Neil Gaiman vai além do universo dos super-heróis em "Mitologia Nórdica"
Neil Gaiman procurou ser fiel as lendas originais em "Mitologia Nórdica", mas derrapa por errar em questões técnicas da narrativa que comprometem livro
Se seu conhecimento sobre as lendas e deuses nórdicos veio das histórias dos heróis da Marvel saiba que você não é o único – o próprio Neil Gaiman na introdução de “Mitologia Nórdica” confessa que seu interesse por esse universo começou com os quadrinhos escritos por Jack Kirby. Assim, com uma ampla pesquisa sobre as raízes dessas lendas, Gaiman consegue, em pouco menos de 300 páginas, atualizar essas narrativas centenárias para um ritmo atual e de fácil compreensão.
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“ Mitologia Nórdica ” reúne vários contos que vão do começo ao fim – Neil Gaiman cobre desde a criação do universo até o final de tudo, o Ragnarök, equivalente ao apocalipse onde, em uma batalha épica entre os deuses, a história chega ao seu fim. Focado em Thor e Loki , principalmente, “Mitologia Nórdica” abre as portas de um mundo cheio de lutas, aventuras e, sobretudo, as trapaças armadas por Loki. Feito para iniciantes no tema, Gaiman acertou ao contar, do seu modo, até mesmo as coisas mais simples: qual origem do martelo de Thor, o Mjölnir? Quem são os gigantes inimigos dos deuses de Aesir? Por que os outros deuses se voltam contra Loki? Mesmo que os contos do livro estabeleçam uma relação de continuidade, são autossuficientes e completos em si mesmos.
Em “Mitologia Nórdica” o autor assumiu uma postura quase didática: sendo ele mesmo um entusiasta dessas lendas, Neil Gaiman se propõe a “cavar” o máximo que pôde para se aproximar, na medida do possível, das histórias originais e a partir delas criar versões mais atuais. Manter-se fiel às lendas nórdicas e à sua pesquisa foi, sem dúvida, um dos maiores acertos do autor ao tratar de um assunto tão complexo. O glossário no final do livro com nomes e termos recorrentes nas jornadas dos personagens é de grande ajuda, principalmente para leitores brasileiros que não tem nenhuma familiaridade com o tema.
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Estilo pedestre
Apesar de ser um bom livro, “Mitologia Nórdica” está longe de ser uma obra prima do autor. Gaiman é um ótimo contador de histórias, isso é indiscutível, porém peca em questões mais maduras na hora de se trabalhar com um livro: se você espera encontrar grandes proezas narrativas vai se decepcionar com a simplicidade da obra que chega a ser quase pobre – para quem gosta de se desafiar com um livro, então, o estilo narrativo pedestre é um grande problema. “Mitologia Nórdica” é um trabalho de entretenimento, uma leitura muito rápida e agradável, mas não consegue ir além desse aspecto e não consegue ultrapassar os limites para ser um trabalho mais primoroso como literatura.
Os diálogos entre os personagens são excessivos e quase redundantes, fazendo com que, em determinada altura, fique cansativo continuar lendo. Na tentativa de fazer algo de fácil compreensão, faltou sensibilidade estilística e técnicas expositivas mais maduras para expor as histórias. Muitas das conversas entre os deuses, gigante e criaturas são dispensáveis ou se resolveriam em poucas linhas caso Gaiman optasse, por exemplo, em estruturar os fatos de forma mais densa e com maior riqueza de informações. No capitulo “O Hidromel da Poesia”, quando Odin conversa com um gigante, fica claro que o uso indiscriminado do discurso livre é prejudicial para o curso da história. O autor precisa abandonar as fórmulas dos quadrinhos, nesse sentido, para poder agregar mais em seus contos.
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Apesar desses descompassos que, para um leitor mais experiente, afetam consideravelmente a qualidade final do livro, “ Mitologia Nórdica ” é uma boa introdução para um tema tão vasto quanto as lendas que traduzem a origem cultural de um povo, mas não pode ser considerado como um grande trabalho literário. Neil Gaiman acertou nas histórias e consegue instigar a curiosidade do leitor para avançar nesse território além do clássico Thor da Marvel .