Herdar costumes e gostos da família é algo muito comum, mas às vezes algumas dessas paixões acabam se materializando de tal forma que chegam a romper qualquer limitação que um dia a vida possa colocar na trajetória de alguém. Esse é o caso do maestro João Carlos Martins, que tem a sua história recontada no longa que estreia nesta quinta-feira (17), “ João, o Maestro ”, dirigido por Mauro Lima

O maestro João Carlos Martins tem a sua vida recontada em
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O maestro João Carlos Martins tem a sua vida recontada em "João, o Maestro" que estreia nesta quinta (17)


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Nascido em junho de 1940, na cidade de São Paulo, João Carlos Gandra da Silva Martins, mais conhecido como João Carlos Martins recebeu uma educação da família em que a paixão pela música era iminente. Filho de imigrante português, o então jovem herdou o sonho de tocar piano do pai, que teve que desistir do plano após, aos dez anos, ter o dedo decepado em uma máquina na gráfica onde trabalhava. Assim, ainda na infância, João Carlos começou a estudar o piano, ganhando destaque em concursos ainda aos oito anos de idade e, aos onze, dedicando seis horas de sua rotina ao instrumento, com um dos grandes nomes da música clássica, o russo radicado no Brasil, José Kliass.

O sucesso do pianista, portanto, estava declarado. João Carlos Martins chegou à fase adulta com concertos que receberam atenção da crítica mundialmente e um passaporte carimbado pelos mais diversos países. Com apenas vinte anos de idade, o jovem já estreava no Carnegie Hall, lendária casa de espetáculos em Nova York conhecida pelas apresentações de música clássica e popular e a inauguração do Glenn Gould Memorial em Toronto também ficou por sua conta.

Obstáculos

Entretanto, nem tudo foram flores durante essa trajetória. Como o próprio maestro afirmou em entrevista à Revista 29HORAS de agosto de 2017, “Minha vida é um trem fantasma, cada curva é um susto”. Ainda com cinco anos de idade o jovem foi diagnosticado com um tumor na garganta e teve que passar pela primeira – de mais de 20 – cirurgias que iria realizar na sua vida. Curado aos oito anos de idade, uma distonia cerebral não deu sossego ao jovem. Doença sem cura, João Carlos Martins teve que buscar mecanismos para burlar as consequências da deficiência, como dormir até meia hora antes do concerto, acordar e ir direto para o palco, evitando que assim a doença se manifestasse enquanto estivesse se apresentando.

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Apesar de ter encontrado uma saída para a doença, João Carlos Martins teve outros obstáculos para superar. Aos 20, enquanto estampava as capas de jornais famosos internacionalmente como um dos principais interpretes de Bach, o pianista sofreu um acidente no Central Park, ao jogar bola durante um treino da Portuguesa, de quem é torcedor fanático. Ao cair, perfurou o seu braço direito na altura do cotovelo, atingindo nervo ulnar, sofrendo atrofia em três dedos, o que resultou no afastamento do piano por um ano.

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Reprodução/Facebook

Mãos do músico durante apresentação

Tocando com as maiores orquestras do mundo no auge de sua carreira, o pianista passou por algumas cirurgias para retomar o controle dos dedo, mas sem tanto sucesso. Foi aí que o músico começou a utilizar dedeiras de aço, que faziam com que seus concertos terminassem com sangue espalhados pelas teclas do piano. O que era um sonho em ascensão, começou a ter uma mudança vertiginosa. Nesse meio tempo, acabou desenvolvendo distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho que o fez, mais uma vez, sair dos palcos. Entre idas e vindas, a persistência do músico sempre esteve presente para fazer o que mais amava: tocar. Mesmo com todas as dificuldades, João Carlos Martins conseguiu gravar todas as obras de Bach e fazer a sua história no mundo da música. Com um cenário desfavorável para a arte, o músico começou a se ligar com a política, em tempos conturbados onde se envolveu com fraudes para a campanha de Paulo Maluf na década de 1990, originando à ele uma série de processos judiciais.

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Em 1995, entretanto, depois de toda as dificuldades enfrentadas, o músico sofreu mais uma reviravolta na sua vida. Na cidade de Sófia, na Bulgária João Carlos Martins sofreu um assalto e foi golpeado na cabeça com uma barra de ferro, ocasionando lesões muito sérias em seu cérebro, comprometendo o membro superior direito. O músico passou por algumas cirurgias com o intuito de retomar os movimentos da mão direita e acabou gravando o seu último álbum da carreira com as duas mãos.

Um novo século

A chegada de um novo século marcou para o músico uma chance de recomeçar. Em 2001 gravou o álbum “Só para Mão Esquerda”, mas foi surpreendido por uma doença que também acarretou em danos para os movimentos da sua outra mão. O músico acabou tornando-se maestro e teve que começar a memorizar as notas musicais para que seus problemas de saúde não atrapalhassem o seu novo trabalho.

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Alexandre Nero interpretando o maestro

Sua história já foi contada mais de uma vez no mundo do entretenimento. Sua biografia foi traduzida para dois documentários internacionais, além de livros como a autobiografia em 2007 como “Maestro! – A volta por cima de João Carlos Martins e outras histórias”, de Ricardo Carvalho, obra que inspirou o roteiro do filme “João, o Maestro”, a primeira cinebiografia do pianista reconhecido internacionalmente.

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Da infância até os dias atuais, em que completou 77 anos em 2017, o filme registra os diversos acontecimentos da trajetória de vida que fez João Carlos Martins tornar-se um dos maiores nomes da música clássica brasileira com quase 40 discos gravados - apesar das diversas dificuldades enfrentadas no caminho. No elenco, Alexandre Nero , Davi Campolongo, João Pedro Germano e Rodrigo Pandolfo têm o grande desafio de recuperar as memórias do músico, que também contribui com o longa metragem. Além deles, o filme que estreia nesta quinta (17) também conta com artistas como Giulio Lopes, Ondina Clais, Caio Laranjeira, Matheus Guerra, Alinne Moraes e Fernanda Nobre.  

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