As declarações de Lucrécia Martel, dizendo na quarta-feira (27) que se sentia incomodada com a presença do novo filme de Roman Polanski no Festival de Veneza , criaram uma saia justa no Lido. Nesta quinta, os produtores de "J'accuse" ameaçaram tirar o longa da seleção se a cineasta argentina, presidente do júri oficial, não se retratasse.
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Em resposta, Martel divulgou uma nota esclarecendo seus comentários e observando que suas "palavras foram profundamente incompreendidas". Algumas reportagens em espanhol e italiano alegaram falsamente que ela não assistiria ao filme. Na nota, ela reiterou que não separa o trabalho do autor, mas acredita que o filme de Polanski deve estar em competição.
Chamando o esclarecimento de Martel de um "pedido de desculpas", os produtores do filme anunciaram depois que o filme permaneceria em competição. "J'accuse" conta a história do notório caso antissemita Dreyfus na França, em 1894, quando um oficial francês judeu foi injustamente condenado por traição e sentenciado à prisão perpétua.
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O próprio Polanski, que continua sendo um fugitivo da justiça dos EUA, não viajará para Veneza para a sessão do filme nesta sexta (30).
Na quarta-feira, em sua entrevista à imprensa como presidente do júri, Martel disse que apoiava a decisão de incluir o filme de Polanski na competição de Veneza, mas não comprou o argumento, apresentado pelo festival e pelos apoiadores de Polanski, de que os filmes do diretor devem ser julgados à parte da discussão de sua prisão em 1977 por drogar e estuprar uma garota de 13 anos.
"Eu não divido os artistas de suas obras de arte. Acho que aspectos importantes sobre a obra de arte emergem do homem. Mas também acho que sua obra merece uma oportunidade por causa das reflexões que levanta", disse Martel.
Ela acrescentou que assistiria a "J'accuse", mas não participaria da sessão de gala do filme na noite de sexta, pois não queria "parabenizar" Polanski ou ofender as vítimas de agressão sexual.
Vários movimentos feministas protestaram contra a participação de Polanski e a baixa seleção de filmes dirigidos por mulheres, com apenas duas obras em competição.
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Já o diretor do festival, Alberto Barbera, defendeu a inclusão do último trabalho do cineasta como uma "obra-prima", uma reconstrução "extraordinária" de um evento histórico.
"Eu não sou um juiz que deve se expressar com base em critérios e princípios da justiça, se ele deve ir, ou não, para a prisão. Sou um crítico de cinema que deve decidir se um filme merece, ou não, participar de uma competição. Foi isso que eu fiz. Meu trabalho termina aí ", afirmou.