A influencia e importância de Cazuza são tão prolíferas, tão renováveis que mesmo 27 anos após a morte do cantor, um dos mais autênticos, criativos, talentosos e oxigenados da história de nossa música, o poeta continua sendo alvo de homenagens como “Caju”, um disco que revisita a obra do carioca Agenor – nome de batismo de Cazuza - com inventividade, reverência, bom gosto e um talento que se estabelece como a maior das homenagens.
Leia também: Mas afinal, Só Surubinha de Leve realmente incita o estupro?
“Caju” é o décimo disco do paulistano Marcelo Quintanilha , também compositor de trânsito na MPB, tanto que já teve composições gravadas por Daniela Mercury, Belô Veloso, Nando Reis, entre outros. Quintanilha estabeleceu um diálogo com a música brasileira em toda a sua pluralidade ao longo de sua discografia. Para alguém com tamanha sensibilidade como ouvinte, que se exercita como artista nas planícies da música é natural encontrar abrigo em Cazuza, que já havia inspirado homenagens antes.
Leia também: Beyoncé, Anitta e mais: o ano na música em 10 cenas
Esse álbum, no entanto, é diferente. E soa diferente também. O disco abre com Blues de Piedade . Uma versão à capela com coro gospel que não só se avoluma emocionalmente como parece vestir a essência da canção de Cazuza com pompa e estilo. Como seguir depois de um começo tão acalentador? Tão acima de qualquer suspeita? Melhor exagerar. Exagerado , que já ganhou tantas versões Brasil afora, perde velocidade, ganha contemplação e estabelece uma dinâmica mais atraente para o que vem a seguir. Jogar bossa onde não tem, abraçar o pop onde menos se espera e até surpreender com uma versão valsada de Codinome Beija-flor .
O resultado é um disco coeso, de uma beleza estranha que vai ganhando forma e sentido conforme nos sentimos impelidos a ouvir essas versões reimaginadas de músicas que se confundem com nossas histórias de vida. A atemporalidade Brasil , por exemplo, perde um pouco daquele inconformismo debochado de Cazuza, mas ganha em apreensão no dueto que Marcelo faz com Nina Quintanilha, sua filha. Já o rock pulsante de Ideologia é imutável, ainda que o saxofone dê uma conotação jazzística irresistível à canção.
Leia também: Efeito Despacito: A ascensão da música latina em 2017
O disco fecha com Caju , a faixa título composta por Quintanilha que é uma homenagem saborosa ao poeta que ganha um novo figurino sonoro em um gesto de reverência e afeto que a música torna compartilhável e também reverenciável. São “versos quase tão livres quando a alma desse poeta”.