“Minha Fama de Mau” faz retrato bonzinho de Erasmo Carlos
Filme toma liberdades para relembrar história do Tremendão, e triunfa com ótimas atuações de Chay Suede e Gabriel Leone; leia a crítica do iG Gente
Por Gabriela Mendonça |
Um dos maiores nomes da Jovem Guarda e responsável por popularizar o rock no Brasil, a história de Erasmo Carlos foi transformada em biografia pelo próprio, e agora ganhou as telonas com “Minha Fama de Mau”, de Lui Farias.
Um Chay Suede mais novo, com 22 anos, teve a missão de dar vida ao charmoso e talentoso cantor, que antes de tentar a chance na carreira artística vivia de roubar canos e outras coisas que pudessem render um dinheiro. É assim que começa “Minha Fama de Mau”, quando Erasmo quase é preso em um desses roubos ao lado dos amigos.
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Enquanto vemos Erasmo Carlos já famoso narrar as cenas, a história do Tremendão se desenrola quando ele vive com a mãe em uma pensão na Tijuca. Encantado com nomes que despontavam no rock americano como Elvis Presley e Bobby Darin, Erasmo tinha charme de sobra e algum talento, mas foi seu encontro com Roberto Carlos (Gabriel Leone) que o colocou, de fato, no mundo artístico.
Ou pelo menos é isso que o filme quer que o espectador acredite. O longa toma algumas liberdades criativas, mudando algumas datas e recontando alguns fatos por conta própria, resultando, de certa forma, em um longa “chapa-branca”. Mas esse fato não chega a atrapalhar já que, desde o começo, fica evidente que a inspiração em Erasmo não tem amarras. Suede, por exemplo, se preocupa menos em mimicar o artista do que fazer sua própria versão, assim como fazem Leone e Malu Rodrigues, que vive Vanderléia.
Seja a pedido de Farias ou por conta própria, a solução dá certo, considerando que os três artistas continuam na ativa e no imaginário dos fãs. Chay Suede fica mais confortável em inventar seu próprio Erasmo do que seguir um caminho específico e esse é um dos pontos altos do filme.
Outro é a relação com Roberto, também muito bem adaptado por Gabriel. Os dois atores, destaques da nova geração, criam sua própria versão de como seriam esses dois artistas convivendo e escrevendo juntos músicas como Parei na Contramão e Eu Sou Terrível .
Memória
Lui é filho de Roberto Farias, cineasta que, entre outras coisas, dirigiu Roberto Carlos em três filmes entre os anos 60 e 70. As lembranças de infância de Roberto e da Jovem Guarda claramente permaneceram na memória de Lui, que faz um retrato carinhoso desses personagens icônicos da música nacional.
Esse carinho, porém, se reflete em personagens muito bonzinhos. Os dois selam uma disputa velada por Vanderléia, mas nada chega a se concretizar. Pequenas discussões e até críticas a Erasmo passam como um flash, dando lugar a bondade da relação da dupla.
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Vanderléia também é desperdiçada e não temos chance de admirar a atuação de Malu, que fica relegada as músicas, domínio que ela tem de sobra dada sua experiência em musicais.
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Minha fama de não tão mau
Erasmo tem suas crises. A carreira sofreu um baque quando o programa da Jovem Guarda não prosperou após a saída de Roberto, e ele acaba cedendo a apresentações em barzinhos até que o próprio Roberto vem salvá-lo, mas esses pontos não são cruciais para o filme, que segue seu norte pela música.
Há, logo no começo, uma tentativa de Lui de inovar na estética, o que acaba deixando o filme confuso, cheio de referências que parecem apressadas. Incialmente parece que veremos um filme com muitas informações bagunçadas sem nenhum propósito, mas eventualmente Farias consegue dosar as narrações com as transições que demonstram passagem de tempo e lá pelos 15 minutos coloca o longa em ordem.
A partir daí ele abusa do principal ingrediente que faz, no fim das contas, com que “Minha Fama de Mau” seja tão gostoso de assistir: a nostalgia. Seja para quem cresceu ouvindo essas músicas, quem as recebeu de herança dos pais ou as ouviu em versões mais novas, o filme é recheado de canções emblemáticas que te fazem querer cantar junto, como se fizesse parte de um show caótico e barulhento, encoberto pelas vozes das tantas meninas apaixonadas que seguiam os dois.
Roubando a cena
Se Vanderléia é relegada a uma coadjuvante, Bianca Comparato é alçada a protagonista. No filme ela vive várias mulheres, um retrato dos tantos amores de Erasmo ao longo da juventude até encontrar Narinha, seu grande amor, mãe de seus filhos e musa inspiradora. É fácil entender por que Bianca é uma atriz excepcional. Com pouco tempo de tela, ela se transforma várias vezes e domina a cena a cada aparição.
Mas ela não é a única que rouba a cena. Vinícius Alexandre vive um jovem Tim Maia, que foi amigo de Erasmo desde a infância. O menino, que nunca tinha atuado antes do longa, é responsável por uma das cenas mais bonitas, enquanto está compondo uma música. Até Bruno de Luca, que há tempos já deixou de ser lembrado por sua atuação, faz um divertido Carlos Imperial.
Não espere uma biografia dessas densas, cheias de conflitos e apoiada no drama no filme de Erasmo. Não é a isso que o filme se propõe. Ao contrário de um “Bohemian Rhapsody”, pretensioso ao tentar contar uma história grandiosa, Farias pega um pedaço, um trecho, um capítulo da vida de Erasmo e o transforma em uma crônica divertida e emocionante.
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“ Minha Fama de Mau ” pode não ser fiel ao passado dos grandes nomes da Jovem Guarda, mas é a memória da música e do importante papel de Erasmo e Roberto Carlos nisso.