Ivan recebe o benefício da progressão de pena após cumprir oito anos em regime fechado. Quando “Corpo Delito” começa, ele já está no regime de semiliberdade. Isto é, ele está em liberdade condicional, mas está sendo monitorado eletronicamente por meio de uma tornozeleira eletrônica. Ele trabalha em uma escola-fábrica e ganha R$ 420 ao mês para passar oito horas apertando parafuso. Findado o expediente, tem de retornar para casa.

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“Corpo Delito” problematiza uso de monitoramento eletrônico por presos em condicional
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“Corpo Delito” problematiza uso de monitoramento eletrônico por presos em condicional


A rotina é inglória e angustiante para quem deseja tão arduamente saborear sua liberdade. O suplício de Ivan, interpretado com organicidade espantosa por Ivan Silva, faz parte do raciocínio desenvolvido pelo diretor Pedro Rocha que tenta ensejar um debate importante, porém eclipsado por tantas mazelas sociais no Brasil moderno: sobre nossa relação com os presos e a efetividade de determinadas regulamentações de execução penal. “Corpo Delito ”, portanto, busca no hibridismo entre documentário e ficção a potência do olhar.

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Ao iG, o diretor revela que a ideia do filme veio do baculejo, como as revistas policiais são chamadas em Fortaleza, no Ceará.  “Eu me perguntava o que faz um policial escolher uma pessoa que deve sofrer um baculejo. Tinha vontade de confrontar um pouco os programas policiais televisivos que tanto fomentam o discurso de ódio”. Para o cineasta, existia a premência de problematizar a frase “bandido bom é bandido morto”, que pesquisa do Datafolha no fim de 2016 apontou anuência de 57% da população brasileira.  

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"Corpo Delito"


“Eu queria uma imagem que fosse um contraponto a esses programas policiais”, explica Rocha. “Por isso apostamos nas técnicas do roteiro de ficção. Para criar uma experiência de empatia com o protagonista do filme”. Ivan aos poucos vai cedendo à tentação e acaba violando as regras de sua condicional. Tudo é acompanhado com rigor documental, ainda que se trate de um longa essencialmente de ficção. “Está cada vez mais difícil conversar sobre esse assunto”, lamenta o diretor ao defender sua opção de nebular as fronteiras entre os gêneros cinematográficos.

O cinema de Rocha aqui é cru, desinflado, tênue e se esmera no campo comportamental. Ainda que Rocha deseje ensejar um bom debate, dramaticamente “Corpo Delito” pouco agrega ao pretendido por seu diretor. Falta um ponto de vista forte que provoque o público a sair da letargia. Na entrevista ao iG, o diretor faz uma observação interessante e que, de certa forma, seu filme não interioriza. “Há de se discutir a maneira como o regime de semiliberdade é praticado hoje”, pontua. “O monitoramento eletrônico foi pensado para os presos provisórios, com a finalidade de desafogar os presídios brasileiros. Mas a tornozeleira está sendo usado, pelo menos em Fortaleza, em presos do semiaberto.”

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Rocha reconhece que a contribuição oferecida por seu filme é modesta, já que “o cinema pode pouco hoje no Brasil”; especialmente o cinema de pouca capacidade orçamentária, mas se diz satisfeito e otimista com sua “contribuição humilde”. “Corpo Delito” estreia em 22 cidades do País (São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador entre elas) nesta quinta-feira (7) como parte integrante do Projeto Sessão Vitrine Petrobras.

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