Helô Pinheiro: ‘Problemas financeiros me fizeram aceitar a Playboy’
Completando 77 anos, a musa analisou a carreira e expôs que o machismo a impediu de realizar sonhos
“Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça” é chegar aos 77 anos, nesta quinta-feira (7), sendo a musa inspiradora da canção nacional mais gravada do mundo. É o caso de Helô Pinheiro, que inspirou os poetas Vinícius de Moraes e Tom Jobim na composição de “Garota de Ipanema”, canção de 1962, que segundo o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), em fevereiro de 2022, se tornou a música brasileira mais gravada do mundo.
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Sessenta anos após a música ganhar o país - e o mundo - a musa contou ao iG Gente que se orgulha de ter sido escolhida pelos compositores para representar a mulher brasileira. Entretanto, confessa que foi com estranheza que ficou sabendo que era a dona do “balançado que é quase um poema” cantado pelos poetas. Na época, com 17 anos, Helô era professora de primário e tinha uma vida reservada. Com pais conservadores e já noiva, ela recebeu com surpresa o anúncio publico de que era a “garota de Ipanema”, cantada por Vinícius e Tom.
“Quando eu fui encontrá-lo [o Vinícius] fiquei com vergonha. Pensei: ‘Ele tá me vendo de perto agora, será que sou aquilo que ele fala na música? Será que ele pensará que é tudo aquilo mesmo ou mudará de opinião, né?’ Fiquei até meio assim, com medo dele me olhar muito e eu não cumprir aquilo que a música descrevia”, relembra sobre a primeira vez em que viu o poeta, já com a canção rodando o Brasil.
Além do físico, Helô também se envergonhou por ter um jeito tímido. Ela sentiu medo de ser considerada “careta” pelos boêmios, já que não fumava ou bebia. “Eu nunca gostei de beber, nunca gostei de fumar e, às vezes, eu tinha até vergonha. Eu dizia: ‘Meu Deus, eu vou à casa do Vinícius, ele vai dizer: que menina careta que eu escolhi para ser Garota de Ipanema’. Eu gostaria de ser assim como uma Leila Diniz, no sentido de ser arrojada, mas eu não conseguia não só pela minha família, mas pelo meu modo de ser muito fechada”, explica.
Machismo e arrependimentos
O sucesso da música trouxe para Helô uma série de trabalhos. No entanto, o berço militar que nasceu a impossibilitou de alçar grandes voos na carreira. Assim que o nome saiu no jornal, por exemplo, o marido dela fez questão de adiantar o casamento previsto para acontecer em três anos. “Para impedir que eu voasse”, brinca a musa. A “Garota” concorda que o pensamento machista da época lhe roubou oportunidades importantes, que hoje ela observa com arrependimento de não ter encarado.
“Eu tinha três pessoas contra mim. Meu pai, meu irmão e meu futuro marido. Quando ele [o noivo] soube que a música foi feita para mim, ele ficou bravo com os dois [Vinícius e Tom] e quis antecipar o casamento. Pegou e falou: ‘ó quero casar’. Quando estava no frigir dos ovos, quando eu poderia ter outros campos de trabalho. Ele cortou essa oportunidade”, lamenta.
Helô avalia que atualmente ela teria empurrado o casamento mais para frente para poder colher as oportunidades enquanto “garota de Ipanema”. A artista lembrou que teve uma infância difícil financeiramente, principalmente após a separação dos pais e que, talvez, aproveitando as oportunidades que a fama lhe trouxe, poderia ter ofertado uma vida melhor para a mãe. Segundo ela, o casamento bloqueou tudo. Em outro momento, Helô também releva ter casado virgem, o que ela vê como algo antigo. “Eu casei virgem, mas eu não queria isso para minhas filhas, ficarem aí sabe? Para quê?”, critics.
Playboy
Embora o início da carreira tenha sido com grandes limites, os anos seguintes trouxeram mais liberdade para a musa. Além de abraçar alguns trabalhos em novelas e filmes, a artista aceitou um convite da revista adulta Playboy em 1987 e, em 2003, posou novamente para a revista ao lado da filha, Ticiane Pinheiro. Questionada sobre o que teria mudado em relação ao marido e ao seu perfil mais introvertido, para topar um ensaio nu em uma revista masculina, a loira foi bastante direta: "Dinheiro".
Em 1987, a empresa do marido de Helô Pinheiro passou por um período bastante delicado e chegou a falir. Naquele momento, ela se viu obrigada a buscar alternativas para manter o padrão de vida que proporcionou para as filhas até então.
Helô fez uma novela na TV Bandeirantes no período, mas o salário ainda não era o suficiente. Foi aí que surgiu o convite da revista. Insegura, ela relembra que pediu conselhos a Tom Jobim antes de aceitar. O poeta orientou que ela fizesse o ensaio.
“Eu fiz a novela, mas o que eu ganhava não era o suficiente para me manter. Aí surgiu o convite da Playboy. Fiquei surpresa e perguntei para o Tom Jobim se deveria topar. Ele me disse: ‘Claro que você vai fazer, imagine. Será muito bom para você’. Eu não queria que as pessoas soubessem que eu não estava bem porque parecia que estava pedindo dinheiro, eu não queria pedir nada para ninguém. Então, ninguém sabia que eu estava passando por essa dificuldade e aí eu aceitei fazer a Playboy. Foi a primeira e o texto é todo feito por Tom Jobim”, conta.
Em 2003, a musa voltou à revista, com a filha Ticiane. Segundo Helô, a motivação do segundo ensaio também foi o cachê, já que mais uma vez ela se via em um período financeiro conturbado. A loira contou que, no primeiro momento, Ticiane se negou a fazer o ensaio, mas ao compreender a situação da família, a apresentadora topou.
“Acabamos fazendo. O texto foi do Toquinho que foi tal mãe, tal filha”, relembra a musa sem se arrepender dos ensaios. “Não me arrependo porque fiz tudo isso para dar uma vida melhor para meus filhos”, finalizou.
Etarismo
Além de professora infantil, Helô Pinheiro trabalhou como atriz, apresentadora e modelo e se formou em jornalismo e direito. Cheia de planos, no entanto, ela analisa que o etarismo, ou seja, o preconceito ou discriminação de pessoas mais velhas, acaba impossibilitando algumas oportunidades para ela, que está na ‘casa dos 70’.
“Eu vejo que é negado trabalho para pessoas mais velhas. Hoje eu penso que é mais difícil. Por que não me convidam para apresentar um programa numa emissora aberta? Um programa bom como eu já tive eu tive no SBT. Hoje eu tenho vontade de fazer as coisas e não vejo oportunidade pela minha idade”, lamenta.
A musa disse que sonha em voltar para a televisão e, dentre dos projetos, está um podcast onde abordará as dificuldades que a mulher madura enfrenta na sociedade.
Próxima garota?
Heloísa é grata por todas as oportunidades que a homenagem de Vinícius e Tom lhe trouxe. No entanto, após 60 anos de “garota de Ipanema” ela já brinca dizendo que não é mais essa garota. Bem humorada, ela analisa: “Corpo Dourado? Eu tô branca. Do sol de Ipanema? Estou em São Paulo. Ai se ela soubesse quando ela passa? Eu não tô passando. Que coisa mais complicada. O meu biotipo não é mais de garota, então, cansa um pouco. Eu já até brinco: ‘garota, não, coroa!”.
Questionada sobre quem ocuparia então esse papel, não de representar apenas o bairro da zona sul do Rio de Janeiro, mas o Brasil, Helô trouxe dois nomes. O primeiro, da filha Ticiane Pinheiro, mas se defendeu dizendo que essa escolha não é porque Ticiane é filha dela. “Eu penso que eu construí na Tici tudo aquilo que eu gostaria de ser. Ela é descontraída, fala o que pensa, faz o que quer. Eu dei essa liberdade para ela. Eu não quis como meus pais foram comigo me deixando presa a certos preconceitos”, explica orgulhosa.
Já o segundo nome para uma possível garota do Brasil foi o da atriz Ísis Valverde. Para a musa, a artista possui o mesmo biotipo que ela tinha na juventude. “Eu acho ela com o biotipo do meu passado. Eu tive aquele cabelão, o corpo bem delineado. Uma vez me perguntaram quem eu citaria como a garota de Ipanema da atualidade, eu lembrei dela”, finaliza, lembrando, inclusive, que em um possível filme sobre a vida, ela indicaria Ísis Valverde para interpretá-la.
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