de sair do lugar que estou trabalhando. Procuro trabalhar com o máximo de prazer e fico achando que nunca vou sair do lugar onde eu estou. Só na  Gazeta eu não achava que ia ficar a vida inteira, porque era um pouco difícil ali, mas eu estava adorando. Quando fui para a TV Cultura,  achei que ali eu ficaria minha vida inteira. Daí o Silvio Santos me chamou por telefone e eu fui lá falar com ele. Fui só para ouvir, não fui nem pensando que eu iria para o SBT. Daí fiquei frente a frente com ele, em uma conversa que não conseguia ir pra frente porque eu olhava para o cabelo dele, não prestava atenção em nada do que ele falava. Aí ele perguntou: “E aí?”. E eu: "Desculpa, só consegui prestar atenção no seu cabelo”. O Silvio pediu para eu ir lá e puxar o cabelo dele. As conversas com ele sempre foram maravilhosas. E a primeira já foi essa: puxa meu cabelo, senta aí e vamos conversar. Fui lá, fiquei oito anos, e achava que ia ficar a vida inteira, até que alguém me ligou daqui. E eu estou aqui.

“Fiquei triste porque o Ronaldo saiu nesse momento que alguns caras foram lá, em nome de uma torcida. Não me senti representado”

iG: Você tem vontade de ter um programa com outro formato?
Serginho Groisman: Penso muito em ter um programa onde eu possa entrevistar as pessoas porque eu divido as entrevistas com a garotada no “Altas Horas”. Então tenho uma ideia de fazer, no canal a cabo, outras entrevistas. Gosto de fazer com o auditório também porque você tem uma resposta do que o público de casa. Meu termômetro é a plateia porque ela é livre. Não tem uma pessoa que fala “aplaude, ri”. Eles fazem isso se quiserem. E quando não gostam, não gostam.

iG: O que você acha que faz melhor e o que você acha que não faz tão bem
Serginho Groisman: É muito difícil chegar e falar “olha, eu acho que sou bom, sou lindo, alto e forte, conquisto todo mundo só com meu olhar” (risos). Procuro ser esforçado. Uma característica que acho que é boa é não parar de me informar. Tenho que estar sempre bem informado. Eu acho que, às vezes, o meu defeito é não estar tão bem informado quanto eu precisaria para conversar direito com as pessoas.

"Estou há tanto tempo na televisão, mas me emociono quando vejo um cara que gosto e poder estar a um palmo dele"



iG: Como corintiano, o que achou da aposentadoria do Ronaldo?
Serginho Groisman:
Fiquei bem triste. Vários jornalistas de esporte falam “a torcida do Corinthians não quer mais Ronaldo”, por exemplo. E é sobre aqueles caras, que não entendo o que fazem durante o dia, vão para um centro de treinamento para xingar jogador do time deles, para querer agredir, dar porrada em carros, ficar com umas faixas lá e daí começar a perseguir o jogador. Não consigo entender quem é esse tipo de torcedor que tem em todos os times. Fiquei triste porque o Ronaldo saiu – diz ele que não tem a ver –, mas saiu nesse momento que alguns caras foram lá, falaram que ele tinha que sair, em nome de uma torcida, mas nunca foi em meu nome. Não me senti representado lá.

Foto: Claudio Augusto
Serginho Groisman acompanha o programa pelo Twitter para saber a opinião das pessoas

Link deste artigo: https://gente.ig.com.br/serginho-groisman-aposentar-e-uma-coisa-inimaginavel/n1238084866047.html