Com peculiar senso de humor britânico, "A Festa" ri dos conflitos da burguesia

Drama inglês tem forte vertente filosófica e ótimos atores como Kristin Scott Thomas, Cillian Murphy e Patrícia Clarkson em performances inspiradas

Janet ( Kristin Scott Thomas ) alcançou o pico de sua carreira na política. Ela acaba de ser alçada ao posto de ministra da Saúde da Inglaterra e chamou alguns de seus amigos mais próximos para uma pequena comemoração em sua casa. Esse é o ponto de partida de “A Festa”, portentoso e visceral filme de Sally Potter (“Ginger & Rosa”), que em uma crescente entusiasmante vai demolindo fachadas à medida que as amenidades dão lugar à tensão.

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Cena de A Festa, que estreia nesta quinta-feira (26), nos cinemas brasileiros
Foto: Divulgação
Cena de A Festa, que estreia nesta quinta-feira (26), nos cinemas brasileiros

Rodado no estilo de uma peça de um só ato, “A Festa” se escora na linguagem teatral, e no talento de seus atores, para observar o microcosmo de uma burguesia imersa em problemas existenciais. A ação se concentra nos diálogos e a cada verdade descortinada com o devido arrebatamento, o espectador é privado de suas certezas e convicções e fica à reboque do ótimo e bem dimensionado texto de Potter.

Um texto que grita, que diverte, que assusta e que provoca reflexões de foro íntimo e social. April, a amiga cínica de Janet vivida com graciosidade e eloquência por Patricia Clarkson, é uma valiosa bússola nesse sentido. Eis uma personagem daquelas que fala as poucas verdades que não gostaríamos de ouvir e que não se avexa de ser desagradável em situações de desejável tolerância social. Ela chega com seu marido Gottfried (Bruno Ganz), de quem está se divorciando. O homem parece caminhar em um sentido completamente diferente da esposa em termos de visão de mundo e espiritualidade. É ele quem puxa papo com Bill (Timothy Spall), o marido de Janet que parece estranhamente fora de órbita naquele dia tão importante para a esposa.

Filosofia dá o tom de "A Festa"

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Patricia Clarkson em cena de A Festa

Adicione à cena um casal de lésbicas – em que uma é uma pensadora progressista e com bom transito político no partido de oposição (Cherry Jones) e outra é uma jovem lésbica idealista com aversão aos homens (Emily Mortimer) -, um banqueiro visivelmente incomodado de estar naquele evento e que recorre a cada cinco minutos a cocaína (Cillian Murphy) e você tem as bases para uma festa de inimagináveis repercussões.

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Há um pulsar filosófico irresistível a nortear os conflitos que se estabelecem gradativamente no longa de Potter. Fidelidade, egoísmo, competição, bases e circunstâncias do amor, lealdade e desejo são alguns dos elementos trabalhados com incrível fluência por Potter em pouco mais de 70 minutos de filme.

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Epifanias e passionalidade movem os conflitos de A Festa


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Trata-se de um grande filme que se beneficia enormemente de sua linguagem teatral, um fato raro fora da órbita de figuras como Woody Allen, Peter Bogdanovich e Ingmar Bergman. Pode parecer descompensado avocar esses nomes para balizar “A Festa” , mas Potter faz valer o delírio.